Roberta de Moraes: Branquinha

Ela sorria para si e os cabelos voavam com a brisa leve do fim de tarde.

Na pele dourada, delicadas pintas surgiam. A festa das sardas e dos novos tempos.

Pisava descalça firme terreno que desconhecia.

Segura, rodopiava o vestido branco, mãos em conchinhas na boca a tampar-lhe o sorriso.

Ela cintilava. Repleta de si e de anseios.

Largou a sacola que lhe pesava os ombros ajeitou os cabelos em tranças, sacolejou a areia e os destroços da última tempestade e saiu dançando em passos largos.

Ela não tinha pressa.

Experimentava os sabores dos novos frutos, saltava com graça as poças d’água, outrora de choros escondidos, cintilava na multidão: sua voz, seu peito em couraça, seu voo desbravando a própria vida.

Adeus menina dos brejos.

Ela sorriu desta vez, descontroladamente, ao ver-se solta e preenchida. Colorida e feliz, sem ninguém a rodear-lhe.

Estava só. E inteira.

Atravessou os corredores da viela, buscou a fresta primeira que dava para o mar e ali permaneceu por um instante.

Seus pés experimentavam o toque fresco e denso da areia

Abaixo de si. As gaivotas sobrevoavam a grande extensão daquelas águas em busca de alimento. Seu gorjeio era intenso. Pés descalços, a Menina brincava: mãos agarrando as laterais do vestido branco, os longos cabelos esvoaçantes dançavam em frenesi.

Ela tinha para si o discurso pronto. A boa nova salteada de água marinha e a exuberante alegria de quem acordou-se.

Tratou de limpar os grãos finos dos pés, enfeitou as longas madeixas loiras com acácias e jasmins e subiu a escadaria que a levava de volta ás ruas da velha e doce cidade. Para ela, os tons de azul-anis, púrpura, amarelo-sol e verde esmeralda que vestiam as casas estavam ainda mais intensos.

Abriu o portão num balanço dos quadris, subiu para o quarto e foi lavar-se, ao som delicado de sua canção preferida.

Ela estava em festa. Seu coração batia descompassado como se quisesse saltar-lhe do peito.

Ela sabia que sua vida mudara. Que os desenhos, antes infantis, eram agora o rascunho de um projeto de vida, em cores, nanquim e esperanças.

Olhou-se no grande espelho que pendia atrás da porta e sorriu, reconhecendo-se, preenchida pelo doce sabor de quem encontra a si em meio a multidões.

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Imagens: Arquivo pessoal da colunista

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