MATERNIDADE ATÍPICA E SOBRECARGA: A URGÊNCIA DE CUIDAR DE QUEM CUIDA

Cuidar de uma pessoa com deficiência é um gesto contínuo de entrega, presença e força. É estar disponível o tempo todo — física e emocionalmente — e reorganizar toda a vida em torno das necessidades de quem depende desse cuidado. Tudo isso quase sempre sem rede de apoio, sem descanso e sem o respaldo mínimo do Estado.

Segundo dados apresentados em audiência pública no Senado Federal, cerca de 70% das mães de pessoas com deficiência abandonam suas profissões para acompanhar integralmente os filhos. Algumas escolhem parar. Mas a maioria é levada a isso por ausência de políticas públicas que garantam o acesso à escola inclusiva, terapias contínuas e atendimento de saúde adequado.

Quando falamos de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), temos as múltiplas terapias semanais, deslocamentos diários, negativas de planos de saúde, laudos, relatórios, acompanhamentos escolares, reuniões com profissionais, alimentação adaptada — e, com frequência, batalhas judiciais para garantir o que já deveria estar assegurado por lei.

Essas mães viram suas vidas de cabeça para baixo. Organizam prontuários médicos, enfrentam filas intermináveis, redigem petições informais, participam de sessões de terapia, fazem o papel de mediadora, assistente social, enfermeira e advogada.

É uma realidade invisível aos olhos da sociedade e ignorada por décadas pelo poder público. Mas, finalmente, começam a surgir sinais de mudança.

 

Uma luz na escuridão:

No dia 8 de maio de 2025, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado Federal realizou uma audiência pública com o foco na realidade das cuidadoras familiaresespecialmente das mães de pessoas com deficiência.

O debate reuniu especialistas, parlamentares e mulheres que vivem diariamente a maternidade atípica e trouxe à tona depoimentos comoventes e contundentes. Falou-se sobre o abandono institucional, sobre o adoecimento físico e mental das cuidadoras, sobre a solidão de quem cuida sem ser cuidada.

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Logo depois, em 14 de maio de 2025, houve um avanço legislativo concreto: o Projeto de Lei nº 2.437/2019, que trata da criação da Política Nacional de Apoio à Cuidadora e ao Cuidador de Pessoa com Deficiência, Doença Rara ou em Condição de Dependência, foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.

Este PL propõe um conjunto de ações articuladas que reconhecem e apoiam quem realiza o cuidado contínuo dentro de casa, entre elas:

  • Reconhecimento formal da figura do cuidador familiar;
  • Capacitação técnica gratuita;
  • Apoio psicossocial;
  • Inclusão em programas como o BPC.

 

Agora, o projeto segue para análise na Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Vamos ficar de olho. A sociedade civil, as famílias, os profissionais da saúde, da educação e do direito precisam estar atentos e mobilizados para garantir que o projeto não caia no esquecimento.

É importante reforçar: O cuidado familiar é essencial para que pessoas com deficiência tenham acesso à saúde, à educação e à vida digna.

Mas ele tem sido sustentado, por décadas, quase exclusivamente pelas mulheres, sem estrutura, sem apoio, sem descanso.

Ao deixarem suas profissões para dedicação aos filhos, essas mulheres vão aos poucos deixando de ser contadas. Deixam de ter renda, de produzir, param de contribuir para a previdência social. O tempo passa e elas envelhecem sem direito à aposentadoria e sem visibilidade na nossa sociedade.

Por isso, é urgente olhar com responsabilidade para essas mulheres que, por amor, dedicam seus dias — e muitas vezes toda a sua existência — ao cuidado de um filho que depende delas para tudo.

Que esse cuidado, tão essencial e generoso, não seja mais motivo de esgotamento, invisibilidade ou miséria na velhice. Elas merecem mais do que gratidão simbólica. Merecem políticas públicas concretas, amparo, proteção e dignidade.

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O Estado já reconhece direitos para idosos, crianças e gestantes. Falta agora fazer o mesmo com quem sustenta, silenciosamente, o cuidado de pessoas com deficiência — muitas vezes sozinha, quase sempre mulher.

É tempo de sair do discurso e agir. De transformar escuta em políticas e de garantir que quem cuida também seja cuidada,

E se você, mãe, sente o peso dessa caminhada e a solidão que tantas de nós conhecem bem: procure apoio em outra mãe. Há força em partilhar. Há acolhimento em quem entende. Você não está sozinha. E juntas, somos mais fortes.

Aqui é um lugar para você se sentir acolhida! Me escreva sobre suas dúvidas ou compartilhe algum desafio se desejar. Será uma honra caminhar com você nessa jornada de acolhimento e amor.

Um beijo e até a próxima quarta-feira,
Juçara Baleki

@querotratamento

Fontes:

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2025/05/08/cdh-debate-aponta-sobrecarga-das-cuidadoras-e-necessidade-de-apoio

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2025/05/14/projeto-de-apoio-a-cuidadores-de-pessoas-com-deficiencia-avanca-no-senado

 

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