Fabio Abate: Somos nosso próprio capataz

Já faz algum tempo ganhei de um amigo um livro chamado “Sociedade do Cansaço” e claro que sempre fico feliz quando ganho de presente um livro porque entendo que ali teve um encontro de almas, a pessoa para dar um livro de presente minimamente gasta um tempo fazendo essa matemática mental sobre a soma que dará esse texto e a pessoa que vai ler, se tornando assim um presente importante pra mim. Mas, vamos ao que interessa, já nas primeiras páginas do livro o autor, Byung-Chul Han defende uma ideia, que no mínimo é perturbadora, onde o “explorador é também o explorado”. E tenho que confessar eu me identifico com o conceito quando penso o meu dia a dia como empreendedor-trabalhador, ninguém mais precisa me cobrar de nada e ao mesmo tempo eu me sinto intensamente cobrado.

Nessa reflexão de hoje, que não sei exatamente como vai terminar, talvez termine o texto e fique uma grande lacuna na nossa mente, servirá como tentativa de sairmos dessa relação caótica de cobranças incessantes por resultado e comecemos de forma consciente a estabelecer (ou reestabelecer) uma relação mais saudável os possíveis resultados que vamos atingir, ou a falta deles.

Mas eu quero provocá-los a pensar se isso tudo faz sentido para vocês, será que as coisas só darão certo através do excesso de desempenho? Será que reduzirmos um pouco tudo que fazemos iremos obrigatoriamente fracassar? Não sei vocês, mas eu tenho a impressão de que se eu reduzir o ritmo tudo vai dar errado, vocês também? E me deixa contar “eu sou o chefe”, teoricamente e hierarquicamente não tem ninguém na estrutura organizacional para me cobrar, e não precisa. Eu sou suficientemente capaz e severo comigo mesmo.

Referenciando o livro, ainda, o autor traz em outro paragrafo um complemento dessa indagação dizendo que não somos mais os profissionais da obediência, onde claramente existia uma estrutura de poder e cobrança externa, somos agora o profissional do desempenho, a cobrança deixa de estar fora e passa a estar dentro, dentro do sujeito que a todo momento se cobra “ser melhor” ou “entregar mais”. A cultura do desempenho traz consigo, implicitamente uma serie de adoecimentos, que inclusive estamos vendo não só em grande escala, como na alta escala e de forma devastadora, a ponto de percebermos maciços rompimentos de carreira. Um exemplo atual o tal SB, Síndrome de Burnout, arrastando excelentes profissionais e pessoas alta astral a falência emocional e psíquica.

Group of business workers working together. Partners stressing one of them at the office

A coisa está tão meticulosamente estruturada que no final das contas, quando paramos para avaliar o que está acontecendo percebemos que a maior cobrança e falta de posicionamento vem de dentro, nós mesmos estamos criando um mundo extremamente severo de cobranças que sobrepõe qualquer ambiente externo. E mais que isso, mesmo quando o ambiente nos sobrecarrega nos implicamos como infalíveis, como se tivéssemos que dar conta de tudo, e na real não precisamos. Estamos estabelecendo uma vida ditada para uma cultura que além de nos cobrar, nos colocou na condição de capataz, ninguém mais precisa ficar olhando, eu sou completamente suficiente para me lançar aos tubarões ou ao fundo do poço.

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