Crítica: Aftermath (2017)

Me lembro do bom e velho Arnold Schwarzenegger no auge de sua carreira e do cinema de ação descerebrado que imperava nos anos oitenta e noventa. O Arnie de antigamente não dialogava muito não, e seus métodos de atuação consistiam no que dizem as expressões populares de hoje, em “tiro, porrada e bomba”, basicamente.

Por isso, não deixa de ser bastante curioso observar o gigante austríaco enfrentando, pela primeira vez, o fantasma da velhice frente às câmeras, depois de uma equivocada insistência em produções de ação que não condizem mais com sua recente condição de septagenário. Vide o medíocre O Exterminador do Futuro: Gênesis (Alan Taylor, 2015). Neste Aftermath (EUA, 2017), possivelmente o primeiro drama propriamente dito da filmografia do veterano astro, Schwarzenegger despe-se completamente (e finalmente) da condição de herói truculento, abraçando um personagem sofrido, vulnerável, e incapaz de resolver as coisas na força bruta. Sem exageros, Aftermath guarda a melhor atuação da carreira do ator.

Uma pena que a produção não esteja no mesmo nível da atuação do ex-Governator, ainda que esta se segure muito bem durante praticamente toda sua duração. No filme, Arnold interpreta Roman, um trabalhador do ramo da construção civil prestes a se tornar avô, e que está aguardando o retorno de sua esposa e filha para os Estados Unidos, após uma viagem à Kiev, cidade natal do protagonista. Ao chegar ao aeroporto para buscá-las, entretanto, Roman recebe a devastadora notícia de que o avião em que sua família viajava, se chocou com outra aeronave em pleno ar, e que não há a menor chance de serem encontrados sobreviventes.

Entra em cena Jake (o cada vez mais em evidência Scoot McNairy, que roubou a cena no recente Sleepless, cuja crítica você também pode conferir aqui no Portal do Andreoli), o controlador de voo responsável pelo terrível acidente, após um erro durante sua monitoração do espaço aéreo. Agora, Roman e Jake, duas vidas marcadas pela tragédia, entrarão em rota de colisão, onde as linhas entre justiça, vingança e retribuição se misturam perigosamente.

Dirigido por Elliott Lester (do mediano thriller Blitz, com Jason Statham), Aftermath tem uma primeira hora surpreendentemente sólida e profundamente dramática, que valoriza o duelo de interpretações de Schwarzenegger e McNairy, ambos bastante críveis em seus papéis. O roteiro da produção, à cargo do espanhol Javier Gullón (dos elogiados O Homem Duplicado e A Caverna, cuja crítica você também pode conferir aqui no Portal do Andreoli), trata o tema do filme de maneira madura e realista, focando nos devastadores efeitos do luto e da culpa.

Chega a ser realmente uma pena que Aftermath entregue uma conclusão tão frustrante e de certa forma, abrupta. Apesar de ser bastante bem intencionada, e de tentar inserir um elemento cíclico em seu encerramento, onde tão fortes emoções humanas como a vingança e a necessidade de se fazer justiça se cruzam de maneira implacável, seu apressado epílogo simplesmente não convence.

Mesmo que funcionando como um válido e significativo material testamental para o eterno Schwarzenegger enfrentar os fantasmas da velhice em sua presença outrora extremamente viril e implacável, e também como mais um exemplar que evidencia o talento ascendente do realmente bom Scoot McNairy, Aftermath poderia ser muito mais. Não que seja uma experiência descartável. Pelo contrário. O filme mantém-se sempre relevante e profundo, todavia, derrapa em uma conclusão muito aquém do restante da produção. Por pouco não foi um grande filme.

Aftermath não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar diretamente ao serviço de streaming e VOD.

6 respostas

    1. Agradeço pelo elogio e pela confiança, bróder! Como sempre. Quanto ao filme chegar às terras tupiniquins, acho que ainda levará um tempo, pelo menos através dos meios “oficiais” de distribuição. Rs…
      Abraços, volte sempre!

  1. Parabéns! Mesmo que o desfecho não chegue no potencial que poderia ser ganha minha atenção pelo tema que de outras formas faz-se recorrente nos dias atuais já que cada vez mais conflitos sobre perdas drásticas como essa tem estampado os noticiários. Um retrato do erro humano,que me faz colocar-me no lugar do outro através de uma obra assim. Me lembrei, sobre as perdas de outra personagem em ‘Reine sobre mim’ com o Adam Sandler e don Cheadle. Bom,vamos esperar que a Netflix nos ajude!haha

    1. De fato, Leidiane. É um filme com uma proposta bastante atual e reflexiva. Uma pena o resultado da produção não ter se mantido até sua conclusão.
      Agradeço por sua visita, seus comments e elogios. Volte sempre ao Portal do Andreoli!
      Beijos!

  2. Concordo em alguns pontos sobre o filme. A primeira hora, realmente é marcada por um drama bem representado pelos atores. Arnold se destaca, sendo facíl esquecer de seu passado em filmes de ação. Contudo, quando o filme vai se desdobrando, vem logo a mente a história verdadeira sobre o acidente, na qual todos sabem o resultado. Assim, o final não cria expectativas, e nem poderia ter sido feito de outra maneira. Aliás, o filme segue muito bem os detalhes reais da sórdida situação.
    Talvez se o diretor buscasse aprofundar um pouco mais o sofrimento dos personagens, teríamos um outro peso ao fim.
    Ademais, contrarío o autor do texto, de questões está é a primeira e melhor aparição dramática de Arnold. No filme “Maggie”, apesar da história batida e fantasiosa de vírus mortais e zumbis, ele supera as expectativas, mostrando total aptidão ao drama.

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