Crítica: Artista do Desastre (The Disaster Artist)

Você já ouviu falar de um filme chamado The Room? Não? The Room é uma produção independente de baixo orçamento, lançada em 2003. O filme aborda a turbulenta relação entre dois amigos e a mulher que serve de pivô para o fim de sua amizade. The Room foi um retumbante fracasso de bilheteria e crítica, e é considerado um filme tão ruim, que se tornou cult. O que nos traz à este Artista do Desastre (The Disaster Artist, EUA, 2017), produção que oferece uma viagem aos inacreditáveis bastidores da produção.

Em 1998, na cidade de São Francisco, Greg Sestero (Dave Franco, de Truque de Mestre e Nerve: Um Jogo Sem Regras) é um aspirante à ator que um belo dia, se encanta com uma performance de seu excêntrico e destemido colega de estudo de interpretação, Tommy Wiseau (o faz-tudo James Franco, irmão de Dave na vida real). Esperando aprender com o enigmático Wiseau, Greg se aproxima de Tommy e ambos se tornam amigos, e eventualmente acabam se mudando para Los Angeles, na esperança de conseguirem se tornar atores profissionais. Após um período, as coisas estão difíceis para a dupla, e é então que Greg sugere a Tommy que eles próprios façam um filme. Wiseau, que é rico (apesar da origem de sua renda ser um mistério assim como sua própria origem e idade), decide bancar o filme, além de escrever o roteiro, dirigir e estrelar. E à medida que a produção do hoje famigerado The Room vai se desenrolando, a amizade entre Tommy e Greg começa a se deteriorar, muito devido às inseguranças de Wiseau.

Eu tive a oportunidade de conferir o tal The Room, e posso afirmar que realmente trata-se de um filme ruim. MUITO ruim. Mas apesar de minha opinião pessoal sobre o filme, este Artista do Desastre, novo filme de James Franco como diretor, usa o infame cult de Tommy Wiseau como um trampolim para contar uma história de amizade e criatividade. Ao invés de soar como uma sátira ou mesmo uma obra de reverência ao estilo Ed Wood de Tim Burton, Artista do Desastre se preocupa mais em humanizar Wiseau através de sua amizade com Sestero. Não faltam risadas ao longo do caminho, é claro, mas o público se surpreenderá com a delicadeza e afabilidade da produção.

O roteiro espertíssimo da dupla Michael H. Weber e Scott Neustadter (dos sólidos O Maravilhoso Agora e A Culpa é das Estrelas), carrega uma enorme carga de empatia por Wiseau. Enquanto o público pode questionar se o Wiseau da vida real merece toda esta empatia, para o filme é essencial que o espectador se importe com este ser estranho. Wiseau é esquisito, arrogante, e não entende nada sobre escrever, dirigir ou protagonizar um filme. Entretanto, o espectador acaba gostando dele mesmo assim, especialmente pelo fato de que James Franco entrega uma performance maravilhosa, que destaca as vulnerabilidades de Wiseau.

O maior mérito do filme é ter os irmãos Franco como protagonistas, já que o fato de serem irmãos se traduz muito bem no relacionamento de seus personagens na tela, mesmo que suas personalidades em nada lembrem as de Greg e Tommy. Dave Franco interpreta o cara comum, e o jovem ator veste a carapuça com naturalidade. Ao mesmo tempo, James Franco, ator do qual sou fã confesso mesmo quando estrela algum besteirol, desaparece completamente no papel de Wiseau. Franco já entra com os dois pés na temporada de premiações, com uma interpretação que já rivaliza com a do monstro Gary Oldman, que também desapareceu na pele do Primeiro Ministro britânico Winston Churchill em O Destino de uma Nação (The Darkest Hour). Franco transforma uma interpretação que tinha tudo para cair na paródia ou na caricatura, em um retrato de uma pessoa real, rejeitada pelo mundo devido ao seu jeito excêntrico de ser, que não só faz o público rir, como também faz o espectador se importar com sua solidão e inseguranças.

Ao manter o foco nas emoções de seus protagonistas, Artista do Desastre encontra uma honestidade surpreendente que vai muito além do que apenas um filme sobre os bastidores do tal The Room. É claro que quem assistiu a The Room conseguirá extrair mais deste Artista do Desastre do que quem ainda não viu o filme. E como mencionei, não faltarão gargalhadas do público uma vez que este começa a acompanhar os absurdos de como o hit cult foi concebido. E surpreendentemente, o filme de Franco se desenvolve como uma experiência muito mais rica e atenciosa do que aparenta, ao evidenciar que mesmo a arte ruim tem o seu lugar, desde que seja honesta com seu público. Apesar das reações com relação à The Room não serem as esperadas ou pretendidas por Wiseau, seu filme só poderia vir mesmo de sua própria mente peculiar.

No fim das contas, Artista do Desastre é uma obra verdadeira e surpreendente, que discorre sobre a amizade com bastante propriedade e bom coração. A amizade entre Wiseau e Sestero nunca soa falsa ou pedante, o que faz com que a história de The Room se torne mais rica e interessante do que apenas a celebração de um bizarro sucesso cult. Os fãs do filme de Wiseau (sim, eles existem) com certeza vão se deleitar com o humor, mas Artista do Desastre tem muito mais a oferecer do que apenas piadas ou James Franco fazendo um sotaque esquisito.

Artista do Desastre tem estreia programada nos cinemas brasileiros para o dia 25 de Janeiro de 2018, mas esta data pode sofrer alterações.

2 respostas

  1. Hoje quase assisti a The Disaster Artist direto, mas felizmente decidi assistir antes a The Room. Realmente esse filme do Tommy Wiseau de tão ruim é ótimo, e só reforçou minha satisfação com The Disaster Artist. Não deixem de assistir aos dois filmes!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Compartilhe esta notícia

Mais postagens