Crítica: Bom Comportamento (Good Time)

Existe uma vibração ímpar na noite das grandes cidades. Esta vibração está no som do trânsito que nunca para. Está nas luzes de neon zumbindo, nas televisões dentro de cada casa e apartamento. Esta vibração cria uma energia única que você não encontra fora de cidades como Nova York, Los Angeles, Chicago, São Paulo, etc. É um tipo de energia ansiosa, motivada pela falta de sono e a paranóia. E esta vibração permeia todo este excelente Bom Comportamento (Good Time, 2017), um filme que me lembra bastante os grandes “filmes de cidade” dos anos setenta, como Caminhos Perigosos (Martin Scorsese, 1973) e Um Dia de Cão (Sidney Lumet, 1975), entre outros.

Com uma performance central do ex-Twilight (graças a Deus!) Robert Pattinson, que remete à um descendente direto da atuação de Al Pacino no citado filme de Lumet, Bom Comportamento é um filme inquieto, com um palpável senso de ansiedade e pânico que se manifesta em cada frame da produção. Trata-se de um daqueles raros filmes que fazem o espectador sentir-se no limite, que atacam diretamente seus nervos e emoções, à medida em que acompanha o dilema do protagonista durante sua jornada por uma noite infernal.

O filme tem início com um assalto à banco. Nele, Connie (Pattinson) e seu instável e violento irmão Nick (o co-diretor do filme Ben Safdie), almejam levar 65 mil dólares do local, e à princípio, parecem ter conseguido realizar a façanha. Porém, o dinheiro está ligado à um daqueles dispositivos explosivos de tinta, e num instante, Connie, Nick e o dinheiro estão cobertos de vermelho. Nick é pego pelos tiras, e vai parar na cadeia. Grande parte do dinheiro roubado está inutilizado pela tinta, então Connie precisa arrumar pelo menos 10 mil para pagar a fiança do irmão, o mais rápido possível. Ele começa recorrendo à sua namorada (a bela Jennifer Jason Leigh, de Os Oito Odiados), e, bem, pode-se dizer que as coisas vão ficando cada vez mais loucas, de maneiras que eu nem me atreveria a contar para não revelar spoilers.

Trabalhando novamente com o ótimo diretor de fotografia Sean Price Williams (colaborador habitual do cinema dos diretores Ben e Josh Safdie), os irmãos cineastas dão a Bom Comportamento uma energia claustrofóbica difícil de ilustrar em uma crítica. Tal feito é alcançado através de intensos close-ups e um estilo de filmagem elétrico, sempre vibrante. É uma linguagem visual bem interessante, que destaca o clima emocional de seus protagonistas, e que ganha ainda mais força graças ao score musical pulsante de Daniel Lopatin (do drama Partisan).

Muito do que faz este Bom Comportamento funcionar tão bem, deve-se à performance de Robert Pattinson, sem dúvida a melhor de sua carreira, que muitos ainda julgam resumir-se aos filmes da capenga saga Crepúsculo. Pattinson já mais que mostrou seu valor em produções como o angustiante The Rover: A Caçada (David Michôd, 2014) e Z: A Cidade Perdida (James Gray, 2016), e aqui, é impossível ignorá-lo desde seu primeiro momento em cena. Pattinson constrói um personagem imprevisível, com uma habilidade sobrenatural para se meter em encrenca, e cuja estrada de equívocos de sua vida culmina nesta insana noite em particular.

Bom Comportamento é essencialmente um filme sobre uma longa perseguição – a história de um homem tentando evitar sua prisão por roubo à banco, enquanto tenta tirar o irmão de um enrosco que ele próprio o colocou – e Pattinson encarna seu personagem com uma perfeita energia nervosa, uma vez que seu Connie é continuamente caçado por suas próprias más decisões. Assim como Pacino nos anos setenta, há algo nos olhos e na linguagem corporal de Pattinson neste Bom Comportamento. Uma espécie de inquietude sobre o que virá a seguir, ou uma inabilidade em aquietar-se. Trata-se de uma performance realmente deslumbrante, e facilmente uma das melhores de 2017.

Eu costumo dizer que filmes são experiências passivas. Nós nos sentamos no escuro e permitimos que histórias se desenrolem à nossa frente, por trás da segurança da tela de projeção. Filmes como Bom Comportamento quebram esta barreira de conforto e nos deixam tão desconfortáveis e no limite quanto os protagonistas. Eles nos dão personagens que superam as barreiras do tempo, e assim como Um Dia de Cão continua a gerar discussão quarenta anos após seu lançamento, aposto que este Bom Comportamento seguirá o mesmo caminho. Um gigantesco protagonista para isso o filme com certeza tem.

Bom Comportamento estreia nos cinemas brasileiros no dia 19 de Outubro.

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