Crítica: Olhos Famintos 3 (Jeepers Creepers 3)

Para falar deste Olhos Famintos 3 (Jeepers Creepers 3, EUA, 2017), é preciso antes falar um pouco sobre seu diretor, o norte-americano Victor Salva, hoje com seus 59 anos de idade. Veterano na indústria cinematográfica, o diretor enfrenta uma verdadeira via-crúcis a cada filme tenta lançar no mercado. Quase ninguém o financia, e seus filmes sofrem com boicotes por boa parte do público. Não foi diferente com este Olhos Famintos 3, produção que amargou 14 anos de espera até que pudesse ser retirada do papel. O filme nem sequer ganhou lançamento nos cinemas americanos, tendo sido exibido por apenas um dia (26 de setembro) em alguns cinemas selecionados, e depois ganhando a habitual distribuição em serviços de streaming. Até a premiére do filme que aconteceria neste dia foi cancelada devido à protestos contra o diretor. E qual seria o motivo para Salva ter de enfrentar tamanhas dificuldades na hora de lançar um filme? Explico…

Em 1989, durante as filmagens de seu primeiro filme, o divertido thriller de baixo orçamento Palhaço Assassino (Clownhouse), Salva foi acusado de pedofilia pelo astro mirim do filme, Nathan Forrest Winters, então com 12 anos de idade, e que depois nunca mais deu as caras na indústria. Salva não negou as acusações, e após julgamento, foi sentenciado a três anos de prisão, dos quais cumpriu 15 meses. Ao sair do regime penitenciário em 1992, Salva voltou à cadeira de diretor em 1995, com o suspense Má Companhia (The Nature of the Beast), graças à ajuda de Francis Ford Coppola, que atuando como produtor, estendeu a mão à Salva com o intuito de dar uma nova chance para a carreira do diretor.

Mesmo tendo de lidar com a rejeição de Hollywood, tanto de produtores como de atores e atrizes também, Salva foi capaz de dirigir verdadeiras gemas de orçamento limitado, como o emocionante Energia Pura (Powder, 1995), o edificante Poder Além da Vida (Peaceful Warrior, 2006), e é claro, seus filmes mais famosos até hoje, Olhos Famintos (Jeepers Creepers, 2001) e Olhos Famintos 2 (Jeepers Creepers 2, 2003), ambos lançados sob o selo da American Zoetrope, produtora do amigo e padrinho Coppola. Confesso que sou fã dos dois filmes da saga, e por muito tempo esperei por um possível terceiro capítulo. Porém, mesmo para um admirador dos filmes protagonizados pela horrenda criatura conhecida apenas como “The Creeper“, este Olhos Famintos 3 acabou por ser uma experiência terrivelmente decepcionante.

Situado entre o final do primeiro filme e o início do segundo, Olhos Famintos 3 traz de volta o Sargento Tubbs (Brandon Smith, do citado Energia Pura), personagem que apareceu pouco mas com certo destaque no primeiro filme. Determinado a eliminar a criatura alada que deixou um rastro de morte em sua cidadezinha, Tubbs monta uma força-tarefa equipada para fazê-lo, ao mesmo tempo em que a jovem Addison (Gabrielle Haugh, do horror The Institute), sua mãe Gaylen (Meg Foster, do horror 31), e o incrédulo xerife Tashtego (Stan Shaw, de Olhos de Serpente), acabam entrando na rota de mortes da criatura, que continua em seu ciclo de alimentação que precede sua hibernação habitual de 23 anos, antes de iniciar uma nova caçada humana.

À princípio, este terceiro capítulo da saga do Creeper deveria se chamar Jeepers Creepers: Cathedral, e segundo o próprio Victor Salva, o filme mergulharia fundo na mitologia em torno do monstro. De onde ele vem? O que ele realmente é? Pessoalmente, eu como fã da franquia, adoraria ter estas dúvidas respondidas. Contudo, talvez em algum momento da produção, Salva infelizmente deve ter abandonado esta ideia, já que o produto final deste Olhos Famintos 3 é bastante raso e profundamente frustrante.

O roteiro da produção, à cargo do próprio Salva, não apresenta nada de novo em torno da criatura, mais uma vez interpretada por Jonathan Breck sob a pesada e sempre impressionante maquiagem do monstrengo alado. O filme transcorre como mais um slasher movie qualquer, que coloca um grupo de jovens inexpressivos sendo caçados e eliminados um a um. A protagonista Gabrielle Haugh é uma delas, e dos três filmes da franquia, ela é disparado a protagonista mais fraca. Pouco ajuda também a conclusão um tanto abrupta da produção, que encerra o filme de maneira pouco inspirada ou mesmo interessante.

O único motivo realmente justificável para se assistir à este Olhos Famintos 3 é mesmo sua abominável e fascinante criatura. O Creeper continua apavorante, com sua cara negra e sebosa e seus muitos dentes pontudos e afiados, em mais um trabalho de perícia física do ator Jonathan Breck. Os efeitos-visuais aplicados na criatura também são acima da média e mais realistas do que os dos filmes anteriores. Quem também volta a dar as caras é o velho e ameaçador caminhão dirigido pelo monstro, um dos melhores elementos do primeiro filme e que ficou ausente do segundo. Aqui, apesar da boa utilização do veículo na trama, em certos momentos a verossimilhança passa longe, já que o caminhão se revela praticamente um Batmóvel do mal, repleto de gadgets e armadilhas automáticas e secretas.

Chega a ser triste imaginar o potencial que Salva tinha em mãos para dar à este Olhos Famintos 3 uma cara nova e original, estabelecendo um terceiro capítulo rico e que funcionaria perfeitamente como uma origin story realmente interessante. Entretanto, fica a impressão de que Salva apenas reciclou o que já foi visto nos outros filmes e guardou tudo para um próximo (ou próximos filmes) que viriam. Dado seu complicado histórico como diretor, Salva deveria saber melhor. Com certeza não veremos um novo Olhos Famintos saindo do papel tão cedo.

Olhos Famintos 3 ainda não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, mas deve chegar logo ao serviço de streaming do país.

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