Crítica: The Nightingale (2018)

The Nightingale

Quase cinco anos depois de arrebentar os nervos do público com seu drama/horror psicológico O Babadook (The Babadook, 2014), a diretora australiana Jennifer Kent finalmente retorna às telonas com este The Nightingale (AUS/CAN/EUA, 2018), seu aguardado novo projeto depois de sua estreia em 2014. É complicado dizer que este The Nightingale vale a longa espera dos fãs de O Babadook pelo próximo filme da diretora, essencialmente porque trata-se de um filme completamente diferente, que aborda temas extremamente desafiadores e desagradáveis. Este aspecto entretanto, torna ainda mais notável o fato de que Kent está contando a história que quer, da maneira que quer, e demonstrando grande habilidade e precisão, independente da pressão que deve ter sofrido para entregar algo semelhante ao seu filme de estreia.

The Nightingale apresenta uma performance protagonista simplesmente fenomenal por parte da estreante Aisling Franciosi, que interpreta Clare, uma jovem irlandesa que vive na Tasmânia nos anos de 1820. Numa noite, sua família é brutalmente atacada por um grupo de soldados britânicos, num verdadeiro momento de pesadelo que deixa Clare determinada a buscar vingança a qualquer custo. No entanto, ela não conseguirá realizar sua missão sozinha, e ela contrata os serviços de um rastreador aborígene chamado Billy (o também estreante Baykali Ganambarr), para levá-la através da perigosa vastidão selvagem da Tasmânia no rastro de seus agressores.

Não demora muito para o espectador ter uma devastadora ideia de onde está se metendo ao assistir este The Nightingale. O ataque à família de Clare é uma das cenas mais cruéis que eu já vi no cinema, e o brutal comportamento do filme continua impressionando enquanto o público segue Clare adentrando o interior da Tasmânia. O galã Sam Claflin (do hit Como Eu Era Antes de Você, 2016), apresenta em cena uma forma especialmente repugnante de mal, no papel do Tenente Hawkins, o líder do grupo de soldados responsável pelo ataque à família de Clare. Determinado a subir de patente, Hawkins precisa viajar à pé através do território selvagem para assegurar a posição em outra cidade. Ele se compromete a fazê-lo, mas não sem antes visitar Clare e alçar seu nível de abuso de poder à níveis horripilantes.

Hawkins e seu segundo em comando, Ruse (Damon Herriman, do vindouro Era Uma Vez em Hollywood), personificam uma particularmente desprezível falta de respeito pelos seres humanos, e eles espalham esta abominação por onde passam. Hawkins e Ruse são a maldade em pessoa, algo que vai muito além da simples alcunha de vilão. Tal aspecto horrendo da personalidade de ambos ganha um contraponto interessante na presença de um terceiro soldado, o jovem Jago (Harry Greenwood, de Até o Último Homem, 2016). Enquanto Ruse e Hawkins sempre escolhem o caminho da violência, Jago visivelmente não compactua com os atos que é forçado a cometer sob as ordens de seu superior. Assistir à maneira com que Jago reage junto de Hawkins e Ruse adiciona um componente curioso a The Nightingale; é abundantemente claro que nada de bom viria ao se desobedecer Hawkins, mas mesmo seguindo ordens, Jago mereceria algum tipo de perdão?

Clare também se encontra em uma situação similarmente paradoxal. O que aconteceu a sua família é devastador, mas até que ponto Clare deve a si mesma o ato de seguir em frente? Seria vingança a resposta ou talvez ela possa encontrar a paz seguindo outro caminho? Os ataques iniciais que desencadeiam os eventos do filme são tão desagradáveis de se ver que é difícil recomendar a alguém que se sujeite a assisti-los também, mas a crueza com que Kent constrói tal cena faz com que seu impacto seja de natureza devastadora e duradoura, a ponto de correr pelas veias de todo o filme, aumentando a complexidade da jornada emocional e física de Clare.

O propulsor de tal jornada é o inspirador relacionamento entre Clare e Billy. Como uma mulher condenada, Clare já foi sujeitada a uma significativa quantidade de abuso. Billy também sofre nas mãos dos colonos, temendo por sua vida dia e noite, e também carregando o luto e a raiva dos horrores que viveu em sua própria casa. A relação entre Clare e Billy é um fascinante pedaço de tecido conector que traz uma faísca imediata, mesmo quando os dois parecem formar a dupla mais improvável possível. Ao longo do filme, Kent transforma esta faísca em uma ardente e honesta lealdade que desafia ambos a lidar com suas dores e dificuldades, por vezes através dos sentimentos do outro. O resultado é uma desafiadora e inesquecível procura pela simples bondade humana e pela paz, pela qual ambos tanto anseiam.

Para alguns, pode parecer que Kent abusa um tanto da violência explícita em sua obra, mas esta mão pesada da diretora se justifica quando mostra o peso do que Clare e Billy precisam lidar diariamente. Além dos arcos narrativos dos personagens construídos através do mínimo diálogo, e tomadas de reação cuidadosamente estruturadas para aumentar a acessibilidade e encorajar o envolvimento, Kent também é muito bem sucedida quando captura como o cenário e a paisagem consomem seus personagens. The Nightingale realmente soa expansivo, se assegurando de que o espectador nunca se esqueça da demorada e traiçoeira jornada em que Clare e Hawkins embarcaram. Mas há ao mesmo tempo uma vibe claustrofóbica na produção, que lembra abruptamente ao público do tremendo perigo que o homem representa, especialmente para Billy e Clare. Esta sensação é ainda mais amplificada pelo fenomenal design de som da produção, e também pela escolha de Kent em filmar The Nightingale no confinamento do formato 4:3.

The Nightingale certamente não é para todos os gostos, e é perfeitamente compreensível que alguns prefiram não ser expostos a tal crueldade e brutalidade visual. Contudo, tal aspecto não diminui em nada o valor do filme. Não são apenas momentos voltados para criar choque e medo; eles carregam um propósito. The Nightingale é um filme que brilha e aterroriza ao mesmo tempo, graças à atenção aos detalhes e à coragem de Kent, que leva o espectador a uma jornada sem volta, onde é possível sentir a dor de seus protagonistas. De novo, o filme pode soar excessivo para alguns, mas isso é também um sinal de que quando você ver um filme de Jennifer Kent, prepare-se porque a pancada vai ser forte.

The Nightingale ainda não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente através de serviços de streaming e VOD.

3 respostas

  1. Só um sádico doente encontra “meritos” numa merda de filme desses…com vinte minutos eu estava aponto de vomitar…estupro interminavel, violencia contra crianças… PQP….

    1. O teu comentário é que destila ódio…Um ser humano razoável sabe distinguir entre o bem e o mal,entre o que deve fazer e o que não pode fazer….Tens que crescer mentalmente e espiritualmente.

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