Crítica: The Standoff at Sparrow Creek (2018)

The Standoff at Sparrow Creek

Há poucas semanas, publiquei aqui mesmo no Portal do Andreoli a crítica do thriller policial Dragged Across Concrete, terceiro filme do diretor S. Craig Zahler (do cruel western Rastro de Maldade, 2015), e da porradaça Brawl in Cell Block 99 (cuja crítica também está disponível aqui no Portal do Andreoli). Além da direção de Zahler, os filmes mencionados contam com outro ponto em comum; são produzidos por Dallas Sonnier, ascendente produtor que também banca este The Standoff at Sparrow Creek (EUA, 2018). Portanto, podem ter certeza de que aqui o negócio também é fogo na bomba.

Em uma entrevista recente para o Wall Street Journal, Sonnier detalhou seu plano de produzir “entretenimento para o povão” durante a Era Trump. Um segmento dos filmes que ele banca são voltados para os indivíduos que podem ter votado para o atual presidente, e que se sentem alienados pela ala da esquerda que tomou conta de Hollywood, e que usa plataformas como o Oscar para fazer suas insuportáveis solicitações políticas (leia-se mimimi feminista e semelhantes). “Se nós pudermos fazer um filme que não trate estes eleitores como perdedores ou que não os questione sobre em quem votaram ou porquê, naturalmente a resposta destas pessoas será positiva”, declarou o produtor.

Para ser franco, as inclinações políticas de Sonnier não são do interesse de ninguém a não ser dele próprio, entretanto, esta porção da estratégia de sua companhia é indiscutivelmente ousada. Afinal, é preciso ter peito para admitir a produção em escala de (bons) filmes que possam potencialmente irritar seus colegas da indústria. Contudo, esta é exatamente a fundação de seu novo cinema “exploitation“, onde Sonnier destaca um elemento específico de sua arte de forma que a mesma tenha apelo para um nicho do público (e hipoteticamente, claro, fazer muito dinheiro). A tradução exata desta forma de trabalhar a arte da violência pode ser vista nos citados filmes de Zahler, o atual rei das histórias sobre foras-da-lei, e cujos filmes contêm um viés político no mínimo questionável. A estratégia neste início de empreitada sem dúvida foi um sucesso, já que em minha opinião e na opinião de muita gente (com exceção da esquerda de Hollywood, é claro), Rastro de Maldade e Brawl in Cell Block 99 já são clássicos modernos deste cinema outsider.

Em The Standoff At Sparrow Creek, Sonnier dá um tempo na parceria com Zahler e convoca os serviços do promissor diretor e roteirista estreante Henry Dunham, e o resultado é um cativante e tenso thriller quase que todo situado em um único cenário, onde homens que não têm nada (ou têm muito) a perder, se engalfinham em diálogos que com certeza renderão comparações ao neo-clássico Cães de Aluguel (Reservoir Dogs), de Quentin Tarantino. Quando Sparrow Creek chega à sua sangrenta e violenta conclusão, fica difícil para o espectador entender até de que lado ele estava afinal, já que ninguém é quem parece ser, e todos estão prontos para rasgar as gargantas de seus vizinhos paranóicos.

A trama é simples: Acontece um tiroteio no meio de um funeral da polícia. Através do rádio-comunicador, ficamos sabendo que um homem saiu do meio da mata usando uma armadura, portando um rifle AR-15 modificado, e em seguida disparou diversas vezes, matando vários oficiais de polícia. Os tiras dizem que o responsável provavelmente é membro de uma milícia, e enquanto as buscas pelo culpado começam à todo vapor, a trama transporta-se até um bunker no norte da cidade, onde um grupo de survivalists (indivíduos que se preparam para um eventual acontecimento apocalíptico), construiu um abrigo em uma madeireira próximo ao riacho (creek) do título do filme. Quando eles chegam ao local e resolvem fazer um inventário, descobrem que uma de suas armas – do exato modelo utilizado no crime cometido no funeral – sumiu. As únicas pessoas com acesso às armas estão todas no local, então, cabe ao ex-detetive da polícia, Gannon (o ótimo James Badge Dale, de Noite de Lobos e Spectral, cujas críticas estão disponíveis aqui no Portal do Andreoli), descobrir o real culpado pelo atentado, enquanto a tensão no recinto escala à níveis insuportáveis.

Nós sempre soubemos que isso iria acontecer,” diz Hubbel (o veterano Gene Jones, de O Sacramento e Onde os Fracos Não Têm Vez). “Ir à guerra contra os tiras? No fundo… quem não queria isso?” O grande trunfo do filme de Dunham é o fato dele pintar cada um dos personagens centrais com um distinto tom de paranoia. Ford (Chris Mulkey, de Whiplash: Em Busca da Perfeição), é o áspero líder, que só quer que tudo isso termine. Beckmann (Patrick Fischler, de Under the Silver Lake, cuja crítica também está disponível aqui no Portal), é o homem da comunicação, tentando desesperadamente aplicar a lógica para resolver a situação.

Morris (Happy Anderson, de Bright e Bird Box, cujas críticas também estão disponíveis aqui no Portal), é um ex-supremacista branco, pronto para mandar qualquer um que suspeite dele diretamente para o inferno. Noah (Brian Geraghty, de Guerra ao Terror), é o mais jovem do grupo, e está guardando consigo um segredo decisivo. O mais estranho de todos, entretanto, é Keating (Robert Aramayo, de Galveston e Animais Noturnos, cujas críticas você também encontra aqui no Portal), um rapaz mudo cujo dom para a observação pode fazer a diferença para todos que ali estão. Resumindo, o bunker é um barril de pólvora pronto para explodir.

Dunham trabalha cada cena com exata precisão, bloqueando seus atores de forma que a distância entre eles possa ser superada em um instante, seja através de palavras ou inesperadas ações. A fotografia de Jackson Hunt esconde estes homens entre as sombras, com pouquíssima luz banhando as interações entre eles, enquanto que a edição de Josh Ethier (de Bullet Head, cuja crítica também está disponível aqui no Portal), se aproveita de tais imagens e descobre o exato ritmo da produção, dando aos momentos individuais espaço para respirar, ao mesmo tempo em que deixa-os fluir um em direção ao outro sem fazer esforço. Para completar, The Standoff At Sparrow Creek é um perfeito exemplo do thriller de baixo orçamento. Um suspense de 88 minutos afiado como uma navalha e que termina com um estouro que fará com que seus espectadores passem um bom tempo pensando se o que viram é realmente o que aconteceu.

Entretanto, é difícil não pensar se o mundo criminoso que Dunham criou, se encaixa com a extrema categoria política da plataforma pensada e desenvolvida pelo produtor Sonnier. A conclusão de The Standoff At Sparrow Creek é de arrebentar, mas também demonstra uma séria desconfiança no governo e em sua autoridade. Mas é exatamente isso o que faz o filme tão especial: a coragem de basear sua tese central em torno de uma ideia de natureza radical, especialmente pelos padrões do mundo do entretenimento atual. No final das contas, The Standoff At Sparrow Creek pode até não ter sido feito para você, mas isso não impede que o filme seja realmente espetacular.

The Standoff At Sparrow Creek não tem previsão de estreia no país, e deve chegar ao Brasil através de sistemas de streaming e VOD.

4 respostas

  1. Olá Eduardo, tudo bem?

    Ultimamente estou lendo suas críticas. Gostaria de dizer que o Senhor escreve muito bem, mas achei suas críticas um pouco rasas, com pouca embasamento cinematográfico. As vezes parece que o Senhor tem um viés politico e desvirtua seus textos.

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