Fábio Muniz: Um Milagre, COVID-19, Um Querido Amigo, Um Sobrevivente…

Bom dia meus queridos amigos!

Milagre é um milagre. Milagre não se explica. Caso contrário, não seria um milagre. Milagre se vive…

Ora, eu tenho vivido entre grupos religiosos os mais diversos e variados desde os meus 9 anos de idade. No Brasil, ouvia muitas histórias entre os católicos, evangélicos, espíritas…

Nestes últimos quase 20 anos conhecendo literalmente gente de todo o mundo, fiquei exposto a outros grupos tais como muçulmanos, budistas, hinduístas…

Além de centenas de conversas com ateus, agnósticos e gente que teve uma decepção horrorosa com alguma religião…

O fato é que sempre me assustei quando ainda adolescente lia uma quantidade de livros de autores americanos que diziam, “7 passos para a cura divina”, ou ainda “Venham na cruzada do Fulano de Tal porque o teu milagre te espera”. “Andem 30 quilômetros a pé, subam 353 degraus, e depois, o milagre te aguarda”.

Eu sei que você sabe muito bem o que estou dizendo…

Os anos se passaram e eu descobri que era completamente surdo do meu ouvido esquerdo, sentia a pressão por um “tal milagre”. Talvez eu não tinha fé enquanto oravam e rezavam por mim por tal cura e milagre? O que será que estava acontecendo? Por que aquilo tinha acontecido justamente comigo?

Olha só. Faremos uma pausa aqui…

Eu cresci com a minha querida tia vivendo uma esclerose múltipla, de cadeira de rodas, todos os músculos atrofiados, e vendo as dezenas de tentativas dos meus avós que iam do Norte ao Sul, do Leste ao Oeste buscando passes espíritas na chance de algum “João de Deus” fazer o inimaginável…

Nada acontecia. Até que ela veio a falecer…

Você já ouviu falar da “Terça-feira do Milagre?” E da “Quinta-feira da Prosperidade?” Até parece que podemos marcar hora para o milagre de Deus…

Ora, eu estou escrevendo e falando com você sobre Deus…

Deus domesticável? Deus que se encaixa na minha agenda?

Até parece brincadeira que a gente tem a capacidade de domesticar o Eterno, o Deus de toda a criação, de todos os buracos negros, de todas as galáxias, e fazer o Indescritível e Indesignável entrar dentro de um lugar chamado “templo”, para que eu espere a minha vez…

A minha vez na fila, pois me disseram que o “milagre” começaria a partir das 20:00 horas…

É muita pretensão…

É preciso ser muito doido para ter tal pretensão de anunciar um “milagre” para satisfazer os caprichos de algum “doido” que surtou em nome de um tal “Deus” e quer ganhar confetes de louvores para alimentar o seu narcisismo e estrelismo de “super espiritual”….

Dito isto, eu termino o meu preâmbulo…

E você me pergunta, “Fábio voce acredita em milagre?”

Claro que sim. Eu sou um milagre! Não porque eu fui curado da minha surdez, mas exatamente pelo fato de ainda ser completamente surdo de um ouvido…

Pois bem, eu quando olho para trás vejo que andei muitas milhas para chegar onde eu estou…

Viajando pelo mundo todo, trabalhando em multinacionais, aprendendo idiomas, estudando música apenas e tão somente com um ouvido e cheio de gratidão pela vida. Isto não é um milagre?

Eu sou um milagre porque aos 4 anos de idade, eu poderia ter morrido afogado, e fui sem explicação “trazido de volta à vida”. Se você quiser saber mais sobre este episódio na minha jornada, leia a minha coluna A vida e os seus paradoxos e mistérios.

Portanto, milagre existe, mas não acontece com a domesticação de Deus e tampouco quando eu o coloco no Google calendário. Não!

Milagre não tem agenda e tampouco um determinado lugar, chão, país ou santuário sagrado.

Milagre existe, mas é fruto do reconhecimento do momento, do aqui e agora…

Milagre pode visitar o meu coração onde eu ficarei transbordado de gratidão pelo pão nosso de cada dia, pelo ar que eu respiro e me traz vida, pela água que eu bebo e sacia a minha sede…

Milagre existe, mas ele é extraordinário, porque visita a ordinariedade da existência.

Se o tal milagre que se espera, a saber, os paralíticos andando todos os dias, os surdos ouvindo todos os dias, os cegos enxergando todos os dias, já não seria extraordinário, seria ordinário, e portanto, já sairia da categoria designada “milagre”.   Na realidade, este tema de milagre me faz pensar na relativização do nosso olhar: Sabe por que? Porque olhamos para o cadeirante de rodas, olhamos para o surdo e cego, e dizemos: “Coitadinho!”…

Mas na verdade, há milhares de exemplos e testemunhos que nos mostram o que? Ora, o indivíduo cresceu imensamente como ser humano, e o milagre que ele viveu não foi a cura efetivamente de algo que lhe fazia mal, mas foi exatamente o milagre de ter vivido sem rancor e amargura a sua jornada no chão da Terra contra o apesar de tudo…

Eu conheço gente assim toda hora. Por exemplo, dê um Google e veja os vídeos do Nicholas James Vujicic…

Em contrapartida, eu vejo toda hora gente que recebeu “tal milagre”, prosperou na carreira, recebeu uma oportunidade “miraculosa” e se perdeu, se tornou um arrogante, esqueceu do início da carreira, abandonou a simplicidade de ser gente humilde tanto quanto perdeu a sua integridade, perdeu a sua esposa e filhos…

E tudo começou com uma “grande benção miraculosa” que se transformou na sua pior maldição, e pior inimigo.

Isto posto, eu sei que há muito pano para manga quando o assunto é milagre…

Enquanto eu escrevo esta coluna, eu leio que passamos de 1 milhão de mortos devido ao COVID-19. Eu sei que você conhece alguém que faleceu deste vírus que entrou na nossa existência sem pedir permissão. Não há ninguém que não tenha chorado, se angustiado, se aterrorizado, e que não tenha perdido alguém próximo ou que no mínimo conheça alguém que perdeu algum querido…

Porque alguns foram e outros tantos ficaram?

Não sei. Nunca fui e jamais pretenderei ser secretário e despachante da Santíssima Trindade…

No entanto, eu sei que um querido amigo provou o inexplicável. Foi no dia 22 de março quando eu começava a escrever sobre a pandemia na minha coluna O mundo jamais será o mesmo: Façamos um minuto de silêncio…

O Renato me escreveu…

Está na coluna o seu comentário e o desejo de um mundo melhor. Ele se juntou a minha oração por todos aqueles que estavam passando este deserto e desespero existencial chamado COVID-19…

Ora, ele e a sua esposa já estavam em Tóquio com COVID-19, mas não na UTI…

A sua esposa saiu do hospital, e ele ficou.

Ele ficou e piorou…

Ele piorou e entrou na UTI, mas ainda falava e estava consciente…

Ele piorou…

Ele piorou e entrou em coma profundo…

A sua familia me chamou para uma conversa no WhatsApp. Eu me organizei para acordar as 7:00h (horário Lyon) enquanto as filhas do Renato e as suas irmãs entrariam na conferência WhatsApp a partir de países, horários e continentes diferentes…

Pois bem, eu não sabia o que dizer. Eu não sabia o que esperar. Eu não sabia o que falar. Eu não conhecia ninguém da sua familia, mas me chamaram para estar lá…

A enfermeira pegou o telefone, uma japonesa muito simpática, e levou o telefone para ficar ao lado do Renato. A sua esposa obviamente não podia entrar na UTI.

De modo que a sua filha, Sabrina, que estava em Londres me pediu para começar a falar com ele.

O Renato estava entubado. O Renato respirava com aparelhos. O Renato tinha hematomas por todos os lados e eu comecei a falar com ele…

Falei. Conversei. Disse sobre os nossos encontros no Japão. Falei dos nossos espressos macchiatos. Falei das minhas meninas e da Johnna. Falei que acabara de conhecer toda a sua familia.

Todos falaram. As suas irmãs e filhas….

Pediram para eu fazer uma oração…

Eu não perguntei quem cria, quem não cria, qual religião estava sendo invocada…
Apenas orei e pedi a Jesus que um milagre acontecesse….

A sala, ou o WhatsApp, se encheu de choro e uma Foz do Iguaçu de amor invadiu aquele lugar. Era tangível. Era real. Era palpável…

No mês de abril, a esposa do Renato me pediu para fazer uma gravação para que ele pudesse ouvir a minha voz. Um aparelhinho seria colocado do seu lado. O Renato estava em coma. Eu gravei. Foram 30 minutos lendo salmos. Foram 30 minutos conversando com ele. Foram 30 minutos de oração…

Meses passaram…

Eu conversava semanalmente com a sua filha Sabrina…

A Sabrina, filha do Renato, e o Renato. Eu tive o prazer de conhecer a Sabrina na nossa primeira conversa no WhatsApp quando o Renato estava entubado. Desde então, temos estado em contato e sou testemunha do carinho e amor pelo seu paizinho.

Até que a notícia veio…

Ele acordou. Ele está vivo. Quase 9 meses de coma. Uma gestação. Um novo nascimento. Um milagre inexplicável…

Ele começou a me escrever, mas não falava e não andava…

Comecei a visitá-lo. Comecei a enviar mensagens quase que diárias encorajando a ele para crer que o milagre seguiria…

Na realidade, enquanto ele estava no coma, ele não sentia nada, mas a sua familia sofria. Uma vez fora do coma, a sua familia se sentia mais aliviada, mas era o Renato a bola da vez…

Ele era quem sofria desesperadamente por estar 24 horas refém de uma situação horrorosa, pois enquanto milhares de pensamentos e sentenças pudessem visitar a sua mente e neurônios, nenhuma palavra lhe saía da boca…

Passam alguns dias, passam algumas semanas, e subitamente…

Eu vejo o Renato falando e conversando comigo como conversávamos quando estávamos em Fujisawa, no Japão…

Esta é a foto mais recente entre eu e o Renato. Na semana passada conversamos. Ele estava falando perfeitamente.

Os meus olhos se encheram de lágrimas e não consegui conter a emoção…

É com permissão do meu querido amigo Renato que escrevo este texto. Hoje, ele se recupera em um centro terapêutico de Tóquio porque ainda não pode caminhar…

A sua fé e coragem, perseverança de lutar pela vida lhe empurra a percorrer os últimos 100 metros de uma maratona de quase 1 ano de hospitalização…

Milagres não se explicam, a gente vive e experimenta…

Milagres nos fazem crescer sobretudo como seres humanos nos transformando para sermos melhores pais, melhores avôs, melhores maridos, melhores filhos, melhores vizinhos, melhores…

Assim desejo que o meu amigo Renato saia em breve deste hospital, e que novamente, na Starbucks de Shonandai onde centenas de vezes nos vimos, ou em alguma padaria de São Paulo, ou em algum café de Londres ou Lyon, a gente se reencontre, se abrace e celebre o milagre que não tem agenda, não tem lugares sagrados, mas tem apenas e tão somente a ação do amor entre seres humanos, porque afinal, em última análise Deus é Amor.

Fábio

Collonges-au-Mont-d’Or, França

Fabio Muniz

**O conteúdo e informação publicado é responsabilidade exclusiva do colunista e não expressa necessariamente a opinião deste site.

 

Imagens 01 a 03: Freepik

Imagens 04 e 05:  Arquivo pessoal do colunista

11 respostas

  1. Obrigado por compartilhar mais uma de suas experiências. Isso nos ajuda a entender o amor e a soberania do nosso Deus Pai-Filho-Espirito Santo. Beijos e bênçãos a vocês todos

  2. Olá Loriete,
    Obrigado por passar por aqui e deixar a tua mensagem. É uma grande alegria poder acompanhar o Renato e a emoção dos seus familiares. Um beijo grande a todos em Tampa. Acredito que todos nós estaremos em Julho por aí. Até !
    Fábio

  3. Olá Armandão,
    Eu sabia que o senhor ia se alegrar, vibrar e se emocionar com este testemunho inexplicável. Graças a Deus pela tecnologia. Nestes tempos de profunda dor, solidão, e desespero, a tecnologia nos aproxima mesmo estando tão distantes geograficamente e com tantos fusos horários diferentes.
    Um forte abraço na linda Toronto.
    Em julho estarei Chicago, estou pensando em passar um fim de semana com vocês em Toronto. Saudades de bater um bom papo.
    Boa semana.
    Fábio

  4. Só tenho a agradecer a vc e sua familia por toda a força que vcs nos deram. Escutar a sua voz nos audios e alinda voz da Johanna cantando com certeza ajudou na recuperação do meu pai. Serei grata eternamente a vcs Fabio. Que artigo mais lindo

  5. Oh meu amigo querido,
    Feliz de te ver por aqui. Obrigado por deixar o teu comentário. É apenas uma das incontáveis histórias que acontecem e temos o privilégio de ser testemunhas. Quantas e quantas ocorrem no anonimato e sabemos que é a ação inexplicável do amor divino que faz o indivíduo superar o quase insuperável do ponto de vista humano. Beijão!
    Saudades.
    Fábio

  6. Que linda história Fabião, sejamos gratos a Deus que pode Todas as coisas e faz tudo como e quanto quer. Sejamos gratos quando ELE faz e quando não faz, porque ELE sabe TUDO.
    Siga escrevendo,
    Abraço,

  7. O NOSSO DEUS um DEUS de milagres!
    Um Deus q houve nossas orações nos perdoa e responde com milagres.
    Salmo 86 vers1. Inclina SENHOR,ós teus ouvidos ,e responde me ;pois estou aflito e necessitado.versiculo 10…Pois tu és Grande e operas

    maravilhas;Só tu és DEUS!
    Obrigada SENHOR PELOS MILAGRES DE TODOS OS DIAS EM NOSSAS VIDAS AMEM.
    BEIJOS

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Compartilhe esta notícia

Mais postagens