Andrea Ignatti: Aos apaixonados

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Este texto fala de amor. Se, neste exato momento, não houver absolutamente coisa alguma que lhe venha à memória e remeta à ideia de amor, pare por aqui. Se você não é apaixonado em qualquer sentido que a palavra possa denotar, você talvez entenda este texto de modo totalmente equivocado — ou sequer consiga entendê-lo.

Pode ser que, talvez, nem William Shakespeare entendesse desse amor, que foi infinitas vezes manifesto em seus poemas; talvez nem suas peças de teatro tenham apresentado esse lado do amor.

Tom & Vinicius cantaram o amor de forma inigualável — mas será que contavam com alguma história desse sentimento tão sublime, história tão sonhada e tão vivida por alguém?

Armando Nogueira descreveu, em suas crônicas, o amor de Pelé pela bola (ou ainda: o amor da bola por Pelé), de Garrincha também por ela, de Zico, de Romário, Didi, Zizinho, Ademir da Guia.

Na vida da gente, acontece de a gente querer muito alguma coisa — assim, feito um sonho; ou assado, feito caminho difícil; ou, ainda, feito rumo natural das coisas — que acontecem dia após dia e, quando a gente se dá conta, a vida toda foi o Conto de Fadas ou o Gibi do Super-Herói que a gente leu quando criança, e até decorou.

A história de vida do Juan Silveira dos Santos — o zagueiro Juan, do Flamengo — é, inevitavelmente, história de futebol, que é história de amor. Mas não, não está no gibi. Ele próprio é quem acaba de contar no seu primeiro jogo jogo do Campeonato Brasileiro deste ano: seu último jogo pelo Flamengo. Aposentadoria é um substantivo-substituto. “(…) A primeira coisa que me vem à cabeça não é o tempo em que joguei bola. A memória mais forte sempre será quando, ainda na época de torcedor, eu ia ao Maracanã com o meu pai. Ele saía cedo, fazia feira e eu, apreensivo sem saber se teríamos ou não uma carona até o estádio, esperava seu retorno, enquanto minha mãe servia o almoço de domingo”.

Você já se viu, por esse trecho da carta de despedida que o Juan escreveu, nessas manhãs de domingo, quieto e apreensivo, esperando qualquer movimento do seu pai que pudesse indicar a mínima possibilidade de realizar esse íntimo desejo de ir ao estádio assistir ao jogo? E desejando fortemente que, a depender de uma terceira pessoa, um terceiro fator, nem sequer isso impedisse? Consegue reviver esse sentimento? Intensamente nostálgico? Nostalgicamente intenso? De repente, parece que inocência é isso: é todo esse sentimento de uma vida que passou.

Pode ser difícil mensurar o sonho realizado de alguém. Mas, aos apaixonados, o futebol explica o mundo, explica a vida — e a gente nem percebe que esse sentimento toma conta da vida da gente. Quando vê, já tomou.

Se a sua paixão pelo seu time, pelo futebol, não vai além de torcer pela derrota do seu adversário, não passa de sangue quente disfarçado de alegria fervorosa, você também não compreendeu este texto de amor.

Se o seu jogador predileto se debate aos quatro ventos, cavando posição de ídolo, nem ele nem você entendem desse amor que este texto quer falar. Ídolo não se faz. Ídolo é, assim como o amor, como a paixão que você, um dia, sentiu vibrar por esse seu time. E que vai carregar pela vida afora, desde a primeira manhã daquele domingo.

Uma resposta

  1. Acertou novamente, tenho e por muito tempo, “amor” por alguns ídolos, pratico esporte desde meus 11 anos, e me inspirei alguns, esses mesmos qual tenho esse amor !

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