Do pescoço pra baixo é tudo canela

“Foi na bola seu juiz!” Uns gritavam em espanhol. Outros em português, para o árbitro turco, que parecia completamente perdido no meio da confusão, tentando entender porque aquela gente estava ignorando a bola.

Enquanto isso, no meio da batalha campal, um ferido estendido no chão se contorcia de dor, sem que ninguém “desse bola” para o infeliz. É que os valentões, com “sangue” nos olhos, estavam mais preocupados em se encarar cabeça a cabeça, batendo boca, prometendo revide. E o turco querendo papo, para ver se conseguia mostrar o valor do diálogo. Os jogadores – certamente – não estavam entendendo nada do que ele dizia.

A situação só dava uma acalmada com a intervenção da famosa “turma do deixa disso”. Cada lado tinha a sua. Não se misturavam. Na base do empurrão discursavam: “Deixa disso, vamos ganhar na bola.” Ah! Tá!… diziam os companheiros, entendendo se tratar de um código para enganar o Juiz, que nem estava mais por perto. O turco tinha ido para a beirada do campo falar com os comandantes, que também não entendiam nada que ele falava, mas – pelo menos – respondiam com um OK.

Mas a discussão só acabava mesmo na hora que o capitão gritava: “Chega de papo! Quem vai ficar na barreira?” Cada um seguia para um lado. O mais longe possível do local da falta. Com olhar de não sou eu, ou não é minha vez. O altivo Capitão dizia: “Eu vou! Quem vem comigo, dê um passo à frente. Um monte andava para trás. Mas sempre tem os que ficam parados e acabam na frente. O mais interessante é a debandada na hora da cobrança. Cada um vai para um lado. E quando alguém conseguiu chutar com direção, a bola acabou dentro do gol.

Para evitar o vexame de serem chamados de medrosos, os valentões resolveram dar uma economizada nos pontapés. Aí, coitada da bola. O que levou de coice foi uma grandeza. Para qualquer lado. Muitas vezes para fora do campo. E nada de alívio. Sempre tinha um que devolvia a pelota para a tortura. Pisavam nela. Prensavam ela. Amassavam ela com as mãos, e a jogavam com raiva contra o campo. E tome coice! Talvez com dó, alguns saiam correndo com ela, de cabeça baixa, sem olhar para mais ninguém. Só pode ser para tentar levar ela para casa. Mas normalmente aparecia um “do contra” que não deixava. Quase sempre acertando uma botinada no cara que queria levar a coitada para casa. E lá vinha o turco conversador, apresentando seu cartão. Chegou uma hora que ninguém queria mais confusão, só para fugir do turco.

Essa história tão comum em jogos na várzea, na fazenda, entre casados e solteiros depois de churrasco regado à cerveja, mostra o espírito olímpico de brasileiros e colombianos que lutaram, na acepção da palavra, por uma vaga na Semifinal do Torneio masculino de futebol da Rio 2016. Horroroso! Pelo menos o Brasil venceu com gols de Neymar e Luan.

Quarta-feira, no Maracanã, contra Honduras, a gente torce para ver algo, pelo menos, parecido com futebol. Com mais arte e menos violência.

Uma resposta

  1. Esta é a triste realidade do futebol brasileiro, uma várzea “profissional”. Estamos nos igualando, por baixo, aos outros países sul-americanos. Ótimo texto. Parabéns!!

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