Renata Figueira de Mello: É preciso investir no esporte

Vivi uns bons anos no meio esportivo, como repórter, buscando matérias diferentes das dos meus colegas. Procurando ângulos não explorados, tentando fugir do lugar comum. Esta busca constante daquele detalhe que traçava um perfil mais humano do jogador que tinha respostas prontas para as perguntas habituais (“E aí, acha que o técnico vai te escalar como titular?”; “Você está 100% preparado para o clássico de domingo?”; “Você se garante contra o marcador do time adversário?” – que eles respondiam no automático: “Ah… o treinador é que sabe, vou dar o melhor de mim, clássico sempre é dureza, estou a disposição”, etc…), foi o que de alguma forma caracterizou o meu “estilo”, na época pouco usual, de buscar personagens, histórias de vida, matérias de comportamento dentro do esporte.

Isso me ajudou muito na época em que fui pauteira e chefe de reportagem. Descobrir matérias que em vez de endeusar ou provocar rivalidade entre os ídolos do futebol, os trouxessem mais próximos de sua torcida e até da torcida adversária. Tive mestres brilhantes nesse caminho como Michel Laurence, Carlos Zen, Roberto Avallone, Eliana Arnt entre outros.

Tive o privilégio de viver os bastidores dos grandes eventos, conhecer astros internacionais, mas nada se comparou à experiência que tive, muitos anos depois de apresentar programas como o Jonal do Esporte, Grandes Momentos do Esporte e Hora do Esporte, quando, atuando como diretora de externas de uma produtora independente que fornecia programas à ESPN Brasil, conheci ações que levavam o esporte às crianças através de Caravanas do Esporte, por todo o país. E dezenas de ONGs que se dedicam a isso, muitas vezes sem nenhuma ajuda dos governos.

O esporte, ao lado da educação, tem um papel fundamental no desenvolvimento das crianças. Ele traz saúde, motricidade, noções de espaço, disciplina, sociabilidade e metas a atingir. Eu assisti histórias transformadoras de pequenos e adolescentes que deixaram o mundo da marginalidade, o ócio nas ruas, em função do amor ao esporte.

Pena é ver que o investimento governamental nesta área, além de pouco, é voltado apenas para o esporte de alto rendimento para formação de atletas de elite, porque as grandes competições são as que dão retorno financeiro e visibilidade. Pena é ver a política invadindo as confederações e o esporte de elite manchado por escândalos de corrupção de dirigentes ambiciosos que pagam para obter votos e sediar uma olimpíada, mesmo sem condições.

E ainda muita gente não entende porque nossa atuação nos quadros de medalhas parece sempre tão distante dos países do primeiro mundo. A resposta é simples, porque não se investe no esporte de base. Porque não se introduz o esporte lúdico, infantil, com monitoramento adequado logo nos primeiros anos das crianças, para depois apresentar-lhes modalidades que os acompanhem na escola fundamental. Salvo iniciativas privadas, de ex-atletas e seus institutos, de ONGs e Associações que levam o esporte para crianças da periferia, de comunidades e lugarejos distantes, quase nada é feito nesse sentido para mudar o panorama.

É triste a falta de visão destes que decidem os orçamentos do país, deixarem o esporte à míngua. Mesmo depois da criação do Ministério do Esporte, em 1995, muito pouco tem sido feito para que os parques esportivos sejam multiplicados e as crianças, principalmente dos bairros mais carentes tenham acesso ao esporte, com profissionais de educação física. Talvez se eles se lembrassem que o esporte tem sido um trampolim de salvação do mundo da criminalidade e do narcotráfico para tantos jovens, pensassem menos em estádios grandiosos e mais em pequenas quadras, piscinas e campinhos. O Esporte não cria só campeões disto ou daquilo, mas homens e mulheres mais preparados.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Compartilhe esta notícia

Mais postagens