Crítica: O Menino que Descobriu o Vento (The Boy Who Harnessed the Wind) | 2019

The Boy Who Harnessed the Wind

William Kamkwamba (nascido no Malawi em 5 de Agosto de 1987), é um inovador. Engenheiro e autor, ele ganhou fama em seu país em 2007 quando, contrariando todas as probabilidades, construiu uma turbina de vento para fornecer energia para a casa de sua família, no pequeno vilarejo de Wimbe. William utilizou-se de eucaliptos, partes de bicicletas e outros materiais que ele mesmo coletou em um ferro-velho local. Exibido no Festival de Sundance deste ano e agora a mais nova produção com o selo Netflix, O Menino que Descobriu o Vento (The Boy Who Harnessed the Wind, UK, 2019), descreve a odisseia vivida por William, e é também uma emocionante história sobre família, sobrevivência, e a apreciação da forma mais básica da tecnologia, aquela a qual já subestimamos (e desprezamos) há muito tempo.

Chiwetel Ejiofor (do vencedor do Oscar 12 Anos de Escravidão e do drama A Caminho da Fé (Come Sunday, outra produção Netflix cuja crítica campeã de acessos da internet você também pode conferir aqui no Portal do Andreoli), atua e dirige o filme, baseado no livro homônimo do verdadeiro William Kamkwamba (aqui interpretado pelo estreante Maxwell Simba). Nesta adaptação de Ejiofor, William e sua família são fazendeiros; seu pai, Trywell (o próprio Ejiofor), é bastante respeitado na comunidade, assim como sua mãe, Agnes (Aissa Maiga, de Paris, Te Amo). A irmã de William, Anna (Lily Banda), já está na idade de cursar uma faculdade, mas seu dilema simboliza o problema que toda a família enfrenta ao longo do filme: Quando é certo abandonar as antigas tradições e trocá-las pela modernidade?

Enquanto o dilema de Annie chega ao limite, onde seus pais querem que ela se case com um rapaz da comunidade, mas ela quer ir para a Universidade começar sua carreira, William fica intrigado com um ímã que ele encontra na bicicleta de seu professor. Este ímã estimula o garoto a estudar livros relacionados à energia e seu uso, e algum tempo depois, ele recruta a bibliotecária, a Srta. Sikelo (Noma Dumezweni, do recente O Retorno de Mary Poppins), para ajudá-lo com seus estudos.

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Enquanto isso, a comunidade (na verdade toda a nação de Malawi) está em turbulência. Um novo ditador assumiu o comando, e espancou o líder da comunidade quase até a morte. Imediatamente, os recursos tornaram-se escassos, e pouco depois, uma chuva torrencial alaga os campos, arruinando a colheita. No ano seguinte, vem a seca. E com os poucos recursos que restam sendo alocados para o novo regime ditatorial, não resta nada para a população. A família de William não pode nem sequer utilizar uma bomba para conseguir água para a colheita. O solo está empoeirado, duro e estéril.

Devido à situação, William precisou abandonar a escola. Não haviam mais professores. Sua família precisa racionar a pouca comida que William é capaz de agarrar antes que o governo corte a ajuda humanitária completamente. Numa passagem em particular, onde Trywell, já frágil devido à fome, recusa sua refeição para que sua família possa comer, é de partir o coração. Contudo, William pode ter uma solução, ainda que tal solução vá contra a luta interna da família onde a tradição choca-se com a tecnologia. Esta mesma tradição indiretamente matou muitos no vilarejo, e a família Kamkwambe com certeza é uma das próximas, e o peso de suas escolhas imediatas serão a diferença entre viver ou morrer.

A história por trás de O Menino que Descobriu o Vento é cativante, e a composição do filme de Ejiofor é extremamente eficiente. Tanto a direção, quanto o roteiro do próprio Ejiofor em parceria com o verdadeiro William Kamkwambe e o estreante Bryan Mealer; assim como a edição de Valerio Bonelli (O Destino de uma Nação), e a fotografia de Dick Pope (O Ilusionista, Mr. Turner), funcionam em conjunto de maneira harmoniosa, de forma que nenhum destes elementos da produção pode ser considerado “o melhor” de todos. Tais vertentes são unidas de maneira cativante, e abordam temas que além de serem de fácil compreensão, ainda são de imediata identificação por parte do público. Os momentos de tensão são agoniantes, enquanto que muitos dos momentos dramáticos levam facilmente às lágrimas, dada a natureza honesta e por vezes desesperadora da produção.

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O Menino que Descobriu o Vento está longe de ser simplesmente um filme sobre um garoto que salvou seu vilarejo. Trata-se de um filme sobre família, e como tal família adentra o mundo da tecnologia e dos avanços que vêm com ela. Avanços que vão muito além do que eles poderiam imaginar. É também um filme sobre um pai tentando ensinar seu filho sobre os valores da tradição familiar, ainda que esta mesma tradição por vezes mais os atrapalha do que propriamente ajuda. Outros temas discutidos na produção incluem o tribalismo, e suas vertentes diretas, que envolvem o sexismo e a luta de classes, uma vez que o novo regime trata os membros da comunidade como animais. Sem falar na relevante mensagem sobre a importância do bom uso da ciência.

O Menino que Descobriu o Vento é um olhar atento e íntimo sobre a fome, o colapso governamental e as atitudes tradicionalistas, cuja natureza retrógrada forçou a família Kamkwamba a quebrar longas tradições e abraçar a tecnologia. Trata-se de uma comovente história, de conclusão triunfante, a qual fortemente recomendo para toda a família.

O Menino que Descobriu o Vento estreia no catálogo da Netflix no dia 01 de Março.

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