Lilian Schiavo: Fio da meada

Era uma roda de conversa do nosso Comitê de Cultura, o tema era um livro escrito por uma mulher monja americana e a convidada uma jovem com 26 anos de idade e vivência na Tailândia.

Um debate  sobre budismo, espiritualidade e meditação.

Começou dizendo que o budismo não é uma religião mas sim uma filosofia de vida. A Bianca, este é o nome da palestrante convidada, perguntou se tínhamos alguma religião.

Somos um grupo bem eclético, com católicas, judias, espíritas, muçulmanas, esotéricas e tenho certeza que muitas de nós já viu UFOs, ETs e gnomos.

Sou filha de pai japonês e mãe mistura de chinês com uma nativa de uma ilha paradisíaca e bisavó holandesa.

A pergunta sobre nossas crenças puxou o fio da meada da memória.

Estudei numa escola católica com freiras que usavam hábitos sisudos e chapéus que pareciam voar, de vez em quando uns monges  xintoístas apareciam em casa entoando mantras e defumando incenso pelos cômodos, a mãe da minha melhor amiga me levava para centros espíritas, uma tia era messiânica e outra neopentecostal.  Foi assim que cresci aprendendo a conviver e respeitar a todos.

Por causa da minha avó sou incapaz de matar uma barata, sou do tipo que  assopra as formiguinhas para desviá-las do meu caminho.

Lembrei dos ensinamentos sobre o bambu.

Você já plantou bambus? É um exercício de paciência, só após 5 anos o broto vai surgir na terra. Antes disso, ele cresce para baixo, no subterrâneo, criando raízes profundas, como que para reforçar em nós a importância da ancestralidade, talvez por isso o respeito aos mais velhos e o culto aos antepassados é tão importante para os orientais.

O bambu é oco por dentro, seu interior é vazio para ser preenchido por um novo saber, novas experiências, novas amizades.

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É preciso se esvaziar para dar espaço a novos conhecimentos.

Você já percebeu como as pessoas que acham que sabem tudo são tristes e arrogantes, imaginam que são as donas da verdade, que não precisam aprender mais nada? Insistem em permanecer iguais, sem crescimento, imutáveis.

Em contrapartida, as pessoas que se esvaziam para dar espaço ao novo estão sempre reenergizadas, predispostas a aprender e experimentar, inovar, renovar, renascer!

Para aprender é preciso humildade e uma certa curiosidade para mergulhar em território desconhecido.

Numa tempestade com ventos fortes vemos árvores enormes e robustas desabando, expondo suas raízes e fraquezas.

Como um bambu sobrevive nessas intempéries?

Simples! Ele se dobra, enverga, parece que vai quebrar mas volta forte e resiliente!!

Se você tiver a flexibilidade do bambu é possível retornar mais firme do que antes.

Ser inflexível pode impedir seu crescimento, ao passo que contornando os obstáculos você atinge o destino final.

Você consegue meditar? Ficar em silêncio consigo mesma, em paz, sem pensar em nada?

Exercitamos a contemplação, descobrimos a importância do silenciar, de ouvir o universo.

Terminamos a reunião com a alegria de uma criança ao descobrir algo novo.

Aprendemos a valorizar coisas simples como o barulho da chuva e o pôr do sol.

Puxar o fio da meada da memória me fez entender melhor quem sou e como cheguei até aqui.

Sou grata.

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