Crítica: It: A Coisa (2017)

A primeira vez que li a novela de horror A Coisa, do mestre do horror Stephen King, eu tinha doze anos de idade. Foi cerca de dois anos depois de assistir à minissérie/TV Movie homônima(o) lançada(o) em 1990, produção que até hoje carrega seus valores, mas que nem de perto chegou a cobrir o vasto terreno narrativo que o clássico literário de King conseguiu construir. Nesta minha primeira leitura do livro, até pela pouca idade, também pouco consegui captar sobre a verdadeira e complexa essência da história imaginada por King, que lida com temas que eventualmente se tornaram marcas registradas na trajetória do escritor: o poder da memória, traumas de infância e seus recorrentes ecos na vida adulta, a feiúra que espreita por trás da fachada pacífica das cidades pequenas, e a superação do mal através de confiança mútua e sacrifício.

Mal que em It: A Coisa se manifesta como um horripilante palhaço, que o grande público veio a conhecer graças à citada minissérie de TV (que depois foi editada em telefilme, para caber no formato VHS, popular na época). It: Uma Obra-Prima do Medo (Stephen King’s It), foi dirigido por Tommy Lee Wallace, nome de certa bagagem do gênero na década de oitenta, com títulos populares mas não muito bem recebidos pela crítica, como Halloween III: A Noite das Bruxas (Halloween III: Season of The Witch, 1982) e A Hora do Espanto 2 (Fright Night Part 2, 1988).

Imortalizado pelo ator inglês Tim Curry (do musical cult The Rocky Horror Picture Show, 1975), que entregou uma apavorante performance na adaptação, o palhaço Pennywise traumatizou toda uma geração de espectadores, com certeza aumentando consideravelmente os casos de coulrofobia, termo psiquiátrico usado para os indivíduos que têm medo de palhaços em geral. Mesclando cinismo puro e um sinistro olhar malevolente acompanhado de um macabro sorriso, Curry transformou Pennywise em um personagem que transcende mídias e que se tornou maior do que a própria história da qual faz parte. O que nem tanta gente sabe, é que Pennywise em si não é um palhaço. Trata-se de uma criatura milenar maligna, que toma a forma do maior medo que suas vítimas carregam consigo. Daí o nome “A Coisa” ou “It” no original. A tal “Coisa” diabólica transveste-se, a maior parte do tempo, no palhaço Pennywise para atrair as crianças, suas maiores vítimas, mas pode assumir a forma do que quiser.

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Lançado em 1986, permeando o auge da carreira de King, o romance A Coisa logo tornou-se uma sensação entre os fãs do escritor e também do horror. Com suas quase 1.200 páginas de puro terror, King construiu uma verdadeira epopeia do mal, que, ao lado da saga da Torre Negra, do excepcional A Dança da Morte (The Stand) e do cultuado O Iluminado (The Shining), figura na galeria dos clássicos absolutos de King.

Esta nova versão cinematográfica, dirigida pelo argentino Andy Muschietti (do bom horror Mama, 2013), segue de maneira bastante fiel o romance de King, que é ambientado na pequena cidade fictícia de Derry, no estado do Maine (cenário de 99% das obras de King). Porém, o livro, que é dividido em duas partes, aqui tem apenas sua primeira parte adaptada pelos roteiristas Chase Palmer, Cary Fukunaga (do drama Beasts of no Nation) e Gary Dauberman (da franquia Annabelle).

Ambientado no final da década de oitenta, esta primeira parte de It: A Coisa acompanha um grupo de crianças, sete para ser mais exato e que se auto-intitulam “O Clube dos Perdedores”, que veem-se frente à frente com a criatura do mal que, para a turma de amigos, se manifesta principalmente como o palhaço Pennywise, entre outras coisas horrendas. A criatura foi a responsável pelo desaparecimento do pequeno Georgie Denbrough, irmão de Bill Denbrough (Jaeden Lieberher, de Destino Especial), o líder do grupo e protagonista da história. E as crianças, uma vez entendendo que a única maneira de sobreviver ao horror que as espreita é se mantendo unidos, decidem enfrentar o monstro e destruí-lo de uma vez por todas.

O tal Clube dos Perdedores é um dos pontos fortíssimos da produção, dada a qualidade de seu talentoso e carismático elenco infantil, que além do citado Lieberher, conta também com Finn Wolfhard (da série-hit Stranger Things), e os menos conhecidos mas também ótimos Jeremy Ray Taylor, Sophia Lillis e Jack Dylan Grazer. O grande trunfo e chamariz da produção, entretanto, é mesmo o palhaço Pennywise, que aqui é interpretado por Bill Skarsgård (da série da Netflix Hemlock Grove). À título de curiosidade, o papel de Pennywise nesta adaptação ficou durante muito tempo nas mãos de outro jovem ator, Will Poulter (do recente War Machine, outra produção da Netflix e cuja crítica você também confere aqui no Portal do Andreoli), mas Muschietti acabou optando por Skarsgård.

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E a escolha não poderia ter sido mais acertada. Mais fiel ao design do personagem no livro, esta nova versão de Pennywise assume muito melhor a faceta mais inumana da criatura, além de apresentar um trabalho de maquiagem e figurino nada menos do que espetacular, muito mais eficaz do que o traje um tanto “pobretão” usado por Curry na adaptação de 1990. Vale ressaltar a interpretação insana de Skarsgård, que mesmo por baixo de pesada maquiagem, deixa transparecer os traços peculiares de seu rosto angular e soturno, que garante ao personagem a habilidade de gelar a espinha do espectador.

Muschietti e seus roteiristas foram extremamente felizes no tom que garantem ao filme, que parece ter sido transportado diretamente das páginas do livro de King. O talento das crianças é descomunal, assim como suas interações com o Pennywise de Skarsgård, que garantem ao filme momentos visualmente impressionantes e também de bastante impacto emocional, já que Muschietti enfatiza a relação fraternal entre o grupo de amigos, que descobrem-se completamente sozinhos para enfrentar uma ameaça de poder inimaginável.

Depois de tantas adaptações decepcionantes envolvendo o nome do mestre Stephen King (leia-se A Torre Negra entre outros), é com extrema satisfação que encho a boca para exclamar que It: A Coisa é um excelente filme. O imenso sucesso de bilheteria que o filme se anuncia, já vem se concretizando em seu final de semana de estreia, o que possibilitou à produtora New Line anunciar a pré-produção do segundo capítulo desta nova saga cinematográfica baseada no clássico de King, que trará o Clube dos Perdedores de volta, 27 anos depois, para travar a derradeira batalha contra Pennywise e seus maléficos poderes. Muschietti e seus roteiristas provavelmente continuarão responsáveis pela adaptação da sequência.

O hype em cima do resultado de It: A Coisa é tanto, que nomes de peso em Hollywood como Ben Affleck, Matt Damon e Ryan Reynolds já começam a circundar o projeto, que deve chegar às telonas em 2019. É uma longa espera, mas até lá, é tempo suficiente para ver e rever este It: A Coisa, produção que em minha modesta opinião, figura no mesmo patamar de clássicos baseados na obra de King, como Conta Comigo, Louca Obsessão, Um Sonho de Liberdade, entre outros. Um filme de horror que assusta e cativa o espectador, em iguais proporções.

“We All Float Down Here”…

It: A Coisa está estreando nos cinemas brasileiros neste final de semana.

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Respostas de 9

  1. Apesar de adulto a imagem de muitos palhaços, este é um, me causa muito desconforto, para não falar: MEDO!.
    Independentemente de sua excelente “resenha”….
    Ui…..
    Abraços,
    Zé Luís.

    1. Tem uma fobia específica na psiquiatria: Coulrofobia. (nome estranho também, deve vir de clown, do inglês)….
      Abraços,
      Zé.Luís.

  2. Otimo! O desempenho de seus protagonistas como por exemplo é de Bill Skarsgård é inacreditável. Embora meu favorito do momento é Nunca Diga Seu Nome me manteve tensa todo o momento, se ainda não a viram. Recomendo desde que eu considero que é do Melhores filmes de suspense 2017 No elenco vemos a Douglas Smith dos atores mais reconhecidos de Hollywood que fazem uma grande atuação neste filme.

  3. Meu filme preferido,ate porque não fala somente de um palhaço,e sim de 7 adolescentes enfrentando seus medos.E é incrível,super recomendo.

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