Crítica: Blade of the Immortal (2017)

O diretor nipônico Takashi Miike chega com este Blade of the Immortal (Mugen no jûnin, Japão/UK, 2017) à seu centésimo filme (isso mesmo, CEM FILMES) em sua filmografia. No currículo deste mais que prolífico cineasta japonês, destacam-se obras que vieram a definir seu cinema como algo único, ainda que não agrade a todos. Violência e sexo explícitos, tabus, mais violência explícita, sadismo, sordidez e mais um pouco de violência explícita basicamente definem o tom do cinema de Miike, cujo nome se tornou cult, e cujo estilo se tornou referência até para Quentin Tarantino.

Miike gosta de cutucar as feridas do grande público, com obras absolutamente viscerais. Dentre os vastos exemplares presentes em sua filmografia, destaco expoentes da vertente mão pesada do diretor, como Visitor Q (Bijitâ Q, 2001), filme em que um estranho passa a fazer parte do dia a dia de uma família completamente disfuncional; Ichi: O Assassino (Ichi: The Killer, 2001), produção que narra a rotina de sexo e violência de um capanga da Yakuza; e seu filme mais notório até hoje, o horror Audição (Audition, 1999), em que um viúvo decide selecionar uma atriz para sua nova peça, e ao mesmo tempo encontrar nela sua nova esposa, o que acaba provocando consequências dantescas para o sujeito.

Todos estes filmes apresentam a visão única e um tanto deturpada de Miike em relação ao mundo e a sociedade, entretanto, o diretor também tem um olho para a beleza, e demonstrou isso com plenitude em seu estupendo 13 Assassinos (13 Assassins, 2010), filme que não está isento da mão pesada do diretor, mas que ao mesmo tempo introduz uma outra ótica em seu cinema, discorrendo sobre temas como a mortalidade e a honra de maneira magistral e até poética. E agora, Miike volta ao mundo dos samurais neste Blade of the Immortal, produção de concepção caótica e insana, mas também um verdadeiro arraso, ainda que não carregue a carga dramática de um 13 Assassinos.

O filme traz Takuya Kimura (2046: Os Segredos do Amor) no papel de Manji, um samurai conhecido como “O Matador dos Cem”. Como ele ganhou o apelido, eu pergunto? Bem, por ter matado cem pessoas, é claro. O filme dá início à sua narrativa cinquenta anos antes de seus eventos atuais, revelando como Manji, então um mortal, veio a ganhar sua imortalidade após uma longa batalha contra os homens que assassinaram sua irmã. Os tais cem que lhe renderam o apelido. Desde então, Manji não pode morrer. Ele pode apenas lutar e continuar a viver, não importando o nível de violência ou a gravidade do ferimento imposto sobre ele.

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Dada sua condição de imortal, Manji se torna uma figura amarga e solitária, até que ele conhece Rin (Hana Sugisaki), uma jovem e valente mulher em busca de vingança contra um impiedoso grupo de guerreiros, responsáveis pela morte de seu pai, e o estupro e sequestro de sua mãe. Mestre Anotsu (Sota Fukushi), é o líder do grupo, e está determinado a destruir todos os dojos e suas técnicas de combate. À princípio, Manji reluta em aceitar a causa de Rin, mas atraído pela ousadia e pela semelhança da jovem com sua falecida irmã, ele eventualmente aceita ser o guarda-costas da garota, colocando seus poderes imortais em ação.

O que vem a seguir é essencialmente uma série de sequências de combate onde Manji enfrenta um capanga atrás do outro. É divertido, mas também é repetitivo e esgota o espectador. As lutas não tem a elegância ou a coreografia distinta de outros filmes de samurais, incluindo o citado 13 Assassinos, do próprio Miike. Devido a isso, o filme fica devendo no drama e no desenvolvimento dos personagens. Este talvez seja o mais frustrante elemento de um filme altamente divertido; Miike sabe dirigir ação, mas à parte da selvagem e espetacular batalha final de Blade of the Immortal, nenhuma das outras sequências de ação soam singulares ou memoráveis.

Blade of the Immortal é baseado em uma série de mangás homônima criada por Hiroaki Samura, cuja distribuição durou décadas e que até seria melhor adaptada como uma série de TV. Ou talvez como uma franquia de filmes. Apesar do tom repetitivo da produção, o filme tem vários destaques, como por exemplo a personagem Makie (Erika Toda, da versão japonesa de Death Note), uma verdadeira máquina de matar e uma fiel seguidora do vilão Anotsu, que parte em uma jornada de morte e que depois se arrepende de seus atos violentos. Makie é um dos melhores personagens do filme. Outro destaque é Eiku Shizuma (Ebizo Ichikawa, de Kuime e Ichimei), um outro guerreiro imortal que vive há mais de 200 anos e que assim como Manji, amaldiçoa sua condição. A interação entre Manji e Eiku rendem momentos bastante engraçados ao filme.

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Miike mergulha na estética do mangá, dando a seus personagens um figurino e visual exagerados, que parecem propositalmente fora de lugar no mundo real, mas que dão ao filme um ar bacana de fantasia. A maioria dos personagens parecem um tanto bobos, entretanto, o próprio filme é meio bobo, então o efeito funciona. De fato, o filme é mais bem sucedido quando se apoia em sua cafonice, especialmente nos momentos cômicos, que são distribuídos no roteiro entre uma luta e outra.

O maior problema de Blade of the Immortal, no entanto, é sua exagerada duração. Não há substância suficiente para segurar as duas horas e meia de sua duração, o que fica nítido depois do terceiro ou quarto duelo do protagonista. Kimura tem boa presença, mas falta uma certa química entre ele e Sugisaki, e o filme se ressente disso também.

Contudo, o talento de Miike para a ação violenta segura as pontas, e a maneira criativa com que o diretor trabalha o arsenal de seu filme é fora do comum. O diretor vai com tudo em direção ao último terço de seu filme, encerrando-o com uma enorme e espetacular batalha que empilha membros decepados e produz, literalmente, um rio de sangue que corre pelo campo de batalha. É precisamente o ponto de exclamação que um filme como Blade of the Immortal precisa, e é somente uma pena que Miike leve duas horas e meia para chegar logo aos finalmentes.

Blade of the Immortal não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente para o mercado de streaming e VOD.

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