Crítica: O Que Te Faz Mais Forte (Stronger)

A cada novo filme do ator Jake Gyllenhaal, ressurge uma pergunta que não quer calar: seria este o filme pelo qual Gyllenhaal será finalmente indicado ao Oscar de Melhor Ator? Apesar de não ser uma produção brilhante, este correto O Que Te Faz Mais Forte (Stronger, EUA, 2017), é mais um destes exemplares pelos quais Gyllenhaal merece uma indicação. Mais uma vez o ator brilha intensamente em um papel duro, que exige um bocado deste corajoso intérprete que se torna cada vez mais maduro a cada nova interpretação. Após conferir a espetacular atuação de Gyllenhaal em O Abutre (Nightcrawler, 2014), achei que talvez não houvesse mais espaço para o ator evoluir, tamanha a entrega de Jake no papel. Porém, após conferir sua interpretação aqui, percebi que eu estava equivocado.

O Que Te Faz Mais Forte conta a história verídica de Jeff Bauman (Gyllenhaal), um cidadão de Boston que perde as duas pernas abaixo do joelho no atentado à bomba da Maratona da cidade, ocorrido em 2013 – Para quem quiser saber os detalhes do atentado e da posterior investigação, deixo como dica o filme O Dia do Atentado (Patriots Day), lançado neste mesmo ano, e cuja crítica você também confere aqui no Portal do Andreoli – já que o foco aqui é completamente na dolorosa jornada de recuperação de Bauman. Jeff foi uma das 264 vítimas não-fatais da explosão, que levou a vida de três pessoas entre espectadores, trabalhadores e voluntários da maratona.

Jeff estava bem ao lado do local da explosão, acompanhando sua atual/ex-namorada, Erin (Tatiana Maslany, da série de sucesso Orphan Black), que estava correndo na maratona e a quem Jeff esperava reconquistar. Após o estrago da explosão, Bauman se torna uma história ainda maior, ao reportar ter visto um dos terroristas responsáveis pelo atentado. Não apenas ele é um sobrevivente, como agora também ajudará a derrubar o inimigo, se transformando na imagem do herói que a nação tanto precisava. Jeff, porém, precisa travar suas próprias batalhas para reaprender a viver, e ser mais do que apenas um símbolo.

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Adaptado pelo roteirista estreante John Pollono, com a base de seu roteiro extraída do livro de memórias do próprio Bauman, O Que Te Faz Mais Forte, é o melhor filme da carreira do talentoso porém irregular diretor David Gordon Green (de filmes tão díspares como a aloprada comédia Segurando as Pontas, até o intimista drama Joe, protagonizado por Nicolas Cage). Green e Pollono conseguem garantir veracidade dramática à narrativa dando ênfase aos detalhes da situação enfrentada por Jeff, diferente da maioria dos dramalhões semelhantes por aí. Um exemplo disso é a impactante cena em que as roupas de Jeff são tiradas pela primeira vez desde a explosão, e onde Green borra o background deixando o público apenas com o semblante apavorado e cheio de dor de Bauman em seu campo de visão. Outras cenas são mais “táteis”, por assim dizer, como as cenas que acompanham a fabricação das próteses de Jeff ou a sequência que mostra como é difícil para o protagonista conseguir entrar numa banheira, por exemplo. Tais cenas adicionam um senso de gravidade e realismo à produção, ajudando o filme à sair da armadilha de se tornar uma experiência manipulativa.

Uma grande cena do filme, no entanto, acontece mais ou menos na metade da produção e mostra Jeff tentando ficar em pé com o uso de suas próteses pela primeira vez. Sua face traduz a dor que está sentindo e o personagem resmunga o tempo todo, mas todos ao seu redor, incluindo sua mãe, estimulam Jeff e tentam animá-lo. Entretanto, ele não está animado, e esta cena em particular dá o tom da produção, que transcende os padrões dos drama inspiracionais ao compreender e mostrar à seu público que o trauma não tem nada de inspirador para quem o sofre. Durante boa parte de O Que Te Faz Mais Forte, Jeff é visto pelas pessoas próximas como um herói, e o protagonista se questiona o tempo todo sobre o que isso realmente significa. É aí que o filme de Green subverte sua própria mensagem sobre a acomodação da tragédia para se tornar algo ainda mais notável: um manifesto sobre o valor da sobrevivência.

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É claro que o que realmente “segura” este O Que Te Faz Mais Forte é mesmo o trabalho de Gyllenhaal, em mais uma performance muito acima da média de sua já notável carreira. Gyllenhaal se compromete não só dramaticamente como fisicamente também, e o público embarca totalmente na crível e difícil jornada do protagonista, que passa longe do melodrama e abraça a verdade como motor da narrativa. Vale ressaltar também o belíssimo trabalho da atriz Tatiana Maslany, excelente em seu papel coadjuvante de peso. Várias performances em dramas inspiracionais se concentram nos desafios externos que seu herói ou heroína precisam superar, Mas Gyllenhaal e Maslany reconhecem que é o drama interno que faz com que seus personagens se tornem maiores do que o próprio filme, do que suas próprias trajetórias de superação.

É claro que nem tudo funciona perfeitamente no filme. Algumas destas sequências inspiracionais seriam mais poderosas se fossem mais curtas e diretas. Mas toda vez que a produção ameaça se tornar apenas outro melodrama de Hollywwod, algo acontece para trazer o filme e o espectador de volta à Terra, muito graças às boas escolhas feitas por Gyllenhaal e Maslany (e claro, a direção de Green). O Que Te Faz Mais Forte por vezes soa manipulativo – seria difícil contar esta história e não soar assim – mas eu estarei mentindo se disser que esta manipulação não funciona.

Jeff Bauman por várias vezes se questionou sobre o porquê de ser considerado forte apenas por estar em um lugar que foi bombardeado. Ele não se considera um herói e foge das luzes da fama. Mas independente do que Bauman tem a dizer sobre ele mesmo, este O Que Te Faz Mais Forte se torna um impactante testamento sobre a força e a necessidade humana por símbolos de esperança, além de ter a habilidade para servir de inspiração para quem, assim como Jeff, vem a precisar incessantemente dela.

O Que Te Faz Mais Forte estreia nos cinemas brasileiros no dia 08 de Fevereiro de 2018.

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