Entre Prateleiras e Mesas – Os desafios cotidianos da Família TEA

Há um tempo, uma grande amiga me ligou assim que chegou em casa do mercado. Ela estava arrasada, nervosa e sem chão. Seu filho e ela foram fazer compras, mas acabaram tendo uma experiência extremamente triste.

Essa amiga tem um filho adolescente. Ele é um garoto inteligente, gentil, amoroso e carinhoso. Extremamente inteligente e adora bancas de jornal. Acontece que ele também tem Transtorno do Espectro do Autismo, com nível 3 de suporte, por isso necessita de apoio significativo em várias áreas de sua vida e, em algumas situações, ele não entende as regras sociais.

Naquele dia, enquanto percorriam os corredores do supermercado, ele viu algo que imediatamente capturou sua atenção: uma pessoa usando uma camiseta com o personagem de desenho animado que ele adora.

Na realidade ele tem hiper foco pelo personagem. Quando viu a camiseta com o desenho correu até a pessoa e lhe deu um forte abraço.

O hiper foco pode ser uma característica em pessoas com TEA que leva a desenvolver um interesse intenso e persistente por um tema ou atividade específica. Isso pode ser por um brinquedo específico, um tipo de atividade, por um filme preferido ou, como no caso do filho da minha amiga, um personagem de desenho animado.

Quando algo relacionado a esse interesse aparece, é como se todo o resto do mundo desaparecesse. A pessoa fica imersa nessa atividade, assunto ou ideia.

O hiper foco pode ser positivo e ajudar as pessoas com TEA a desenvolver habilidades e conhecimentos profundos sobre determinados assuntos, mas também pode trazer desafios, como dificultar a transição entre atividades e a compreensão de limites sociais.

Nesta história, infelizmente o hiper foco dele acabou ocasionando uma impulsividade de abraçar essa pessoa estranha, que se assustou sem entender a aproximação física, talvez se sentindo ameaçada ou atacada e empurrou o filho da minha amiga, dando início a um grande tumulto.

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Falta ao menino a compreensão de que abraçar estranhos é invasivo. Para ele era apenas o personagem predileto que estava ali na camiseta e sua forma natural de expressar felicidade e carinho.

Além disso, pode não ser clara nem intuitiva a necessidade de manter uma distância adequada durante uma conversa ou entender o conceito de espaço pessoal. A pessoa com autismo pode se aproximar demais de alguém enquanto fala ou interromper conversas de forma abrupta.

Essa falta de percepção traz desafios constantes em lugares públicos, como elevadores ou filas e no relacionamento com seus pares.

Os passeios em restaurantes também envolvem atenção maior, pois uma pessoa com TEA pode pegar comida do prato de outra pessoa para obter seu alimento preferido. É algo impulsivo, como: ‘Ah! Que legal, aqui tem batata!’

Então algumas famílias saem com alerta ligado ao caminhar entre as mesas tentando evitar que isso aconteça.

Fonte: Pexels

O episódio da minha amiga é apenas uma pontinha do iceberg das dificuldades de socialização. Infelizmente, essa não é uma situação isolada. Muitos pais e cuidadores de pessoas com TEA enfrentam desafios semelhantes diariamente. Seja na escola, em ambientes públicos ou até mesmo dentro de suas próprias comunidades, a falta de compreensão pode transformar situações cotidianas em experiências estressantes e dolorosas.

Daí, é tão importante que a sociedade seja mais informada sobre o autismo, para que as pessoas entendam que tais comportamentos, que podem parecer estranhos ou inadequados, são, na verdade, maneiras de algumas pessoas com autismo expressarem seus interesses.

Ao invés de julgar entre certo e errado, seria muito bom se as pessoas tivessem empatia e buscassem compreender e apoiar essas famílias.

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Espalhar informação sobre o autismo é fundamental, porque ajuda a promover essa compreensão. Isso inclui entender que alguns destes gestos não representam uma intenção invasiva ou maliciosa.

Além disso, é primordial informar às famílias que esses desafios sociais da pessoa com autismo podem ser tratados em terapias que buscam minimizar a impulsividade auxiliando a ler as pistas sociais.

Por isso continuaremos a insistir em políticas públicas para o acesso a serviços de saúde especializados e educação inclusiva.

Eu sonho com um mundo em que as pessoas com TEA possam viver e participar da sociedade plenamente, sem medo de serem mal compreendidas ou rejeitadas. Cada vez que isso acontece, dói em todas nós, mães de pessoas com autismo.

Para sonhar com esse futuro, é preciso espalhar informação e possibilitar que todos sejam tratados com a dignidade e o respeito que merecem.

Para finalizar, lembre-se que aqui é um lugar para você se sentir acolhida! Me escreva sobre suas dúvidas ou compartilhe algum desafio se desejar. Será uma honra conhecer você melhor!

Um beijo e até a próxima quarta-feira.

Juçara Baleki, @querotratamento

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