Crítica: A Taxi Driver (2017)

Com este A Taxi Driver (Taeksi Woonjunsa, Coréia do Sul, 2017), o diretor Hun Jang (do bom drama de guerra The Front Line, 2011), aborda uma série de eventos históricos ocorridos na Coréia do Sul – a imposição de lei marcial no ano de 1980, sob o comando do ditador Chun Doo-hwan – para construir uma comovente narrativa não tão verídica assim. A trama se baseia em uma base real: o relacionamento entre um jornalista de uma emissora de TV alemã, Jürgen Hinzpeter, e o taxista que o conduziu da capital Seul até a cidade sitiada de Gwangju, na época um barril de pólvora pró-democracia, onde seguidas rebeliões estudantis e repressão violenta se sucediam. Enquanto que o verdadeiro nome do taxista e seu destino final permanecem um mistério até hoje (seu nome talvez tenha sido Kim Sa-bok), o filme o batiza de Kim Man-seob, e o roteiro da produção dá ao personagem uma contundente trajetória e uma tocante resolução à seu arco narrativo.

Kim (Song Kang-ho, um dos melhores atores sul-coreanos em atividade, com créditos em filmaços como O Hospedeiro e Memórias de um Assassino), é um viúvo tagarela, pai de uma menina de onze anos. Um tanto áspero, Kim vive reclamando do trânsito e dos engarrafamentos resultantes dos protestos em Seul, e se não fosse pelos aluguéis que deve, Kim não precisaria levar Hinzpeter (Thomas Kretschmann, de O Pianista) à sitiada Gwangju. No entanto ele o faz, e ambos tornam-se testemunhas de uma gigantesca manifestação, que culmina na repressão das autoridades com gás lacrimogêneo e brutalidade militar. O ato de violência faz com que o determinado Hinzpeter resolva contrabandear filmagens dos abusos da ditadura para uma agência de notícias alemã, ao mesmo tempo em que o politicamente neutro Kim constata a urgência da missão do repórter.

E à medida em que a situação se deteriora, Man-seob encontra-se frente à frente com uma decisão a ser tomada: Deve ele garantir que Hinzpeter seja trazido de volta à Seul para que ele possa contrabandear a filmagem para fora da Coréia, ou deveria ele ir para casa o mais rápido possível e voltar para sua pequena filha?

Hun Jang, que trabalhou muito tempo como assistente de diretor, geralmente traz um forte senso de destreza a seus filmes (como o fez em Rough Cut, Secret Reunion e o citado The Front Line), e como o faz também aqui. Os bons valores visuais e técnicos da produção ajudam a destacar a brutalidade imposta ao povo de Gwangju, ainda que o bom roteiro de Eom Yu-na insira alguns toques de humor ao filme.

Entretanto, é mesmo o excelente Song Kang-ho quem repetidamente demonstra como sua presença pode transformar um filme. Como de costume na filmografia do ator, Kang-ho mostra-se uma verdadeira powerhouse, cujo personagem em diversos momentos é maior do que o próprio filme. Atores estrangeiros geralmente encontram-se um tanto fora de lugar quando decidem participar de alguma produção sul-coreana, porém o alemão Thomas Kretschmannn é um raro exemplo de um intérprete que consegue moldar-se ao restante do elenco, particularmente seu parceiro de cena Song Kang-ho. Quem também aparece muito bem na produção em um papel coadjuvante é Ryu Jun-yeol (do recente The King), no papel de um estudante inconformado com os rumos da Coréia do Sul na época.

A narrativa deste A Taxi Driver exagera um pouco em suas sequências finais de perseguição, que adentram o reino da fantasia. Mas elas nem de perto chegam a arranhar este belo filme. A última produção comercial a lidar com o tema de Gwangju foi lançada em 2007: O drama May 18 acumulou mais de 7 milhões de ingressos vendidos (e uma bilheteria de $50 Milhões no país) naquele ano. É interessante observar que, uma década depois, e com outro presidente de política progressiva no poder, um novo filme sobre uma inssurreição que se tornou vital para a luta do país pela democracia, volte a levar espectadores aos cinemas. É a arte correndo em paralelo com a vida.

A Taxi Driver não tem previsão de estreia no país, e deve chegar ao Brasil diretamente em serviços de streaming e VOD.

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