Crítica: Sangue Pela Glória (Bleed For This)

Um dos temas que mais rende maravilhas ao universo cinematográfico é o boxe. Especialmente quando as obras que abordam este universo esportivo, transportam eventos verídicos para a telona. De obras cativantes e emocionantes como A Luta Pela Esperança (Cinderella Man, 2005), filme dirigido por Ron Howard e que conta a trajetória inacreditável do boxeador Jim Braddock; passando pela maestria técnica do diretor Michael Mann e seu Ali (2001), que reconta os eventos em torno da lenda Muhammad Ali; e chegando até o clássico absoluto Touro Indomável (Raging Bull), dirigido pelo mestre Martin Scorsese em 1981, o pugilismo é a vertente esportiva perfeita para equilibrar fatores narrativos que sempre funcionam no cinema (e na vida real): Dramaticidade e superação.

Este surpreendente Sangue Pela Glória (Bleed For This, EUA, 2016) não é tão dramático assim, mas em compensação, retrata uma vibrante e improvável história de superação, que entrou para os anais da Nobre Arte com todo louvor.

O filme, ambientado no final da década de oitenta, traz o ascendente Miles Teller (Whiplash: Em Busca da Perfeição) no papel do boxeador americano e de descendência italiana Vinny Pazienza, cuja carreira parece ter entrado em um declínio irreversível após três derrotas consecutivas. Desencorajado até por seu treinador atual, Vinny acaba sendo treinado pelo também desacreditado Kevin Rooney (Aaron Eckhart, de Batman: O Cavaleiro das Trevas), que foi um dos treinadores de Mike Tyson, mas que agora amarga o esquecimento. Juntos, Vinny e Rooney traçam um planejamento que alça o boxeador mais uma vez ao mundo das vitórias. Entretanto, o que nenhum dos dois poderia imaginar, é que o destino viria interferir mais uma vez nos planos de Pazienza, colocando ambos na rota de uma reviravolta ainda mais inacreditável.

Escrito e dirigido com extremo vigor e vibração por Ben Younger, ele próprio um cineasta que parece tentar retomar o caminho do sucesso, já que após o sucesso com seu filme de estreia, O Primeiro Milhão (Boiler Room, 2000), onde reuniu um elenco de então jovens promessas do cinema como Ben Affleck e Vin Diesel, e de seu morno retorno às telas com Terapia do Amor (Prime), lançado cinco anos depois, Younger não apareceu mais, voltando aos cinemas apenas onze anos depois, com este Sangue Pela Glória. E em seu retorno, Younger não desaponta.

Aproveitando uma história de apelo universal, onde prevalece a superação aos limites e a determinação em vencer os obstáculos dentro e fora do ringue, Younger constrói um filme empolgante e conduzido com valentia, pontuado por sequências de luta orquestradas com maestria. Todos os combates retratados na produção são dirigidos com energia e excelente uso da edição, à cargo do duas vezes vencedor do Emmy Zachary Stuart-Pontier (do drama Martha Marcy May Marlene). O filme utiliza-se muito bem também de uma inspirada trilha-sonora, que conta com hits da década de oitenta, performada por nomes como AC/DC e George Michael, além de composições mais recentes do bluesman Willis Earl Beal. Outro fator extremamente positivo da produção, é a maneira com que retrata os acontecimentos envolvendo a sensacional recuperação de Pazienza, e sua relação de amor e ódio com seu treinador e seus familiares, todos descendentes italianos de sangue quente, num efeito que em alguns momentos, até lembra os do filme O Vencedor (The Fighter, 2010), outra excelente produção, dirigida por David O. Russell, e que aborda um personagem real do mundo do boxe, o lutador Micky Ward e seu problemático irmão Dicky Eklund.

Inclusive, o ótimo resultado deste Sangue Pela Glória deve-se também em grande parte às sensacionais performances de sua dupla central, Miles Teller e Aaron Eckhart. Donos do filme e longe da caricatura, Teller e Eckhart dão vida à dois grandes nomes do boxe mundial, um valente lutador e seu competente treinador, cujas carreiras convergiram no momento em que mais precisavam um do outro. Certa vez, assistindo à um documentário da rede americana ESPN, guardei uma frase que foi dita por um dos entrevistados do programa: “No boxe, o melhor lutador é aquele cujo caráter é definido por seu treinador. E vice-versa.” Tal citação não poderia ser mais verdade. É graças à simbiose entre Pazienza e Rooney que ambos atingem resultados inacreditáveis, e cuja amizade evolui da mera colaboração no córner, para uma relação que viria a definir ambos como indivíduos. E é esta nuance tão importante do relacionamento entre os dois profissionais, que Sangue Pela Glória transmite com perfeição.

Seja por gostar tanto de boxe (eu realmente sou um entusiasta do esporte, desde pequeno vendo lutas ao lado do meu pai), ou talvez por apenas estar precisando ver um filme que fizesse eu me sentir bem, eu simplesmente adorei este Sangue Pela Glória. Contudo, prefiro achar que os verdadeiros méritos do filme vão muito além de apenas agradar à este fã do boxe e cinéfilo que vos escreve. Sangue Pela Glória traduz cinematograficamente, com perfeição, o elemento humano da superação que só existe na vida real. Seja ele dentro ou fora do ringue.

Sangue Pela Glória ainda não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar diretamente ao serviço de streaming e home-video.

https://www.youtube.com/watch?v=2e3jB1EULNI

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