Crítica: Violation (2020)

Violation (CAN, 2020, 107 min.) é um filme tão profundamente desconfortável, que nosso primeiro impulso é pendurar esta sensação de desconforto na traiçoeira estrutura narrativa do filme, ou em seu ocasional marasmo bucólico. Essencialmente, você só quer que esta difícil história de consentimento e vingança acabe. O filme termina, é claro. Mas posso assegurar que continua a assombrar seu sono e seu subconsciente, como que replicando sequências de flashback vistas em cena, repetindo-as incessantemente. Violation é uma típica sessão maldita da meia-noite, mas o horror aqui é real e concreto. Não há espaço para alegorias.

Violation é essencialmente uma versão horror arthouse do famigerado exploitation Doce Vingança (I Spit On Your Grave) e de seu remake, e ainda que seus elementos mais flagrantes – como sangrar até a morte ou dissecar um cadáver – não sejam novos, suas reviravoltas dentro das convenções do que acontece entre um homem e uma mulher nunca haviam sido exploradas de maneira tão eficiente no cinema recente. Ambientado em uma floresta típica dos filmes de terror, Violation mistura natureza e fragilidade mental, o que torna sua narrativa fragmentada ainda mais eficaz.

Violation é alienante desde a abertura: este não é um filme onde a narrativa é entregue de bandeja para o espectador. O filme começa com a imagem de um lobo lambendo carinhosamente um animal morto e em seguida encarando a câmera, antes de cortar para uma viagem de carro onde estão Miriam (a atriz, co-diretora, roteirista e produtora Madeline Sims-Fewer) e Caleb (Obi Abili). Eles são britânicos, mas estamos no Canadá, e definitivamente há algo de errado entre eles. O casal chega à fazenda da irmã de Miriam, Greta (Anna Maguire), que vive com Dylan (Jesse LaVercombe). Greta e Dylan não escondem o amor que sentem um pelo outro, mas Miriam e Greta têm uma relação complicada, definida pelo excesso de proteção de Miriam sobre a irmã; enquanto que Caleb apenas deixa rolar, tentando fazer o seu melhor dentro de um casamento que claramente passa por sérios problemas. Já Miriam e Dylan compartilham de uma amizade que parece ser anterior ao relacionamento dele com Greta; o fácil companheirismo entre eles dá uma ideia de proximidade. E é então que algo terrivelmente inimaginável acontece.

A manobra-chave deste Violation é repetidamente explodir em violência antes de recuar para a hostilidade contida e a excruciante tensão entre seus quatro personagens centrais. Em seus momentos de lavagem de roupa suja, o filme é extremamente visceral. À medida em que a natureza se fecha em torno deles e a floresta se transforma em um caleidoscópio de podridão, a história passa a ser contada toda através da perspectiva de Miriam. O filme então traz seu verdadeiro questionamento à tona: A traição-chave do filme precisa ser vingada por que é uma violação de Miriam e sua irmã? As respostas imediatas da protagonista são violações também, uma delas realmente nauseante. Inclusive, o filme traz uma sequência estendida onde um dos personagens vomita que é dolorosamente realista.

Violation é um trabalho excepcional de estreia de ambos os diretores, especialmente Sims-Fewer, que além de dirigir, roteirizar e produzir o filme, interpreta seu papel intensamente, à ponto de não haver mais divisão entre o que é real ou não na perspectiva de Miriam. A fotografia de Adam Crosby captura a desintegração do mundo de Miriam sob um prisma de realidade, enquanto que o score musical minimalista de Andrea Boccadoro causa alguns arrepios na espinha. Mas é a impressionante edição de Gabriella Wallace que sufoca o espectador, que acompanha uma jornada de tormento e vingança de uma mulher que foi levada para além do limite.

Violation será lançado no canal Shudder e online no dia 25 de março.

**O conteúdo e informação publicado é responsabilidade exclusiva do colunista e não expressa necessariamente a opinião deste site.

Imagens: One Plus One, XYZ e Shudder.

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