Crítica: War Machine (2017)

Posso afirmar que acompanho a carreira do astro Brad Pitt desde sua fase embrionária. Desde seu marcante surgimento com uma pequena participação no drama Thelma & Louise (Ridley Scott, 1991), a seu despontar para o sucesso no início da década de noventa, com participações protagonistas em filmes como o thriller Kalifornia: Uma Viagem ao Inferno (Dominic Sena, 1993), o horror Entrevista com o Vampiro (Neil Jordan, 1994), e o drama de época Lendas da Paixão (Legends of the Fall, 1994).

Pude também acompanhar, com bastante admiração, o evidente amadurecimento do talento de Pitt como ator, que renderam ao astro momentos realmente singulares na carreira, com excelentes atuações em filmes como a sci-fi Os 12 Macacos (Terry Gilliam, 1995), o thriller policial Seven: Os Sete Crimes Capitais (David Fincher, 1995), Clube da Luta (David Fincher, 1999), e mais recentemente, no drama O Curioso Caso de Benjamin Button (sua terceira parceria com David Fincher, em 2008), e no thriller criminal O Homem da Máfia (Andrew Dominik, 2012).

É este talento de Pitt – hoje uma constatação para qualquer fã de cinema – o grande mérito desta irregular comédia em tom de farsa War Machine (EUA, 2017), nova produção original da gigante do entretenimento Netflix. Apesar de ser mais uma produção que tem as mazelas da guerra como pano de fundo narrativo produzida pela Netflix (vide o bastante recente Castelo de Areia, filme do brasileiro Fernando Coimbra e cuja crítica você também pode conferir aqui no Portal do Andreoli), War Machine não carrega nada do ar sério da produção citada, mas ainda assim, consegue transmitir sua mensagem com relevância.

No filme, Pitt interpreta o condecorado General Glen McMahon, um militar linha-dura e um tanto bitolado que é recrutado pelo alto-escalão do governo americano para resolver a periclitante situação envolvendo as tropas americanas no Afeganistão, e a guerra contra a facção terrorista do Taliban, que exerce influência na região. Uma verdadeira lenda de guerra, Glen reúne seu time de parceiros militares de longa data, e arregaça as mangas para solucionar o problema de uma vez. Entretanto, logo o General percebe que mais difícil do que enfrentar o caldeirão do Afeganistão, é enfrentar as enganosas engrenagens políticas de seu próprio país.

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Muito bem dirigida pelo australiano David Michôd, dos ótimos thrillers Reino Animal (Animal Kingdom, 2010) e A Caçada (The Rover, 2014), War Machine bebe de fontes semelhantes à de outras produções provocativas a cutucar o vespeiro da guerra, como o inteligente Mera Coincidência (Barry Levinson, 1998) e o agitado Três Reis (David O. Russell, 1999), dentre outras. Contudo, apesar do filme acertar no humor sutil, longe de ser grosseiro ou evidente demais, o roteiro do próprio Michôd, baseado no livro do escritor Michael Hastings, não desenvolve o potencial do texto em sua totalidade, e o espectador parece ficar aguardando alguma coisa além, que simplesmente não está ali.

O que coloca a produção in motion no entanto é mesmo seu ótimo elenco. Com fortes nomes coadjuvantes como Ben Kingsley, Tilda Swinton (numa curta participação), e o cada vez mais em evidência Scoot McNairy (do recente Aftermath, cuja crítica você também pode conferir aqui no Portal do Andreoli), Michôd acerta em cheio na atmosfera das interações entre Glen e os personagens à seu redor. As duas cenas que colocam Pitt e Kingsley frente a frente, por exemplo, são hilariantes e de se tirar o chapéu, e todas as cenas envolvendo o ator ainda desconhecido do grande público Anthony Michael Hall (da série O Vidente) e Pitt, são muito bem conduzidas e interpretadas.

Vale um adendo para falar mais uma vez sobre a certeira performance de Pitt no papel principal. Performando uma amálgama de seu carniceiro Aldo Raine de Bastardos Inglórios (Quentin Tarantino, 2009), e o idiota completo Chad Feldheimer, da amalucada comédia Queime Depois de Ler (Joel e Ethan Coen, 2008), o astro entrega uma das melhores caracterizações de toda sua carreira, numa atuação impecável do início ao fim.

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E mesmo não explorando tudo o que podia de sua trama, War Machine consegue entregar o que promete, e o cinema americano mais uma vez alfineta sua própria política internacional, especialmente o debatido envolvimento do ex-presidente Barack Obama na questão dos conflitos no Afeganistão. O filme deflagra com eficácia o conflito de interesses na cúpula governamental do país, que utiliza seus jovens soldados como peões de um jogo político que em nada lembra a nobreza do xadrez, e onde todos os envolvidos acabam sempre pagando um alto preço por estar ali, na hora certa, mas no lugar errado.

Uma irregular, mas interessante e ousada produção Netflix, War Machine vale a sessão, especialmente por servir como um mirante para se observar que belo intérprete Brad Pitt realmente se tornou, e de quebra, para também observar que não somente o Brasil guarda esqueletos em seu armário político.

War Machine está disponível no catálogo da Netflix.

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