Fábio Muniz: E se nada existisse para além desta vida…

– Só existe um mundo! O meu mundo – continuou a bruxa. Ela ainda seguia com a sua tentativa de colocar em dúvida a existência do

– Vê aquela lâmpada redonda e amarela iluminando a sala? O que chamamos Sol é parecido, só que é muito maior e muito mais brilhante e ilumina todo o Mundo de Cima. E em vez de estar preso no teto, está solto no céu – disse o príncipe com muita calma e convicção.

A bruxa soltou uma de suas risadinhas sarcásticas e lhes disse:

– Quando vocês procuram saber o que deve ser realmente o tal do sol, não conseguem. Só sabem dizer que parece uma lâmpada. O sol de vocês é um sonho, e não há nesse sonho nada que não tenha sido copiado de uma lâmpada. A lâmpada é real, o sol não passa de uma invenção, uma história para crianças. E repetia perversamente muitas vezes: Não há Sol! Não há Sol…

Jill sentia como se enormes fardos pesassem em sua boca. Por fim, com um esforço que pareceu exauri-la, disse:

– Aslam existe.

– Aslam? Que lindo nome! Que significa Aslam? – Disse a feiticeira.

– Aslam é o grande Leão que nos chamou do nosso mundo – disse Eustáquio – e aqui nos enviou em busca do príncipe Rilian.

– Leão, o que é um leão? – Perguntou a bruxa.

A feiticeira balançou a cabeça:

– Acho que o leão de vocês vale tanto quanto o Viram lâmpadas, e acabaram imaginando uma lâmpada maior e melhor, a que deram o nome de sol. Viram gatos, e agora querem um gato maior e melhor, chamando leão. É puro faz de conta, mas, francamente, já estão grandes demais para isso…

– A feiticeira seguia: Esqueçam estas fantasias infantis. Não há Nárnia, não há Mundo de Cima, não há céu, nem Sol, nem Aslam…

Assim que a feiticeira parou de falar, Brejeiro tomou a palavra e cheio de ousadia, coragem e fé, olhando bem para os olhos da malvada bruxa, falou:

– Não vou negar nada do que a senhor disse. Mas mesmo assim uma coisa ainda não foi falada. Vamos supor que nós sonhamos, ou inventamos, aquilo tudo – árvores, relva, sol, lua, estrelas e até Aslam. Vamos supor que sonhamos: ora, nesse caso, as coisas inventadas parecem um bocado mais importantes do que as coisas reais. Vamos supor então que esta fossa, este seu reino, seja o único mundo existente. Pois, para mim, o seu mundo não basta. E vale muito pouco. E o que estou dizendo é engraçado, se a gente pensar bem. Somos apenas uns bebezinhos brincando, se é que a senhora tem razão, dona. Mas quatro crianças brincando podem construir um mundo de brinquedo que dá de dez a zero no seu mundo real. Por isso é que prefiro o mundo de brinquedo. Estou do lado de Aslam, mesmo que não haja Aslam. Quero viver como um narniano, mesmo que Nárnia não exista.

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Ora, eu acabo de resumir um dos diálogos entre Jill, Eustáquio, o príncipe Rilian, o Brejeiro e a perversa feiticeira no livro A Cadeira de Prata dentro do Volume Único As Crônicas de Nárnia.

Pois bem, tal diálogo se encontra no capítulo conhecido como A Rainha do Submundo. Se você tem me acompanhado nestes últimos meses você sabe também que eu e a minha filha Sophia estamos terminando as últimas das 750 páginas deste livro extraordinário do C.S. Lewis.

Talvez você me perguntará: Fábio porque você está dizendo isto? O que tudo isto tem a ver com os dois temas propostos nas últimas duas colunas “E Deus?! Existe?” e “Deus está morto”.

A razão é muito simples. Eu venho te trazendo numa jornada que tem a ver com a fé e a razão, com a lógica e o salto no absurdo. Eu venho te trazendo numa jornada que vai das experiências objetivas às subjetivas. Eu venho te trazendo numa jornada de encontros inexplicáveis, mas também de muitas coisas que foram ditas em nome de um “deus” que se tornou apenas sub-produto de alguma religião e funciona, em última análise, muito mais como um commodities do que qualquer outra coisa…

Eu venho te trazendo numa jornada onde as dúvidas podem existir. Os medos e incertezas podem tomar conta de nós em momentos que nos sentimos sozinhos. Momentos onde a dor nos acachapa. Momentos onde a esperança se esvanece devido à uma traição horrorosa. Momentos de sofrer por a perda súbita de alguém tão próximo que nos tira o chão da fé…

Eustáquio, Jill e o príncipe Rilian estavam sendo engolidos pelas palavras da malvada e perversa feiticeira que trazia incertezas e dúvidas, confusão e sarcasmo enquanto eles criam na existência do Sol, do Mundo de Cima, da Vida. Eles criam na brincadeira de crianças inocentes, na risada sincera. E mais ainda, criam na existência do Leão dos leões: Aslam.

A bruxa perversa dizia e insistia: “Não há Nárnia, não há Mundo de Cima, não há céu, nem Sol, nem Aslam”.

Quem aqui nunca foi questionado sobre a existência de Deus? Quem aqui nunca foi confrontado se “tudo isto” não passa de “puro faz de conta”? Quem aqui nunca foi debochado por sinceramente se ajoelhar e clamar por “Aslam”? Quem aqui nunca ouviu uma voz interior de questionamentos dizendo, “Esqueçam estas fantasias infantis…”

Eu pessoalmente que vivo nestes últimos 7 anos em países profundamente ateístas, vejo toda hora estas cenas e arquétipos. Mas vejo também, gente angustiada. Vejo também gente sem esperança ainda que prefiram se agarrar no “mundo real”. Vejo gente que olha para esta “fossa” e se gaba deste “único mundo”.

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Vejo gente que escolheu deixar de ser criança há muito tempo. Aliás, muitos deles nunca foram crianças. Muitos deles jamais tiveram uma figura de um pai amoroso, por isso são incapazes de crer num “Pai Nosso que está nos Céus”. Muitos deles são incapazes de brincar e cantar com a filha, “Ciranda, cirandinha. Vamos todos cirandar. Vamos dar a meia volta. Volta e meia, vamos dar…”

Na realidade, eu sou alguém que decidi ser um “Brejeiro”. Eu decidi crer não na religião, mas na proposta simples e singela da lei da vida e dos princípios do amor, misericórdia e justiça propostas pelo Mestre Jesus.

Eu sou alguém que decidi ser um “Brejeiro” porque ainda que nada existisse para além desta vida. Ainda que nada existisse para além desta existência. Ainda que nada existisse para além do que se nota debaixo do Sol. Eu decidi que de todas as propostas ouvidas, na minha opinião, a mais extraordinária foi a de crer que o amanhã será cuidado por alguém que é maior do que eu, é maior do que o Universo, é Maior do que tudo e todos, pois só o Amor é assim. E, portanto, Ele é Amor.

Ora, no Amor nada e ninguém se confunde…

Isto posto, vamos supor que nós sonhamos, ou inventamos, aquilo tudo – árvores, relva, sol, lua, estrelas e até Aslam. Eu escolho a Aslam. Estou do lado de Aslam, mesmo que não haja Aslam. Quero viver como um “narniano”, mesmo que Nárnia não exista. Quero viver como um cidadão do Mundo de Cima ainda que não exista o Mundo de Cima. Quero viver como um estrangeiro que sonha com um mundo superior, pois ele ainda que fosse um sonho, é infinitamente melhor e mais belo do que este mundo real que inegavelmente é um fosso.

Eu escolhi crer no sonho de existir o sol brilhando, as estrelas e a lua iluminando. Eu escolhi crer num Mundo de Cima que um dia não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor, pois toda lágrima será enxugada. Então, me chamem de sonhador. Eu aceito esta vocação de preferir o “mundo de brinquedo” que toda criança imagina. Até porque devemos nos tornar como crianças para ver o Mundo de Cima.

No volume único “As Crônicas de Nárnia” do autor C.S. Lewis, A Rainha do Submundo é o capítulo doze do livro “A Cadeira de Prata”, eu e a minha filha Sophia estamos terminando as últimas das 750 páginas deste livro .

 

Um beijo a todos vocês.

Até a próxima.

Fábio Muniz

Lyon, França

 

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Uma resposta

  1. Aproveito minha passagem por aqui, para deixar meu abraco ao Luiz Andreoli, e agradecer por ele abrir espaco aos amigos que pensam e gostam de escrever o que pensam, como é o caso do Fabio Muniz, que nesta ocasiäo, troxe um pedacinho das CRONICAS DE NARNIA, do C.S Lewis, para que nós que ainda temos forcas para encarar a todo pulmäo, todos os días, as bombas que nos afligem aqui no MUNDO DE BAIXO, possamos entender e crer no MUNDO LA CIMA …..Assim como as meninas brincam de CIRANDA CIRANDINHA, e os meninos brincam com a BOLA NA RODA DO BOBINHO, e gostar disto nunca fez de nós, menores no civismo e menores na educacäo, ao contrario, até hoje, podemos continuar nossa peregrinacäo seja como bons pais e boas mäes, seja na conquista de uma boa formacäo profissional ou na conquista de uma boa formacáo academica, näo podemos perder de vista que O EVANGELHO do nosso grande Mestre, o SENHOR JESUS CRISTO, foi, é e continuará sendo a grande porta para a ETERNIDADE lá de cima, que está aberta pata todos e para todas. Granada, España, 24/05/2021.

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