Klaus Barbie e Jean Moulin: “Quem semeia vento, colherá tempestades”

Bom dia meus queridos amigos,

A simples observação da nossa existência e da história linear é a constatação de um princípio encontrado na tradição judaica dos provérbios e dos profetas, “Quem semeia vento, colherá tempestades”. E mais ainda, este mesmo princípio é visto em outras sabedorias milenares, outras religiões orientais, e também na tradição cristã que afirma “porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará”.

Pois bem, aqueles que me conhecem sabem o quanto eu sou apaixonado pela História. Não há um lugar que eu visite que eu não busque informações sobre os indivíduos que por lá já puseram os seus pés.

Lyon não é diferente. Lyon é uma cidade de histórias extraordinárias. Lyon é um lugar que ecoa capítulos da história do Império Romano, da igreja primitiva do século II e III, da Constantinização que desembocou no processo de fazer a política parte da religião cristã, e de muitos outros capítulos fascinantes da história européia que incluem a resistência francesa na Segunda Guerra Mundial.

Isto posto, ontem durante o meu walking tour pela cidade, eu falava de Klaus Barbie que foi responsável pela Gestapo em Lyon. Eu falava da sua brutalidade indizível que deu-lhe o apelido de “o carniceiro de Lyon” ou “o açougueiro de Lyon”. Eu falava de Jean Moulin que era o símbolo da resistência francesa e líder na cidade, algo nos surpreendeu.

Antes de eu falar o que nos surpreendeu, eu preciso dizer que moramos ao lado do edifício que se tornou o memorial de Jean Moulin em Caluire et Cuire.

“E o que aconteceu com o Jean Moulin, Fábio? ”

Jean Moulin foi surpreendido por Klaus Barbie e agentes nazistas no edifício que hoje se tornou o seu memorial. A resistência francesa fazia uma reunião secreta lá. Klaus Barbie descobriu tal encontro, e todos foram flagrados. O resultado foi a detenção em Montluc, local de tortura e utilização nazista durante o período da ocupação da cidade de Lyon. No processo, Jean Moulin veio a falecer devido a brutal tortura recebida.

A guerra acabou. Klaus Barbie fugiu e voltou para a Alemanha. Klaus Barbie recebeu abrigo político na Bolívia como muitos nazistas receberam novas identidades e se refugiaram em países da América do Sul, inclusive no Brasil.

A ironia da história nos mostra que os americanos venceram os alemães na guerra, mas depois de alguns anos, os mesmos americanos contrataram Klaus Barbie para lutar e vencer os comunistas. Klaus Barbie ajudou os americanos a encontrar Che Guevara. Eu poderia seguir e escrever um livro sobre este assunto, mas não temos tempo para tanta informação e não caberiam tantos detalhes deste episódio em apenas alguns parágrafos de uma coluna semanal.

O fato é que em 1987, Klaus Barbie, finalmente foi extraditado e julgado em Lyon, no Palácio de Justiça no centro da cidade. O fato é que Klaus Barbie quando retornou à Lyon depois de 40 anos do fim da guerra, ele ficou preso exatamente en Montluc, lugar que ele mesmo havia elegido como um dos seus “quartéis generais” e onde centenas de pessoas foram torturadas, presas e mortas.

Ontem durante o meu walking tour enquanto eu mostrava lugares relacionados a todo este capítulo na história de Lyon, uma participante francesa interrompeu o fluxo da minha explicação para dizer:

– “Fábio, posso falar algo? ” Ela me perguntou e percebi que a sua voz estava tremendo.

– “Claro que pode”. Eu lhe dei a palavra e todos começaram a ouvir o que ela tinha para dizer ao grupo.

– “Eu estava lá”. Ela começou a dizer e fez uma pausa.

– “Estava lá, aonde? ” Eu lhe perguntei.

– “Mamãe era uma professora de Inglês e trouxe todos os seus estudantes para ver o julgamento de Klaus Barbie no Palácio da Justiça”.

Ela ainda prosseguiria dizendo:

– “Eu tinha apenas 14 anos de idade, e também acompanhei o grupo. Eu vi tudo”.

– “Você se lembra deste dia? ” Um dos participantes, também francês, queria saber mais e fez a pergunta.

– “Eu me lembro um pouco. Mas, eu sei que a minha bisavó era responsável pelas correspondências, e entregava as mensagens da resistência francesa diretamente ao Jean Moulin”.

Enquanto o grupo inteiro olhava para uma testemunha ocular de fatos históricos tão fortes, falávamos de como a vida se torna um bumerangue com um princípio inegável.

Quem semeia amor, colhe bondade. Quem semeia generosidade, colhe aconchego e carinho. No entanto, quem semeia vento, colherá irremediavelmente tempestades.

Desejo a todos vocês uma ótima semana.

Até a próxima!

Collonges-au-Mont-d’Or

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