Lilian Schiavo:  Feminismo e Sororidade.

Uma roda de conversa entre mulheres diversas, profissões e idades variadas, todas juntas e misturadas.

Nós somos surpreendentes, a maioria de nós nunca se encontrou pessoalmente, encontro virtual, cada rosto num quadradinho do computador.

Nem lembro qual era o tema da reunião, só sei que de repente alguém falou que era feminista…

A reação é incrível, todas olham com empatia. Sim, somos todas feministas!

O feminismo defende a condição de igualdade entre homens e mulheres na sociedade e o direito de decidirem sobre sua vida, tanto individualmente quanto no âmbito político e coletivo.

É diferente do feminismo que prega a superioridade do gênero feminino sobre o masculino.

Fui criada por uma ativista, feminista até o último fio de cabelo, do tipo que aboliu o soutien do guarda-roupa e empunhava a bandeira da liberdade das mulheres nos anos 60.

O engraçado é que só recentemente refleti sobre isso.

Minha mãe era uma revolucionária: um dia apareceu com o cabelo cacheado (somos orientais com cabelos tão lisos que fazem com que você nem precise pentear, estão sempre iguais), blusa verde neón transparente estampada, óculos de sol gigantescos e livros da Simone de Beauvoir para eu ler.

Naquela época era comum ver nas festas rodas de mulheres num canto e roda de homens no outro, eu ficava grudada na minha mãe e antecipava o resultado… ela era médica,  detestava serviços domésticos e achava inacreditável quando ouvia alguém contar toda sorridente que tinha ganhado panelas como presente de aniversário, ela preferia ganhar presentes de uso pessoal. Quando as mulheres começavam a trocar receitas culinárias ela se transformava num peixe fora d’água.

Bastavam 15 minutos para ela inventar uma desculpa e correr para a roda dos homens, sentar ao lado do meu pai, rir das piadas e contar casos médicos, até hoje tem gente que acha que sou profissional da saúde de tanto que aprendi sobre termos médicos, patologias e tratamentos.

Ela dizia que eu deveria ser independente como ela, que deveria ser responsável pela minha vida, pelas minhas escolhas, que deveria estudar, viajar, conhecer o mundo e outras culturas, ler muito, ter fé e sonhos.

Meu pai também era feminista, filho único que teve duas filhas mulheres, contava para nós histórias da Madame Curie, Florence Nightingale, Amelia Mary Earhat, Cleópatra, Mata Hari e guerreiras samurais. Ele nos incentivava a ser corajosas, idealistas, estudiosos e fortes e quando criança nunca soube que mulheres pudessem se sentir inferiores.

O resultado é que eu e minha irmã crescemos acreditando piamente que as mulheres podiam ser o que quisessem

Na roda de conversa ouço atentamente os relatos de cada uma, vidas tão diferentes com trajetórias que por alguma razão desconhecida desembocaram naquele momento de troca de experiências.

Carregando cicatrizes, crenças limitantes, críticas que fazem recuar, tetos de vidros e pisos escorregadios… nada detém essas mulheres.

Nós praticamos a arte da “escutatória”, ouvimos atentamente, entendemos as dores, compartilhamos experiências.

Vivemos a sororidade, que significa relação de irmandade, um comportamento de não julgamento, de empatia.

É entender que não devemos apontar o dedo porque não somos as donas da verdade, e isso dói… é difícil enxergar os dois lados da história, o fácil olhar para o próprio umbigo, fazer pose de vítima e acusar.

Então, se sua escolha foi priorizar a carreira profissional em tempo integral está tudo bem, se você decidiu que a maternidade não cabe na sua vida e prefere criar pets, está tudo bem.

Se você resolveu fundar uma ONG e defender as baleias, ou ser mãe de 5 filhos e viver para cuidar deles, ou quem sabe seu sonho é virar monja num retiro na Índia, ou ser vocalista numa banda de rock, ou seja, lá o que for…

Está tudo bem!

Ser feminista, empoderada e exercer a sororidade implica em respeitar as escolhas das outras, entender as diferenças, aprender com elas e crescer.

Minha irmã se formou em Medicina mas resolveu largar a profissão para ser mãe, até hoje quando conto sua história percebo olhos arregalados, como é possível estudar tanto, se esforçar e jogar tudo fora?

Mas quem disse que ela jogou fora? O fato dela não exercer a profissão não implica numa amnésia ou cirurgia de lobotomia para retirar o conhecimento aprendido, ela continua sendo médica, só que sem trabalhar na área.

Ser feminista, ter empatia e sororidade implica em liberdade, para si mesma e para outras, é respeitar e apoiar umas às outras, é se alegrar com a felicidade alheia.

Ter sororidade é não criticar, é lembrar que na mesma medida que você julgar também será julgada.

É olhar para a outra com olhos generosos, coração aberto e disposição para dar a mão.

É criar uma rede de apoio onde uma fortalece a outra, é subir no palco e levar outras com você para dividir os aplausos e conquistas.

“Sozinhas invisíveis, juntas invencíveis!”

Lilian Schiavo

 

Imagens: Freepik

 

 

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