George Ross: Música de verdade

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“Essa música é um lixo”, “isso sim que é música de verdade”, “música boa se fazia antigamente” são algumas das expressões que já ouço faz algum tempo e que me fez refletir sobre o assunto: afinal, o que é música boa? Como alguém que vive da música, seria raso ou até irresponsável sugerir qualquer resposta simples a esse questionamento.

A subjetividade da arte faz com que o espectador avalie a obra sob a sua ótica, prevalecendo as questões que julga mais importantes. Porém, um fator decisivo na formação do citado julgamento está ligado diretamente com o sentir, com o momento em que o nosso íntimo atua trazendo a sensação de identificação com a obra, e que muitas vezes nos leva a crer – levianamente – que determinado som é melhor que outro, afinal, ele está mais próximo de nós e o sentimos como parte de nossa história, trazendo-nos caras memórias, ou até desejos de algo que gostaríamos de viver ou acreditar.

Não se pode deixar de citar a influência do contexto social do indivíduo como fator fundamental em sua expressão artística e em suas preferências. É muito comum, por exemplo, que moradores do Rio de Janeiro produzam, ouçam e apreciem o funk carioca, por exemplo. Pessoalmente, acho triste o conteúdo de grande parte de suas letras, notadamente pelo seu conteúdo sexista, que acaba por depreciar o papel da mulher; por outro lado, ao observarmos o seu elemento rítmico podemos notar a influência direta do maxixe sobre o funk, que considero particularmente rico.

A música reflete, ainda, a cultura da região em que ela foi criada, motivo de muito orgulho para nós, brasileiros, que misturamos diversos ritmos fazendo um verdadeiro e nutritivo caldeirão cultural. Assim, cada região pode ser identificada por seus ritmos específicos, e acabamos criando alguns estereótipos tão particulares que se torna divertido imaginar um gaúcho dançando maracatu, um carioca apreciando milonga, ou um paulista expressando-se por meio do frevo.

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Será que uma música “boa” é a música que reflete o contexto político e social de um povo? Ou aquela que consegue expor as dificuldades de uma época que não podem ou não conseguem ser vistas? O famoso compositor carioca, Chico Buarque, é criticado por muitos em razão de expor um viés político que não agrada parte de seus potenciais ouvintes, afastando-os de uma obra que, não fosse a crítica trazida, poder-se-ia representá-los; por outro lado, atrai milhares de espectadores que compartilham de sua ideologia progressista.

Já em uma análise estritamente técnica, vale a pena destacar a importância que se dá a uma obra complexa e harmoniosa em detrimento de uma obra simples. A tendência é que as pessoas com um maior acesso à informação valorizem o complexo, já que demanda mais estudo para elaborá-lo e mais esforço para alcançá-lo, ensinamento que é comumente disseminado e valorizado até mesmo nas escolas, que costumam estimular a competição. Mas a música pop – considerada por muitos estudiosos da música por seu simples conteúdo harmônico, rítmico e melódico – coloca em xeque tal posição, uma vez que é capaz de lotar estádios e formar artistas reconhecidos mundialmente. Quem aí não ouviu ou cantou “Ai se eu te pego” no ano de 2011? Será que o mais simples está mais próximo do sentir da maioria das pessoas?

Cabe destacar, também, a relevância da letra aliada ao instrumental. Poder-se-ia concluir que uma música de qualidade seria a que se aproximasse da poesia e que tivesse um conteúdo de valor?

Outra coisa que sempre me chama atenção é que cada música pode ter sua importância alterada em ocasiões e contextos distintos. Quantas pessoas gostariam de ouvir Mozart em uma balada? Ou as obras da Ivete Sangalo em um concerto de uma filarmônica? Como seria ouvir metal no início de uma festa de formatura e sertanejo em um velório? Quem conseguiria meditar ouvindo um bom rock? Se fizéssemos a pergunta a um dançarino, suspeito que respondesse que música boa é aquela que faz o esqueleto mexer.

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Já pararam pra pensar que a maior parte das religiões utilizam a música como forma de expressão? Seria a música uma forma de nos aproximar do que há de mais divino dentro de nós?

Não tem coisa melhor do que se deparar com uma música que faça com que o nosso íntimo seja expressado, sentido e representado da forma mais genuína e livre possível. Que seja capaz de chacoalhar, emocionar, fazer pensar e transformar.

A ideia foi trazer a você, caro leitor, muitas perguntas e nenhuma resposta (aliás, adoraria saber a sua opinião a respeito nos comentários). A única conclusão possível é a que música boa é a música que nos toca, que faz o coração vibrar! O resto é preconceito.  Queria fazer um agradecimento especial a minha namorada, Bruna Arruda Brasil Zonta, que além de ter dado a ideia para eu discorrer sobre esse assunto, teve participação direta na revisão, lapidação, sintetização e acréscimos imprescindíveis ao texto.

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