César Romão: A confiança pode virar força

O fator confiança foi decisivo em muitas situações ao longo da evolução da humanidade, mas a ausência deste fator criou e ainda cria um buraco negro entre as pessoas onde uma ponte jamais pode ser construída e assim ninguém pode atravessar.

Quando ainda garoto prestava expediente numa mercearia na esquina de minha casa, sempre pela manhã, ajudava na venda do pão e leite, nos tempos do leite em litro e do pão em bengala ou filão. O dono da mercearia não fazia questão de receber quando as pessoas estavam sem dinheiro, ele marcava tudo numa caderneta, um caderninho com espiral, ali ia o nome o dia e o valor. Todo seu faturamento estava ali, sem nenhum outro comprovante ou prova de que aquelas pessoas deveriam quitar seus débitos. Todo dia dez de cada mês, aquelas pessoas da caderneta, sem exceção, lá compareciam para quitarem seus débitos e abrirem uma nova folha de débitos naquela caderneta. Lembro-me que o dono da mercearia sempre dizia que aquela caderneta era um símbolo de confiança em seus clientes e que nunca ninguém ficou sem quitar seus débitos.

A confiança hoje está em uma baixa terrível, e tudo começou quando o ser humano passou a não confiar nele mesmo e a pensar em coisas que poderiam lhe dar vantagem criando-nos outros imagens a sua própria semelhança, medindo os outros com sua própria régua.

São filhos que não confiam nos pais; pais que não confiam nos filhos; casais que vivem em plena desconfiança entre si; no mercado de trabalho então, nem vale comentar como a confiança está desaparecida. Temos que outros possam nos fazer coisas que jamais poderiam fazer, e vamos nos precavendo tanto contra tudo e todos até terminar entrincheirados em um mundinho solitário, temendo até olhar por uma fresta de oportunidade. Ganhamos um presente de alguém e já vamos pensando: – o que será que está pessoa vai querer de mim? Parece que tudo funciona por interesse. Quando não confiamos nas pessoas, atribuímos a elas algo que nem sempre é verdadeiro.

“Em Deus tenho posto a minha confiança; não temerei o que possa fazer o homem”.

Mais do que temer os outros pela falta de confiança, devemos temer a nós mesmo em nossos pensamentos, julgamentos e visões distorcidas de quase tudo. Quando colocamos luz em nossos olhos o mundo fica iluminado.

A caminho de Damasco de posse de cartas para as sinagogas autorizando a prisão dos seguidores de Jesus, Saulo de Tarso é surpreendido por uma intensa luz e a presença de Jesus numa visão que o deixaria cego por três dias, até seguir as instruções de encontrar Ananias para curar-lhe.

Foram três dias em total escuridão para um homem acostumado a perseguir, dar ordens e realizados daquilo que julgava ser o correto. Três dias de uma cegueira que he causou profundas reflexões sobre ele mesmo e sua maneira de viver e tratar as pessoas e o mundo. Uma escuridão que o conduziu a luz e o transformou em Paulo, um dos mais importantes apóstolos de Jesus e um dos mais influentes escritores do cristianismo.

Às vezes estamos tanto no “automático da vida” que não percebemos a diferença entre a realidade da existência e a realidade do mundo. Estamos tão focados em coisas que nos afastam de nossa verdadeira essência e nem percebemos. É quando a vida nos dá provações para tentar deter nossa investida trajetória de insensatez e insensibilidade em relação a nossa família, nosso trabalho, nossos amigos e nossa crença. Somos abatidos por uma cegueira, que nos deixa encurralados em um labirinto, impulsionados a voltar para nosso interior e buscar a luz que guiara nossos olhos. Nem todos conseguem, e muitos continuam seu caminho como cegos achando que aquela escuridão é uma nova maneira de ver as coisas.

Aqueles que conseguem em meio às provações rever seus princípios, seus valores, sua maneira de viver, são os que realmente aprendem e desfrutam das lições das provações, todas tem uma lição intrínseca que nada vale se não tocar o interior do coração e da alma de quem a vivencia.

As provações e desafios são como a luz do caminho de Damasco que cegou Saulo de Tarso, tem como objetivo nos frear em nossa conduta fora de rota e nos causar meditação sobre como devemos ser quando tivermos outra chance, elas são uma escuridão que conduzem para luz.

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