Creio que, neste ano, eu tenha completado 30 anos como cinéfilo. Desde meus sete, oito anos de idade, até o dia de hoje, foram inúmeros os filmes assistidos e, de uns anos para cá, várias as produções analisadas e resenhadas para diversos sites e publicações. Mas nada, NADA, poderia ter me preparado para o que estava por vir, com esta verdadeira vertente do absurdo e do nonsense, The Greasy Strangler (EUA, 2016). Uma produção tão insana e demente, cuja própria existência desafia as leis da natureza humana e, porque não, da cinematográfica também.
Fruto da imaginação podre do diretor e roteirista Jim Hosking (de um dos segmentos da antologia O ABC da Morte 2), que assina o roteiro com seu colaborador Toby Harvard, The Greasy Strangler fez sua estreia no (PASMEM!) prestigiado Festival de Sundance 2016 e, até pouco tempo, estava sendo exibido também no Festival de Cinema do Rio de Janeiro. Estas exibições até se justificam, já que, apesar de toda a natureza abismal da produção, a mesma até que carrega um certo estilo retrô tão bizarro quanto interessante, que remete bastante ao estilo do diretor Jared Hess, principalmente de seu melhor filme, o ótimo Napoleon Dynamite. De fato, The Greasy Strangler pode até ser considerado um primo distante do citado Dynamite. Um primo BEM distante…
O filme retrata uma incomum convivência entre pai e filho, personificados aqui por Big Ronnie (o obscuro veterano Michael St. Michaels, que não tem maiores referências no currículo), e Big Brayden (Sky Elobar, do recente Don Verdean, filme dirigido pelo citado Jared Hess), respectivamente. A dupla sobrevive como guias de uma “Disco Tour” fuleira conduzida por Big Ronnie, que parece não ter saído da década de 70, com suas vestimentas horrendas e cafonas, e um cabelo ainda pior. As coisas começam a complicar para a dupla quando ambos se apaixonam pela mesma mulher, a oportunista e atarracada Janet (Elizabeth De Razzo, de Os 33), ao mesmo tempo em que o tal “Greasy Strangler” do título, um assassino estrangulador que se banha em gordura antes de matar suas vítimas, acumula vítimas na vizinhança.
É em cima deste fiapo narrativo que Hosking destila uma enormidade de situações e personagens dantescos, que literalmente mergulham o público em um barril de óleo pegajoso, que aos poucos derrete o cérebro do incauto espectador. Mas Hosking não o faz sem antes arrancar boas risadas da audiência. Alguns diálogos são verdadeiras pérolas do nonsense e já nascem prontos para se transformarem em memes no futuro – o termo “Bullshit Artist” já nasce mítico (rs!) – E a galeria de personagens da produção são todos de uma bizarrice tão grotesca, que fica difícil não sentir um estranho e incômodo fascínio em ao menos tentar compreender de onde, na cabeça do lunático realizador do filme, tais criaturas medonhas possam ter saído.
É claro que a epítome da concepção medonha dos personagens, é personificada pelo inacreditável protagonista da produção, o desconhecido veterano Michael St. Michaels, no papel de um velhote ranzinza, boca-suja, repugnante, completamente pervertido (o personagem passa boa parte do filme completamente nu, portando uma prótese genital bisonha) e, ainda por cima, com um incomum fetiche sexual e alimentar por gordura e óleos variados (numa clara alusão ao clássico “Grease“, ou Nos Tempos da Brilhantina, como ficou conhecido aqui no Brasil), produção estrelada por John Travolta, ícone da era disco a qual o protagonista tanto venera.
Michaels, assim como Dieter Laser, o estranhíssimo ator alemão protagonista do peçonho A Centopeia Humana, é um daqueles casos de um ator, de idade um tanto já avançada, cujo sucesso nunca bateu à porta, e cujo reconhecimento de seu talento (sim, talento), ironicamente, chega à luz através das trevas de uma produção que já nasce com o estigma de maldita. Entretanto, para eles, nem tudo está perdido. Afinal, toda produção maldita tem a tendência de se tornar cult. E The Greasy Strangler, definitivamente, tem tudo para se tornar cult, numa espécie de extensão ainda mais inusitada do trabalho do polêmico cineasta John Waters, conhecido por exemplares malditos (e cults) do cinema, como Hairspray (1988), e o famigerado Pink Flamingos (1972).
Não fosse por sua conclusão decepcionante, que deixa de lado a atmosfera cotidiana e brega da produção para se embrenhar sem necessidade pelo caminho do alegórico, este inconcebível The Greasy Strangler poderia ser mais facilmente digerido como uma comédia de excentricidades. Tudo na produção é feio e cafona, mas ao mesmo tempo, o filme traz consigo um inegável apelo, graças à sua concepção única e original, e elenco corajoso e cara de pau. Aliás, se existe algo pelo que Jim Hosking e seu The Greasy Strangler não podem ser considerados culpados, é por uma possível falta de originalidade. Você pode curtir ou odiar e repelir o filme. Mas com certeza, The Greasy Strangler é algo como você nunca viu.
E se caso você pensar que JÁ viu algo remotamente parecido, então você é um Bullshit Artist!
The Greasy Strangler não tem previsão de estreia nos cinemas do país, e deve chegar direto ao serviço de streaming e home-video.