Tenho que concordar que, no Brasil, a televisão tira público do futebol.
Comecei a frequentar estádio de futebol no início dos anos 70. Época em que as transmissões de futebol pela televisão aqui no Brasil ainda engatinhavam.
Época em que poucos podiam ver na telinha, brasileiros dando show de bola pelos campos do Brasil e do mundo.
Poucas partidas eram exibidas ao vivo. Normalmente o que a gente via era o “vídeo tape”. Aliás, era bastante comum a turma do estádio ir correndo para casa e rever o jogo pela TV.
Transmissões de futebol internacional começaram a fazer parte do nosso cotidiano a partir do mundial de 1974, na Alemanha. E só no final dos anos 80, início dos 90, é que passaram a ser mais comuns por aqui.
No início dos anos 70, clássicos com menos de 100 mil pagantes eram fracasso de público.
Não havia divisão de torcidas. Era tudo misturado.
Lembro do meu primeiro jogo em estádio: Corinthians 4 x 3 Palmeiras, em 1971. Cento e vinte mil pessoas no Morumbi.
Lado a lado, palmeirenses e corintianos comemoravam os gols de suas equipes, sem que houvesse qualquer animosidade. Fim de jogo, festa corintiana e todo mundo saindo junto do estádio, indo para casa.
Em meados da mesma década de 1970, surgiram as torcidas organizadas. Usavam fantasias e “leis” próprias. Quem não era do grupo não podia ficar junto com eles.
Pouco tempo depois, a turma organizada começou a mandar uma tropa antecipada ao estádio para reservar o lugar que eles iriam ocupar. E expulsavam do setor reservado até quem tivesse chegado mais cedo para sentar naquele lugar.
Grandes bandeiras com mastros de bambu ou plástico. Instrumentos musicais de escolas de samba. Papel picado, papel higiênico, rojões, fumaça colorida, cantos, palavras de ordem e a cada vez maior exposição pela televisão, destacaram as organizadas da multidão.
Com a “fama”, veio o sentimento de que eram os únicos dignos de serem chamados verdadeiros torcedores. Como se os “desorganizados” não pudessem ser.
A supremacia sobre os torcedores do próprio time não bastou. E nasceu o desejo de se sobrepor a todas as outras torcidas.
Daí foi um pulo para que bandeiras, mastros, instrumentos, rojões – e mais recentemente – sinalizadores, se transformassem em armas contra todos que desafiassem o “poder” das organizadas.
Ao invés de festa, a TV passou a mostrar guerra organizada que – em quase duas décadas – deixaram milhares de feridos e dezenas de mortos.
Espetáculo de horrores, hoje em dia transmitido para o mundo todo, e que provocou fuga em massa dos campos de futebol no Brasil.
A tal ponto, que não faz o menor sentido os grandes clubes daqui construírem estádios para mais de 50 mil pessoas.
Enquanto que as imagens trazidas pela televisão mostram lindas festas que fazem os principais clubes do mundo investirem em arenas para mais de 100 mil pessoas.
Situação que vai ser difícil ser revertida por aqui, nesses tempos em que as torcidas organizadas espalham a peste da violência, que ajuda a matar o futebol brasileiro.
O tema exige outras reflexões que continuarei fazendo.