Priscilla Ávila: Máscaras no bloco do prazer

Cheguei ao bloquinho com minha purpurina lilás. Por que purpurina lilás? Por que você vestiu sua cueca cinza hoje? Não sabe dizer? Eu também não. Estava ali por Cristina, ela pedia urgentemente uma companhia para pular o bloco aquela tarde. Engraçado pensar nela pulando, Cristina se movimentava como um banco de praça. Mas eu estava ali para me movimentar também, apesar da única movimentação que sentia era dos gases em minha barriga. Pelo menos poderia soltá-los sem que me ouvissem. O barulho não permitia conversas, nem com um megafone conseguiria saber se Cristina estava curtindo seu sutil rebolado.

Começo a me irritar ao sentir meu rosto derreter embaixo daquela máscara. Por que estava de máscara? Cristina estava feliz em compra-las e me deu uma. Resolvi colocar. Não vejo ninguém mais de máscara além de nós. Cristina voltara da Europa. Lá ela se escondia em suas roupas, sapatos e adereços. A temperatura aqui me fazia querer sair só com purpurina. Até o pudor deveria ser deixado em casa, afinal é carnaval.

Tentei soltar o pudor, mas acho que foi mais um peido. Vejo algumas pessoas só com purpurinas. E eu ainda precisava de uma máscara. Talvez para nenhum conhecido saber que eu estava ali pulando-peidando-suando. De qualquer forma, o certo alivio gastrointestinal dentro do meu esconderijo de paetês não abrandava o desconforto de estar naquela multidão.

Bebo e entrego falsos sorrisos temperados de suor purpurinado. Bebo mais e mais, até minha risada ser mais espontânea que minha flatulência. A anestesia etílica incentivava alguns movimentos que ritmavam com as músicas e eu estava quase no ritmo intenso da primeira lei de Newton ou seria Lei de Cristina? Bem, o álcool não era suficiente! Resolvo procurar outros mascarados, provavelmente atrás de alguma faixa de tecido colorido com paetês eu acharia uma alma para me consolar.

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Saio pulando em cima daquele monte de latinhas e não consigo parar. O amontoado de pessoas agora quase sustentava meus 50 quilos. Estava flutuando e o calor já tinha ultrapassado os limites da minha sensibilidade reclamativa. Não conseguia nem entender, nem gritar ou peidar. Eu estava entrando naquele fluxo.

A energia daqueles corpos dissolveu minha troca de temperatura com o ar em um mar de suor que enxaguou minhas lamentações. Estava nadando a favor da corrente, surfei sobre as ondas e no final fui jogada na areia de purpurina daqueles braços. Esses braços que trabalhavam ao meu lado seis dias por semana naquele escritório. Braços que eram tão frios quanto o ar condicionado e tão sem cor quanto a cortina daquela sala que mascarava qualquer raio de sol que poderia iluminar aqueles corpos manufatureiros de tédio.

Estava na praia daquele corpo, já não eram braços de um escritório, mas uma ilha tropical. Ao desbravar, provei todos os frutos exóticos que encontrei. E o beijo era mais doce, suculento e perfumado que as pitaias do mercadinho da minha rua. Abandonei o barco que me levaria de volta daquela terra encantada e ali fiquei até o sol se pôr.

A brisa da noite me trouxe a lembrança de casa. Voltei como uma criança desiludida no final das férias, por mais que ainda excitada pelos souvenirs de viagem. Ao caminhar de volta, ainda ouvia as ondas do mar ou seriam as vassouras dos limpadores de rua? Não sabia dizer. Mas agora sabia o porquê. Era Carnaval.

I put my mask

To expose my joy

And I didn’t find

And I can´t enjoy

My wishes are out there

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My desires nowhere

You see through me

The imperceptible path

That brings my zest.

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