Uma das estreias de destaque do festival SXSW, ao lado de produções de quilate como Um Lugar Silencioso (cuja crítica você pode conferir aqui no Portal do Andreoli) e o aguardado Jogador N°1, do mestre Steven Spielberg, este Upgrade (Austrália, 2018) marca mais uma empreitada da Blumhouse Productions, produtora fundada pelo hoje todo-poderoso Jason Blum, no gênero horror/sci-fi. Talvez a mais prolífica do gênero. A Blumhouse surgiu em 2007, graças ao inesperado sucesso arrasa-quarteirão Atividade Paranormal, e desde então, já são mais de 150 produções no currículo da produtora, com títulos que variam dos ótimos Sobrenatural (Insidious, 2009) e Corra! (Get Out, cuja crítica você também confere aqui no Portal do Andreoli), até tranqueiras como a sci-fi capenga Área 51 (2015) e o terror de quinta categoria Dominação (Incarnate, cuja crítica você também confere aqui no portal).
Desta vez, Blum e seus asseclas decidiram se reunir ao seu colaborador habitual Leigh Whannell, que fez fama como ator/roteirista/produtor e diretor com a franquia Jogos Mortais (cuja crítica do oitavo segmento, Jogos Mortais: Jigsaw, você também pode conferir aqui no portal), e que já colaborou com a Blumhouse nas quatro produções da franquia Sobrenatural (cuja crítica do quarto segmento, Sobrenatural: A última Chave, você também confere aqui no portal), para abordar um tema em alta no dias de hoje, especialmente após a popularização da série Black Mirror através da Netflix: a obsessão humana pela tecnologia, e como tal obsessão funciona como ferramenta para ajudar a contar uma história de horror, onde a tecnologia é a responsável direta por nossa ruína.
Fiquei sabendo que, numa brincadeira de marketing bem sacada e curiosa por parte da Blumhouse, Whannell e Blum estiveram em pessoa durante a premiere do filme no SXSW, e a dupla apresentou seu filme de maneira no mínimo interessante, ao implantar, literalmente, um chip infra-vermelho na mão de um bravo voluntário da plateia. Tal feito é só para apontar o quão perto nós estamos do futuro imaginado no filme. Um futuro em que somos parte da tecnologia. Infelizmente, o implante, colocado em um homem bastante tatuado chamado carinhosamente de “Pineapple”, não funcionou. E nem o filme, diga-se de passagem.
Em Upgrade, Whannel e a Blumhouse se unem ao ótimo Logan Marshall-Green, protagonista do excelente thriller The Invitation (Karyn Kusama, 2015) e da fenomenal série do canal Cinemax, Quarry, que infelizmente morreu de maneira prematura tendo apenas uma temporada, para contar uma história que soa como uma espécie de “O Exterminador do Futuro” de baixo orçamento, em que Marshall-Green interpreta Trace, um homem que pode ser chamado de “relíquia”, em um futuro definido pela tecnologia.
Trace trabalha utilizando suas mãos e não usa muito o advento da Inteligência Artificial, que nesta realidade está praticamente em todo lugar, desde carros que se guiam automaticamente, até casas inteligentes. Numa noite, dirigindo justamente um destes carros inteligentes ao lado de sua esposa, Asha (Melanie Vallejo), algo dá muito errado. O carro é hackeado e guiado até uma região barra-pesada da cidade, até se chocar contra a parede. Como se não bastasse, um grupo de criminosos arrancam Trace e Asha do carro, matando a mulher e deixando Trace paralisado.
Algum tempo depois, agora um tetraplégico, Trace é abordado por Aron (Harrison Gilbertson, de Need for Speed: O Filme), um gênio da tecnologia, que informa o protagonista que ele pode ser inacreditavelmente curado de sua paralisia. Tal cura envolve o implante de uma tecnologia chamada Stem, que é feito diretamente no tronco cerebral do paciente, controlando seu corpo e movimentos. Agora, com a tecnologia controlando o seu próprio corpo, Trace tem a chance de encontrar os responsáveis pelo assassinato de sua mulher e colocar em ação sua vingança.
A partir daí, o filme desenvolve um bom número de ideias interessantes e apresenta também algumas cenas de luta bem legais, mas tais fatores positivos funcionam sozinhos em um filme que procura por maneiras de ser mais coerente, porém sem conseguir. Whannel não consegue ajustar o ritmo da produção, que sofre também com o orçamento modesto demais para um filme sobre os avanços tecnológicos da humanidade. Além disso, Upgrade também não acerta no tom; às vezes parece um filme B com pitadas de humor negro; em outros momentos tenta navegar as águas sérias do trauma emocional, até que, é claro, transforma-se em uma analogia sobre os perigos do mau uso da tecnologia. Mas nada que não tenhamos visto de maneira muito mais rica na citada Black Mirror, por exemplo.
A questão é que nenhum destes “três filmes” realmente funcionam quando são amarrados forçadamente juntos, e tirando seu bom ator protagonista e seu início promissor, Upgrade funciona tanto quanto o implante colocado no tal do Pineapple na pré-estreia do filme, infelizmente.
Sábado que vem estaremos de volta com a coluna “As Tops do Kacic”