Crítica: A Invasora (Inside)

Poucos dominam a arte de fazer cinema de horror pungente e explicitamente sangrento como os franceses. Tanto que este domínio na arte de espremer o estômago do espectador valeu à um nicho do cinema de horror transgressor do país um nome próprio, o New French Extremity, que conta com títulos de arrepiar a medula como os altamente perturbadores Irreversível e Enter the Void (Gaspar Noé, 2002 e 2009, respectivamente), Alta Tensão (Alexandre Aja, 2003), Mártires (Pascal Laugier, 2008) e Baise-moi (Virginie Despentes e Coralie Trinh Thi, 2000), entre outros.

Além dos títulos citados, um outro exemplar bastante comentado e apreciado do movimento New French Extremity é o violentamente sádico À l’intérieur, batizado aqui no Brasil de A Invasora, uma verdadeira porrada de 80 minutos dirigida pela dupla Julien Maury e Alexandre Bustillo, que depois vieram a quebrar a cara em sua estreia americana, com o fraco Leatherface, prequel do clássico O Massacre da Serra-Elétrica, lançada no ano passado. Aliás, não foram só Maury e Bustillo que se deram mal em terras ianques, já que Pascal Laugier também entregou o fraco O Homem das Sombras (The Tall Man), em 2012, e o mais bem-sucedido do grupo, Alexandre Aja, também entregou alguns filmes duvidosos, ainda que tenha tido êxito em filmes como Viagem Maldita (The Hills Have Eyes, 2006) e Espelhos do Medo (Mirrors, 2008).

Os americanos também tentaram se aventurar pelo New French Extremity com suas refilmagens, e também dançaram feio. A dupla Kevin e Michael Goetz refilmaram o ótimo Mártires em 2015 com um resultado abismal, e agora, provando que não aprendeu a lição aprendida pelos Goetz, o diretor espanhol Miguel Ángel Vivas também quebra a cara com este seu remake de A Invasora (Inside, ESP/UK/EUA, FRA, 2017), refilmagem que mostra-se desnecessária, ainda que Vivas tenha conseguido – em alguns momentos – capturar bem o apavorante conceito central do filme, que consiste em um thriller sobre uma invasão à domicílio, protagonizado por uma vilã determinada a roubar o bebê da dona da casa (e de dentro da barriga da mesma!).

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Rachel Nichols (de Horror Em Amityville, 2005), interpreta Sarah, uma mulher na reta final de sua gestação e que há poucos dias, perdeu seu parceiro em um acidente de carro, e agora terá de enfrentar a maternidade sozinha. Na véspera de Natal, poucos dias antes da data marcada para o nascimento de seu bebê, uma estranha misteriosa (Laura Harring, de Cidade dos Sonhos, 2001), bate em sua porta pedindo para usar seu telefone. Achando aquilo meio suspeito, Sarah dispensa a mulher e liga para a polícia, mas não demora para a estranha encontrar uma maneira de adentrar a casa de Sarah e colocar seu diabólico plano em ação: roubar a criança ainda por nascer do ventre da mãe.

A metáfora central é clara: Sarah precisa precisa confrontar a voz em sua cabeça que insiste em dizer que ela não será uma boa mãe, enquanto que a invasora claramente se alimenta desta energia ruim que emana de Sarah, ganhando força a cada investida contra a futura mãe. Todo o filme (que é desnecessariamente vinte minutos mais longo do que o original francês), é apoiado nas costas das duas atrizes, e suas performances seguram a bronca. Harring, apesar de ainda bela, não é uma Béatrice Dalle (a monstruosa protagonista do filme original), mas consegue manter nítida a loucura inerente e diabólica de sua personagem. A produção também carrega bastante na violência, ainda que não se equipare ao insano exemplar francês.

As coisas realmente saem dos trilhos no ato final, quando Vivas decide abandonar o template do filme de Maury e Bustillo para requentar os irritantes clichês do horror americanizado. O score musical exagerado, o uso de câmera-lenta nos momentos de tensão e o excesso de intervalos entre uma sequência capital e outra (o que explica aqueles inúteis vinte minutos adicionais que mencionei) enfraquece a boa primeira hora do filme, e mostra que o espanhol Vivas ainda tem muito o que aprender dentro do gênero.

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Esta alternância de nível da produção pode ser o resultado da pouca experiência de seu diretor, que decidiu atacar um material que graças à sua visceralidade ímpar, ganhou um status só seu. E o fato de Vivas deixar que seu filme transpire o cinismo de Hollywood em seus frames finais, apenas faz com que a produção adentre o terreno da mediocridade, um defeito tão comum nos remakes americanos do horror europeu.

A Invasora não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente através de serviços de streaming.

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