Crítica: Lizzie (2018)

Lizzie

Confesso que, além da pequena e antiga canção americana, a qual vim a conhecer quando comecei a lecionar aulas de inglês, eu nunca tinha ouvido falar da história de Lizzie Borden. Entretanto, parece que muito do que é visto neste Lizzie (EUA, 2018), novo filme do diretor Craig William Macneill (do bom thriller O Garoto Sombrio, 2015), é conjectura. Mas resumindo as coisas para vocês, no caso de também nunca terem ouvido sobre a história antes, Lizzie Borden simplesmente pegou um machado, e deu quarenta machadadas em sua mãe. Quando viu o que tinha feito, desferiu quarenta e uma em seu pai, de acordo com a rima: “Lizzie Borden took an axe, gave her mother forty whacks. When she saw what she had done, she gave her father forty-one.” É ou não é uma gracinha?

A confusão resultante deste pedaço do folclore gótico da Nova Inglaterra dá forma às primeiras imagens deste envolvente drama de baixo orçamento, muito bem interpretado e escrito. A produção então volta seis meses no tempo, o suficiente para que Macneill fortaleça em seu público a vontade de ver o ato de violência descrito acima acontecer, uma vez que o espectador passa a compreender os motivos que levaram a personagem titular a fazer o que fez.

A Casa Borden é uma das mais abastadas da pequena cidade em que está localizada, no estado de Massachussetts, no ano de 1892. Lizzie (um maravilhoso papel para o abundante talento de Chloe Sevigny, de Meninos Não Choram), sente-se sufocada no local, devido à pressão de seu rígido pai, Andrew (Jamey Sheridan, de Spotlight: Segredos Revelados), e de sua madrasta, Abby (Fiona Shaw, da franquia Harry Potter), e à péssima convivência com sua irmã mais velha, Emma (Kim Dickens, da série Fear the Walking Dead). Lizzie sofre de ocasionais desmaios, e isso já é suficiente para classificá-la como incapaz de tomar suas próprias decisões. Na realidade, as mulheres “normais” daquela época também não parecem se sair melhor. “Nós vivemos neste mundo, e não em outro”, diz uma das personagens sobre a absurda ideia de que duas mulheres apaixonadas possam viver juntas sob o mesmo teto.

Veja Também  Crítica: Thelma (2017)

Entra em cena Bridget (Kristen Stewart, da saga Crepúsculo), a nova criada dos Borden recém chegada da Irlanda. Lizzie imediatamente se afeiçoa à garota, ensinando-a a ler e confidenciando segredos femininos. Mas assim que Bridget começa a pegar o ritmo do trabalho, Andrew sugere a ela que deixe a porta de seu quarto aberta à noite para deixar o ar circular (yeah, right). Ele então sobe as escadas e grotescamente a encoraja a ser uma “boa menina”. Não existe maneira de Bridget impedir os avanços do homem.

A narrativa de Lizzie se desenrola de maneira lenta, tomando seu tempo e mostrando as várias maneiras insidiosas com que os cruéis abusos de poder (especificamente o patriarcal) podem quebrar o espírito humano. Quando Lizzie e Bridget finalmente compartilham um pouco de intimidade, tal momento é um dos poucos relances de delicadeza em um filme por diversas vezes brutal. Ainda que tal momento seja na verdade um prenúncio de perdição para as duas personagens.

Se os assassinatos na casa Borden realmente ocorreram da maneira com que foram retratados aqui, é preciso reconhecer o planejamento de Lizzie na empreitada. Vejam bem, não estou dizendo que é correto dar uma machadada na cabeça de seu pai, mas já que você decidiu fazê-lo, e em uma era onde CSI ainda estava à décadas de ser criado, o esquema de Lizzie certamente era o caminho a seguir. Quanto a aplaudir ou não uma vez que o ato está finalmente executado, fica a critério do espectador.

Uma coisa é certa: Sevigny já estava madura para um suculento papel como esse já há algum tempo. E é realmente uma pena que ela não tenha mais oportunidades no cinema. Eu percebi que a própria Sevigny está listada como a primeira produtora do filme. Lizzie Borden, se ela pudesse de alguma forma voltar do sono da morte como uma produtora em Hollywood, com certeza desferiria mais algumas machadadas na indústria.

Veja Também  Crítica: Hellboy (2019)

Lizzie não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente através de serviços de streaming e VOD.

Loading

Uma resposta

  1. Assisti uma serie do canal LifeTime com Cristina Ricci , The Lizzie Borden Chronicles, são oito epidodios mas que não foi renovado, achei bem fraco,Vamos ver o filme.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Compartilhe esta notícia

Mais postagens