Crítica: Mãe! (Mother!)

O nome do diretor Darren Aaronofsky surgiu com um estrondo na cena cinematográfica no final da década de noventa. Desde o lançamento do drama cerebral Pi (1998), passando pelo perturbador Réquiem Para um Sonho (Requiem For a Dream, seu melhor filme até hoje), pela sci-fi existencial A Fonte da Vida (The Fountain, 2006), pelo comovente O Lutador (The Wrestler, 2008), e chegando até o visceral Cisne Negro (Black Swan, 2010), Aaronofsky se tornou uma unanimidade, e pelo que parecia, um diretor à prova de erros.

Isso até 2014, quando Aaronofsky decidiu cutucar um vespeiro ao adaptar para as telonas a história bíblica do profeta Noé, com Russell Crowe no papel-título. Eu gosto bastante do filme, porém devo reconhecer que a produção está longe do resultado dos outros filmes do diretor, o que refletiu no público e na crítica naquele ano. O filme foi bastante criticado em seu lançamento. Agora, Aaronofsky retorna com este Mãe! (Mother!, EUA/2017), filme que dificilmente entrará no rol de suas melhores produções, mas que assim como toda a polêmica trajetória cinematográfica do diretor, será discutido à exaustão. Tanto para o bem, quanto para o mal.

Trata-se de um dos filmes mais audaciosos e bizarros já lançados por um grande estúdio, onde o controverso cineasta mergulha profundo no horror metafórico. Por vezes apavorante, por vezes excitante e confuso, o filme é também uma gritante homenagem aos mestres do suspense Brian De Palma e Roman Polanski, especialmente seu clássico O Bebê de Rosemary. Em seu núcleo, é uma produção sobre o ego masculino, o instinto feminino, e sobre uma das coisas mais apavorantes do mundo: pessoas que querem mais do que você humanamente pode dar.

Mãe! oferece uma premissa simples, e é ambientado inteiramente em uma casa isolada, que há pouco tempo atrás foi queimada em um incêndio, e depois restaurada. O local é habitado por um casal, interpretado pela dupla Jennifer Lawrence e Javier Bardem, que vêm remodelando a casa desde então. Numa noite, um estranho (o veterano Ed Harris) bate na porta do casal, e após contar sua história, é hospedado pelo homem da casa, à contragosto da mulher. No dia seguinte, outra visitante inesperada (a eternamente bela Michelle Pfeiffer), também aparece no local. E enquanto a personagem de Lawrence permanece hesitante em permitir a entrada destas pessoas em sua casa, o personagem de Bardem é solícito e chega a parecer até ansioso para hospedá-los.

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Dizer que as coisas ficam bastante estranhas na narrativa deste ponto em diante, é ser delicado demais. A produção que começa como um suspense até convencional, aos poucos quebra todas as barreiras do realismo. Aaronofsky gradativamente intensifica o tom metafórico e o filme desemboca em um dos clímax mais insanos do cinema em um longo tempo. Mesmo dono de uma carreira notável, o pico de insanidade atingido por Aaronofsky na conclusão deste Mãe! é certamente um dos pontos mais altos de sua trajetória como cineasta e autor.

Mãe! está longe de ser um filme de horror tradicional. Aaronofsky deixa bem claro que seu filme não apresenta respostas fáceis, e explora diferentes dualidades em sua trama, que vão desde liberdade artística até a guerra entre os gêneros. A metáfora em torno dos papéis do homem e da mulher (leia-se mãe) na sociedade, permeia toda a produção. O filme permite várias leituras diferentes, e em nenhuma delas o lugar-comum prevalece, e sim uma incômoda ânsia pela correta interpretação de seus temas, na esperança de que nada da loucura que está ocorrendo em cena seja perdida pelo espectador.

O que não quer dizer que Mãe! não seja aterrorizante. O diretor de fotografia Matthew Libatique, colaborador habitual de Aaronofsky, imprime aqui mais um belo trabalho, especialmente na vertente dos close-ups, onde Libatique coloca o público o tempo todo ao lado dos protagonistas, aumentando assim consideravelmente o nível de claustrofobia, e permitindo à Aaronofsky trabalhar com uma perspectiva visual limitada. Normalmente, nos filmes de horror prevalecem as tomadas mais amplas, onde o espectador está sempre procurando por pistas ou tentando adivinhar de onde sairá o próximo susto. O público também está sempre procurando por respostas do tipo “Quem é o assassino?” ou “Quem vai morrer?”, etc… e Mãe! muda as regras do gênero. Aaronofsky tripudia o tempo todo, utilizando-se do horror psicológico que provoca a confusão na mente do espectador. Trata-se também de um trabalho visualmente belo, como já é de costume na filmografia do diretor.

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O foco íntimo da produção em seus personagens pesa bastante nos ombros de Jennifer Lawrence, e a atriz mais uma vez corresponde. Ao contrário da massa que insiste em criticar a atriz apenas para estar na moda, sou sensato o suficiente para não cair na onda do povaréu, e afirmar que J-Law é a melhor atriz de sua geração. Quem também rouba a cena da produção é a maravilhosa Michelle Pfeiffer, que com sua presença imponente, eleva o resultado de todas as cenas em que está presente, mesmo que sejam poucas. É muito bom rever a atriz em um papel digno de sua beleza e talento, depois de tantos anos amargando papéis de pouca expressão.

Resumindo, Mãe! deixará bastante gente nervosa e perplexa. É o típico filme que parece ter sido concebido com o intuito de ser divisivo, e dado o histórico de Aaronofsky, é nítida a escolha do diretor por trilhar este caminho. Se gostei do filme? Confesso que não sei dizer, mas com certeza não irei esquecê-lo tão cedo.

Mãe! estreia nos cinemas brasileiros neste final de semana.

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