Crítica: Them That Follow (2019)

Them That Follow

Exibida no badalado Festival de Sundance na edição deste ano como parte da competição dramática, este Them That Follow (EUA, 2019), mergulha seu público dentro do mundo fechado de uma comunidade extremamente religiosa, forçando o espectador a decidir se as recompensas dramáticas da produção compensam seu ritmo lento e sufocante. Não há como questionar a intensidade do retrato criado pelos roteiristas e diretores estreantes Britt Poulton e Dan Madison Savage, que mostra uma comunidade que coloca Deus acima da medicina e acredita que as mulheres devem ser subservientes aos homens. O excelente elenco (liderado por Alice Englert, do drama Ginger & Rosa), agrega inabalável convicção a estes personagens obtusos, mas por mais cativante que Them That Follow seja, falta um pouco de fôlego à produção, o que impede que o filme seja algo realmente marcante.

Com um elenco forte que inclui nomes como o da mais recente vencedora do Oscar de Melhor Atriz, Olivia Colman (de A Favorita, cuja crítica também está disponível aqui no Portal do Andreoli), e Walton Goggins (Os Oito Odiados), o filme oferece uma proposta interessante, com pinceladas de alguns temas abordados na série The Handmaid’s Tale por exemplo, especialmente a concepção em torno de uma sociedade radicalmente patriarcal.

Ambientado nas Montanhas Apalaches, distante das pequenas cidades locais, o filme traz Englert no papel de Mara, a obediente filha do Pastor Lemuel (Goggins), que lidera uma pequena comunidade de Pentecostais que optou por viver longe da sociedade, como forma de ficar mais perto de Deus. Utilizando serpentes venenosas em suas cerimônias, Lemuel prega um evangelho profundamente conservador, que exalta a importância da obediência feminina e do casamento tradicional, o que se reflete em sua filha, que está de acordo em casar com o tímido Garret (Lewis Pullman, de Maus Momentos no Hotel Royale). Mara, entretanto, esconde um segredo: Ela está grávida de seu verdadeiro amor, Augie (Thomas Mann, de Estrada Sem Lei, cuja crítica está disponível aqui no Portal do Andreoli).

Estreando na direção de longas, Poulton e Savage criaram um filme cujo principal foco é o perigo da ignorância e da fé cega. Os excepcionais design de produção a cargo de Carmen Navis (Cães Selvagens, cuja crítica também está disponível aqui no Portal), e fotografia de Brett Jutkiewicz (do vindouro Ready or Not), dão a Them That Follow uma sensação longe de ser idílica, que se reflete em seus personagens; Quando o filme começa, Mara permanece leal às restrições Pentecostais, mesmo sabendo que um conflito está por vir, assim que alguém descobrir sobre sua gravidez. Ainda assim, ela tenta negar o inevitável, aceitando se casar com Garret e fingindo que tudo está dentro da normalidade.

Them That Follow trabalha em cima da constatação de que Mara não poderá viver sob a tutela do pai por muito tempo, e o filme é bem sucedido ao dar a ela inúmeras razões para fugir. Lemuel crê que apenas Deus pode curar doenças, e se as crianças da comunidade vêm a morrer de alguma doença que seria facilmente tratável, então é porque a fé de seus pais no Todo-Poderoso não é forte o suficiente. Outro membro nada amigável do grupo é Hope (Colman), que é mãe de Augie mas não faz ideia da gravidez de Mara. Ela tenta através do medo e de seus próprios julgamentos, incitar a imagem de um Deus vingativo que demanda total submissão. Não surpreende portanto, que quando as tensões começam a vir à superfície dentro deste ecossistema repressivo, elas explodem de maneira terrível e violenta.

Há um sentimento constante de angústia em Them That Follow, e ainda que Poulton e Savage sustentem o clima sufocante de maneira notável, o filme por vezes flerta com a monotonia. Estes Pentecostais podem ser terríveis em suas crenças, mas tirando as sequências de Lemuel e de outros membros que lidam com as serpentes peçonhentas do local, Them That Follow acaba por ser uma descrição padrão do tema das seitas religiosas (ao menos na maneira de como elas são retratadas nos filmes). Então, ao mesmo tempo em que o que observamos em cena seja muitas vezes enfurecedor, um sentimento de déja vu aos poucos ganha força no espectador, o que força os cineastas a explorar cada vez mais os extremos na narrativa, como forma de aumentar a tensão.

O que realmente segura o filme são as performances, em sua grande maioria resolutas e nada simpáticas. Colman interpreta sua irredutível e sofrida Hope como uma mulher que maneja sua fé como se fosse uma arma de fogo, enquanto que Goggins não fraqueja como um Pastor cuja conduta de “a ferro e fogo” se estende para todos os aspectos de sua vida. Em seu pequeno reino nas montanhas, ele é o próprio Deus.

Até que a escalada de eventos trágicos comece a se desdobrar durante o terço final do filme, Them That Follow por vezes soa esquemático e manipulativo. (Se algo terrível pode acontecer, esteja certo de que realmente acontecerá.) Mas a silenciosa decência de Mara, interpretada com alma e coração por Englert, transforma-se no Norte do filme e dá ao espectador um respiro de sanidade em meio a tanta intolerância e loucura. Sua relação com Augie (que também se sente como um forasteiro dentro desta seita claustrofóbica), é estabelecida de maneira tão delicada, que o espectador passa a temer por sua destruição. Tal temor é palpável, e carrega Them That Follow através de suas inconsistências e seus momentos menos inspirados.

Them That Follow não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente através de sistemas de streaming e VOD.

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