Taizé: Dois Graus de Separação com o irmão Roger — Fé, Feridas e Fraternidade que Vence a História | A Morte de um Irmão, a Vida de uma Comunidade

Bom dia meus amigos queridos,

A França é, hoje, um dos países mais ateus do mundo. Apenas cerca de 2% da população se declara protestante e 4% católica. Este mesmo país, no entanto, carrega em sua história algumas das piores guerras religiosas da Europa, com séculos de atrocidades. Pouca gente sabe que a Primeira Cruzada foi convocada em Clermont-Ferrand pelo papa Urbano II, e que as duas últimas saíram de Aigues-Mortes, enviadas pelo rei Luís IX.

Faço essa introdução porque, em breve, completo 50 anos. De todos os países que visitei, nos quais vivi e me senti parte das culturas locais, é na França onde mais sinto que caminho sobre ovos quando o assunto é fé. Religião — e temas como Igreja ou clero — são grandes tabus e geram uma resistência quase inacreditável. Especialmente quando, como eu e a Johnna, vivemos o cotidiano com centenas de franceses e temos conversas constantes com eles.

Isto posto, quando encontro espaços como Taizé — que reúnem pessoas de tantas nacionalidades, culturas, idiomas e tradições cristãs diferentes —, meu coração salta de alegria. Celebro a fraternidade cristã que escolhe enxergar o que nos une, em vez daquilo que poderia nos separar.

Nesta edição de Taizé 2025, nos reunimos no jardim para uma conversa agradabilíssima: participantes da França, Inglaterra, Brasil, Vietnã, Holanda, Hungria e Filipinas. E talvez você já tenha ouvido falar do irmão Roger. Ele era suíço e pastor protestante. Em 1940, durante o horror da Segunda Guerra, veio a Taizé de bicicleta. Ali, criou um refúgio para judeus e para todos os perseguidos pela guerra e pela fome que assolava a Europa.

Alguns anos depois, Taizé havia se tornado uma comunidade ecumênica, simples, sem luxo, sem busca de poder — um contraste gritante com os séculos de ostentação que marcaram a história religiosa da França. Enquanto papas disputavam poder em Avignon, e Cluny se tornava a maior abadia do mundo até a construção da Basílica de São Pedro, o excesso e o domínio político da Igreja preparavam o terreno para a ira popular que culminaria na Revolução Francesa. Desde o batismo do rei franco Clóvis, no século V, Igreja e Estado caminharam juntos — e isso gerou uma antipatia crescente no coração do povo. O ódio, a guerra, a inimizade estavam à beira de explodir. E assim aconteceu: centenas de igrejas foram completamente destruídas!

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O irmão Roger, porém, fez o oposto. Abraçou os não acolhidos, os marginalizados, e uniu-se a cristãos de diversas origens. Trabalhou com Madre Teresa de Calcutá, foi reconhecido por papas como João Paulo II e recusou doações pessoais — tudo o que recebia era entregue à comunidade. Até hoje, os irmãos de Taizé vivem em simplicidade, sem posses individuais, e mantêm o compromisso com o coletivo. Aos sábados, a oração é conduzida por um pastor protestante; aos domingos, por um padre católico. Tudo é feito para derrubar muros e promover unidade.

Hoje, conversamos com o irmão André, da Hungria. Foi a primeira vez que dialoguei com um irmão de Taizé que conheceu pessoalmente o fundador. Ele nos recebeu com simplicidade e carinho para responder perguntas. Quando soube que ele havia chegado à comunidade em 2003, perguntei imediatamente: “Você conheceu o irmão Roger?”. Ele respondeu que sim. Perguntei então: “Você estava presente no dia em que ele foi assassinado?”. E, novamente, ele respondeu que sim.

Em 2005, durante uma oração comunitária, uma mulher com esquizofrenia — alguém que amava e odiava o irmão Roger — veio por trás e o apunhalou. Ele morreu ali mesmo.

A vida é curta. Ela nos separa de algumas pessoas por apenas alguns graus. Na semana passada, escrevi que estou a três graus de Bonhoeffer e quatro de Hitler. Esta semana, ao conversar com alguém que conviveu com o irmão Roger, percebi que estou a apenas dois graus de separação dele.

A morte de um irmão. A vida de uma comunidade.

O que isso nos ensina? Que a vida é curta demais para levantarmos muros ou alimentarmos divisões. Podemos caminhar juntos, trabalhar pelas mesmas causas, acolher os pobres, os marginalizados — porque essa é a essência do Evangelho. Quando encontramos um desses pequeninos, encontramos o próprio Cristo.

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Pense nisso. E quem sabe, na próxima viagem a Taizé, você venha comigo? Será um prazer ter você conosco.

Até a próxima!
Fábio
Collonges-au-Mont-d’Or

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Respostas de 3

  1. Que benção Fábio, realmente o que nos une (Jesus Cristo) é maior que tudo, linda mensagem siga firme nos inspirando a melhorar dia a dia.
    Abração,
    Elton

  2. Filho vc um homem de fé,forte e corajoso
    Um Josué..
    Jesus Cristo o único e verdadeiro…basta crer que seremos SALVOS..
    A FÉ REMOVE MONTANHAS….SO JESUS TEM ESTE PODER..

    DEUS TE ABENÇOE RICAMENTE SEMPRE!
    ATÉ A PRÓXIMA..

  3. Estimado hermano Fabio……Gracias por compartir con nosotros, tus experiencias con Taizé….por supuesto que cuando lleguemos a Lyon, con el corazón agradecido y con mucha alegría iremos a por ese café em Taizé también….contigo y con los que quieran venir…..Tus comentarios con Taizé, donde la fraternidad destruye la maldita división, que genera mucha tristeza entre la humanidad, y donde Cristo y Su Evangelio no están. Un abrazo fraterno desde Granada/España.

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