Kacau: Entrevista com Márcia Sakumoto da coluna Japão

E para a coluna de hoje, aquela curiosidade e admiração pelo mundo oriental, me levaram a entrevistar a colunista Márcia Sakumoto, da coluna “Japão”. Márcia é filha de pai japonês e mãe gaúcha, e atualmente, vive no Japão com sua família há 7 anos.

Vamos então, conhecer um pouco mais da vida dessa brasileira que vive lá do outro lado mundo!

  1. Márcia, pergunta chave, o que levou você a morar no Japão?

Era um sonho conhecer o Japão, com a migração de descentes uni o útil ao agradável vindo trabalhar em fábrica. Eu vim para o Japão em diferentes fases, tempos e objetivos. Conforme o tempo foi passando as necessidades mudaram, seguimos buscando melhorar nossas condições e conquistar a independência financeira.

 

  1. Quando e como foi sua primeira viagem ao Japão? Como foi essa experiência?

Foi em 1995 que eu tive uma avalanche de primeira vez, sozinha aos 17 anos embarquei para o Japão sem saber o idioma, cultura, educação, cozinhar enfim tudo era diferente. E tudo era primeira vez, os desafios foram iniciados logo no vôo, como a única comissária brasileira nunca estava presente tive que me virar para entender o japaenglish com as japonesas, o segundo foi ao desembarcar, aprender a usar o vaso sanitário Hi-Tec no aeroporto, direção dos carros e mão inglesa também me surpreenderam, assim como os 30m quadrados do apartamento que dividia com duas meninas brasileiras desconhecidas. Depois vem a fase de adaptação, encarar a jornada de 12 horas de trabalho em indústrias com regras e horários diferentes.

Trabalhar no Japão nessas condições costuma ser pedreira, serviço pesado, corrido, bastante desgastante, sem contar com a saudade apertando o tempo todo, sem internet o único meio de comunicação com o Brasil era carta e telefone para momentos e datas especiais, pois as ligações eram caríssimas, Natal aqui é inverno ficava em uma fila imensa aguardando outros brasileiros falarem com os familiares para falar com os meus por 15 minutos no máximo, era um evento no Brasil reunia todos para falar um minutinho com cada um,  assistir algo do Brasil era locação de fitas de vídeo cassete com programação de uma semana atrasada, mas tudo isso e as condições do trabalho compensavam pelo conforto e a beleza que o país nos proporciona, além é claro, do dia do pagamento.

O Japão é lindo especialmente na primavera que foi quando cheguei, seguro, organizado e limpo tudo era impressionante no meu desembarque, tudo me chamava atenção.

 

  1. O que você mais gosta e menos gosta no Japão?

O que mais gosto no Japão é da liberdade que a segurança, educação e o planejamento nos proporcionam. Podemos andar a noite em ruas pouco iluminadas que com certeza em outros países morreríamos de medo de passar, falar ao celular tranquilamente sem a preocupação de ser roubada e como mulher é maravilhoso a liberdade de poder circular sem que pessoas fiquem te assediando,  ou com medo me privando de sair a hora que eu quiser devido ao perigo de ser possivelmente atacada. A limpeza das cidades e o planejamento que faz tudo funcionar muito bem por aqui também me agradam bastante, adoramos viajar pelo Japão muito tranquilo e seguro, além da temporada de inverno para curtir as estações de esqui.

O que menos gosto do Japão é a questão da posição social e a hierarquia serem fatores considerados muito importantes nas relações interpessoais, acho esse costume ultrapassado. O Natal não ser feriado e nem comemorado nacionalmente como no Brasil também me descontenta ainda mais porque passamos o natal normalmente trabalhando, o ano novo é feriado, mas podemos considerar silencioso perto do nosso. Ahhh … não consigo trocar o pãozinho com queijo do café da manhã por arroz e misoshiru.

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  1. Alguma semelhança do Japão com o Brasil? Algo no Japão faz você lembrar da sua terra Natal?

Eu cresci em São Paulo entre  o bairro da Consolação e Higienópolis região movimentada e tranquila ao mesmo tempo, a movimentação da avenida da consolação que eu acompanhava pela janela do nosso apartamento e a tranquilidade em andar nas  ruas do Higienópolis eu senti quando estive em Tóquio alguns lugares me lembraram esse agito e outros a tranquilidade. Algumas ruas em Tóquio, tem tantas pessoas que lembram a 25 de março e os parques surgem no meio da cidade com a paz e equilíbrio como a do parque do Ibirapuera.

 

  1. O que faz você mais sentir falta do Brasil?

Sinto falta dos familiares e amigos, da riqueza de espaços geográfico, das belas praias, suco de laranja natural das frutas brasileiras as daqui não são saborosas e custam caro, algumas verdadeiras fortunas.

 

  1. Você já vivenciou alguma situação de emergência no Japão como algum terremoto por exemplo? Caso tenha ocorrido, como foi passar por isso?Sim. Passei por alguns tremores, porém um em especial foi inesquecível, foi em 1998 o tremor foi rápido, mas a sensação foi uma eternidade ao olhar para o chão parecia uma onda marola alta, quando olhei para cima as luminárias balançavam de um lado para outro. D.E.S.E.S.P.E.R.A.D.O.R!!!! Cheguei em casa estava tudo no chão, mas graças a Deus ficou tudo bem e logo regressei ao Brasil.

 

  1. Como é a sua rotina no Japão? Conte um pouco pra gente sobre o seu dia a dia.

Tenho uma rotina diversificada, trabalho em uma clínica odontológica, faço bolos, salgados e doces brasileiro para vender, escrevo para coluna aqui no Portal, participo de eventos na comunidade e estou montando uma marmitaria com pratos diferenciados todos os dias, incluindo feijoada e lasanha. Além disso sou mãe, esposa, motorista, faxineira, arrumadeira… brinco com meus queridos aqui em casa, hoje a cozinheira está de folga, alguém precisa assumir o comando, há dias em que dispenso todas elas e viro a Cinderela cancela todas as tarefas, hoje vou cuidar somente de mim. Nos finais de semana e feriados adoramos sair e viajar, conhecer lugares novos, no inverno curtimos um filme e pipoca, fazer reuniões de comilanças em casa com parentes e amigos também é uma deliciosa opção.

 

  1. Como é ser uma estrangeira brasileira no Japão? Como os japoneses reagem aos brasileiros?

Eu não tive muitos problemas com japoneses, acredito que gentileza gera gentileza, o tempo me ensinou que a convivência melhora quando aprendemos mais sobre a cultura, idioma e costumes do lugar que estamos, saber a forma de entrar e sair de um lugar, de agir ou cumprimentar em cada ocasião faz diferença evitando ofensas com atitudes inadequadas para aquela cultura, tento fazer minha parte, acredito que o universo responde da forma que você perguntar. Já cometi muitas gafes e acredito que vários japoneses riram bastante de mim e com certeza virão outras, tudo é diferente, mas estou aqui também para aprender. Alguns japoneses reagem mal em ambientes de trabalho com os estrangeiros, deixando bem claro que não gosta da nossa presença, por outro lado para nós estrangeiros é complicado entender e aceitar a questão da hierarquia, onde os mais velhos de idade ou de casa devem ser acatados pelos novatos, essa diferença cultural ofende os ocidentais, assim como para os japoneses, existem hoje milhares de intérpretes em repartições públicas, escolas, hospitais e fábricas facilitando e organizando  esses desgastes. O mais difícil é quando o abuso vem dos brasileiros que estão a mais tempo aqui e querem te humilhar no trabalho, te prejudicando com medo de você roubar a vaga dele ou ser mais eficiente do que o mesmo. Esse tipo de confronto é bastante comum nas fábricas.

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  1. Que conselho você daria aos brasileiros que estão com a intenção de morar no Japão em busca de melhores oportunidades?

Um conselho, Informação! Hoje a informação é fácil, rápida e acessível. Acho importante virem ao Japão melhores preparados com relação a idioma, cultura e costumes, a internet ajuda muito nessa pesquisa. Assim como tudo está mais acessível hoje, as exigências também são maiores. O Japão se abriu para o mundo, se falam em falta de mão de obra no Japão, mas quem não acompanhar as mudanças ficará para atrás. Planeje estratégias A, B e C caso o A não dê certo e vice-versa. Não venha somente pressionado por uma opção. Prepare seus filhos, as escolas japonesas são rígidas e rigorosas e as crianças precisam de muita atenção nessa adaptação, para não transformar seu sonho em pesadelo. Tenham muita vontade de trabalhar, com os salários por hora se não trabalhar não come, não paga as contas, e pode passar dificuldades. Temos muitas coisas boas, mas tudo tem seu preço e nada vem de graça.

O ensino é público até 15 anos de idade, depois é pago e são bastante salgados, podemos dizer que são duas faculdades no Brasil, precisa de um planejamento e conhecimento para formar um filho no Japão. Defina com seus filhos o que querem fazer e procurem saber antecipadamente como realizar.

Cuidado para não ficar incomunicável com seu filho ,vejo pais colocando filhos na creche japonesa e perder a comunicação com o filho depois de um tempo, pois naturalmente as crianças irão falar japonês fluente se estudarem em escolas japonesas, se você não acompanhar, mantenha  o português em casa é importante tanto quanto o japonês.

 

  1. Você voltaria a morar no Brasil? É uma intenção sua ou pretende ficar no Japão?

Sim. Devemos nos preparar para várias possibilidades. Não é a intenção no momento, mas a hipótese nunca foi totalmente descartada de nossos planos, o Japão hoje nos quer aqui, até quando não temos como prever, não é nosso país ao meu ver, devemos seguir em frente sem anular as possibilidades. Eu pensei que nunca mais voltaria para o Japão, depois que montei meu negócio no Brasil, e cá estou. Então vamos seguindo os planos, precisando mudar, mudamos. O importante é estar preparado, investir em você mesmo contribui para não desistir qualquer desafio.

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