Crítica: Daniel Isn’t Real (2019)

Daniel Isn’t Real (EUA, 2019), novo filme do (jovem) diretor Adam Egypt Mortimer (do terror Vingança Sobrenatural, e do segmento “New Year’s Eve” na antologia de horror Holidays), é possivelmente o melhor filme de horror exibido na edição deste ano do Festival South by Southwest, o SXSW, a maior vitrine do cinema de horror independente americano. Baseado no livro “In This Way I Was Saved”, do escritor Brian DeLeeuw, e trabalhando em cima de um roteiro que Mortimer co-escreveu ao lado do próprio DeLeeuw, Daniel Isn’t Real consiste em uma única e aterrorizante visão sobre a descoberta da identidade, em um mundo onde tudo parece estar contra o indivíduo em questão. O filme, sobre um maligno amigo imaginário, consegue se estabelecer como uma quase perfeita combinação entre horror orgânico, terror cósmico e pavor psicológico, que penetra na alma do espectador ao mesmo tempo em que evoca uma reação emocional de seu público.

Após testemunhar o terrível resultado de um tiroteio, o garoto Luke (Griffin Robert Faulkner), de apenas oito anos de idade, fica traumatizado. Pouco tempo depois, ele cria um amigo imaginário chamado Daniel (Nathan Chandler Reid), que leva ambos a um mundo de fantasia e imaginação. Porém, depois que Daniel engana Luke e o leva a quase matar sua mãe mentalmente instável, Claire (Mary Stuart Masterson, de Tomates Verdes Fritos e Benny & Joon: Corações em Conflito), Luke é forçado a trancar o amigo em um brinquedo e se afasta dele para sempre. Doze anos depois, entretanto, Luke (agora interpretado por Miles Robbins, do recente Halloween, cuja crítica também está disponível aqui no Portal do Andreoli), traz Daniel (agora interpretado por Patrick Schwarzenegger, do drama Sol da Meia-Noite) de volta, depois que sua mãe sofre um colapso nervoso. E Daniel, agora, aparece como um jovem charmoso e manipulador, com um aterrorizante plano em mente.

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Depois de interpretar personagens cômicos em filmes como a engraçada comédia Não vai Dar (Blockers) no ano passado, Robbins surpreende ao mostrar uma nova faceta neste Daniel Isn’t Real, transmitindo vulnerabilidade e empatia com seu personagem. Schwarzenegger (filho do gigante austríaco Arnold Schwarzenegger) está igualmente forte, ainda que de uma maneira completamente diferente. Seu Daniel é uma figura realmente ameaçadora que consegue a façanha de ser simultaneamente charmoso e perigoso (pendendo muito mais para o segundo adjetivo à medida em que o filme prossegue). A sumida Mary Stuart Masterson também aparece bem em suas poucas cenas, assim como Sasha Lane (de Docinho da América e do remake de Hellboy, cujas críticas também estão disponíveis aqui no Portal do Andreoli), no papel de Cassie, o interesse romântico de Luke.

O grande atrativo deste pequeno e sombrio filme vem do ato de se tentar decifrar exatamente o que Daniel é. Seria ele uma alucinação esquizofrênica? Um fantasma? Ou seria ele algo ainda mais sinistro? Em filmes como Daniel Isn’t Real, as coisas costumam ficar menos interessantes à medida em que a solução para o mistério vai se tornando clara. Felizmente não é o caso aqui. Se a resposta é narrativamente satisfatória ou não, cabe ao espectador dizer. De qualquer forma, funcionou comigo, já que o filme prende bastante o público até chegar aos finalmentes. Ainda que o filme não pareça totalmente seguro de sua mitologia (a extensão das habilidades de Daniel nunca fica realmente clara), a mesma acrescenta uma forte atmosfera à natureza surrealista da trama. Também não estou certo se os minutos finais funcionam totalmente, e confesso que gostaria de uma segunda sessão para confirmar algumas coisas.

Assim como o recente Hereditário (cuja crítica também está disponível aqui no Portal do Andreoli), Daniel Isn’t Real também discute a questão envolvendo as condições mentais de seu protagonista, que assim como sua mãe, é logo de cara diagnosticado como esquizofrênico. Há também a possibilidade de que o filme esteja literalmente “demonizando” a doença, mas outra vez, depende da visão do espectador. Não importa qual seja sua opinião sobre o assunto, quando o filme terminar, você vai querer discuti-lo.

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Ainda que o tom da produção seja bastante morno em boa parte do tempo, o filme solta os cachorros em seu terceiro ato e abraça o bizarro. O design de produção de Kaet McAnneny (do thriller Ruína Azul, 2013) é deslumbrante, assim como a mórbida maquiagem e os aterradores efeitos visuais práticos (com exceção de um duvidoso CGI em uma das cenas) à cargo de Martin Astles (de Watchmen: O Filme, 2009). Os elementos de horror orgânico remetem às boas produções do gênero dos anos 80, e são apropriadamente grotescos. Logo, não é surpresa que a produtora por trás de Daniel Isn’t Real seja a Spectrevision, que também nos trouxe filmes como Mandy (cuja crítica também está disponível aqui no Portal do Andreoli), e Garota Sombria Caminha pela Noite (e tem como co-fundador o ator e produtor Elijah Wood).

Resumindo, Daniel Isn’t Real é uma viagem. Mas uma viagem na qual você com certeza vai querer embarcar. Trata-se de um belo segundo trabalho do diretor Adam Mortimer, que transborda duas performances fenomenais de seus protagonistas, Robbins e Schwarzenegger, além de alguns efeitos especiais bastante impressionantes. São por descobertas assim que eu continuo acreditando no cinema atual.

Daniel Isn’t Real não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente através de sistemas de streaming e VOD.

 

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