Crítica: Entre Facas e Segredos (Knives Out) | 2019

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Antes da versão longa, a versão curta: Entre Facas e Segredos (Knives Out, EUA, 2019), novo filme do diretor Rian Johnson (Star Wars: Os últimos Jedi), possivelmente seja o filme mais divertido que você verá nos cinemas este ano. Bastaram 15 minutos de projeção e eu já sabia que teria de assisti-lo de novo. O filme apresenta o público aos Thrombey, a família abastada e, obviamente, extremamente disfuncional, que ocupa o núcleo da produção. A família é tão disfuncional, que o clã é obrigado a se reunir na “mansão ancestral” da família para uma investigação sobre a morte de seu patriarca, o balzaquiano Harlan (o grande Christopher Plummer).

Para a polícia, cada integrante da família é um suspeito em potencial, e por consequência, todos são interrogados pelos tiras, um por um. A questão é que, à medida em que seguem os interrogatórios, cada membro dos Thrombey revela-se (de maneira hilariante), um pior do que o outro. Os diálogos afiados estabelecem com precisão e eficiência que tipo de canalha cada um dos Thrombey realmente é: temos a herdeira que insiste ter construído seu negócio do zero e que exige retribuição; a aproveitadora que se vangloria do que nunca conquistou e guarda vários ressentimentos familiares, e o herdeiro arrogante e intolerante que quer sempre soar eloquente e cujo atrevimento surpreende até os investigadores do caso, entre outros.

Entre Facas e Segredos é o típico filme com aquela temática do “encontre o culpado”, tão presente nos mistérios da escritora Agatha Christie, só que aqui com o dobro de maldade e sarcasmo. Mas no fim das contas, o público começa a perceber que pouco importa descobrir quem realmente matou o velho Thrombey, ou não, uma vez que Johnson faz questão de deixar bem claro que a diversão está em observar a hilariante dinâmica da investigação e o que cada um dos suspeitos está disposto a fazer para não ser pego. O habilidoso Johnson sabe muito bem o que está fazendo, e mais importante: ele sabe MUITO BEM quem seus personagens são, o mundo em que habitam e a história que ele que contar.

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E Johnson com certeza sabe contar uma história! O diretor mantém um ritmo incessante, ligeiro e esperto, com piadas e reviravoltas que chegam freneticamente e aos montes, e quando você acha que tem toda a situação desenhada e sob controle, Johnson arremessa uma bola curva para tirar o equilíbrio do espectador mais uma vez. Graças à sua concepção clássica mas que carrega o verniz da modernidade, Entre Facas e Segredos mais parece uma empolgante partida do antigo jogo de tabuleiro “Detetive”, e em dado momento da produção, um dos personagens até menciona que a vítima praticamente vivia dentro do referido jogo, acumulando desafetos dentro de sua própria família. O refinamento e o estilo aplicados por Johnson mantém o filme sempre dinâmico e original, e sua atenção aos detalhes convida o espectador a rever seu filme e repensar o que acabou de assistir.

Como se não bastasse, o elenco por si só é de uma riqueza ímpar; há tantos personagens suculentos e interpretados com tanto entusiasmo, que é difícil eleger um favorito. A sempre impecável Toni Collette (de Hereditário, cuja crítica também está disponível aqui no Portal do Andreoli), canaliza sua energia na medida certa; o galã Chris Evans sai completamente do papel de mocinho de seu Capitão América para se transformar em um verdadeiro canalha cínico, e o 007 Daniel Craig emprega toda sua competência de sempre no papel do investigador principal envolvendo a morte do patriarca dos Thrombey.

Mas há também performances menores que merecem tanta atenção quanto as citadas acima, como a da estonteante Ana de Armas (Blade Runner 2049) no papel da enfermeira de Harlan; do próprio Christopher Plummer como um homem cuja família mais o temia do que propriamente o conhecia; além de Michael Shannon (A Forma da Água), Jamie Lee Curtis (Halloween), Don Johnson (da série Watchmen), Katherine Langford (da série 13 Reasons Why), LaKeith Stanfield (Corra! e Uncut Gems) e Jaeden Martell (It: A Coisa, Low Tide).

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Os prazeres mais óbvios de Entre Facas e Segredos estão justamente na superfície da trama, que vão desde as piadas afiadíssimas até as reviravoltas genuinamente surpreendentes. Falar mais sobre o filme entregaria vários de seus segredos, que são muitos e todos deliciosos. Entre Facas e Segredos não é um filme que demanda análises do arco-da-velha ou teorias elaboradas e cansativas para entregar sua mensagem.

Contudo, o filme respira o mesmo ar que respiramos. Seus personagens lêem as mesmas manchetes que nós, têm as mesmas discordâncias políticas e assistem os mesmos filmes. Se você cavar um pouco mais fundo nas entrelinhas, com certeza descobrirá que há muito mais escondido sob a superfície e pasme: se identificará mais do que imagina com as motivações de alguns dos protagonistas. Com sua natureza estilosa, mirabolante e inteligente, Entre Facas e Segredos é diversão mais do que garantida.

Entre Facas e Segredos estreia nos cinemas brasileiros no dia 12 de dezembro.

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