Cai a noite.
O frio cortante agride a quem perambula pelas ruas da cálida São Paulo.
A garoa, marca registrada de nossa cidade, avança lentamente.
Da minha janela carros, sirenes e faróis se misturam ao fog. Nada londrino.
Não há glamour algum nestes tempos de escassez, de ausência, de carência e fome.
Penso nas crianças nos semáforos.
Nas meninas arrancadas de suas infâncias…
No abuso que reafirma o poder insano de quem paga.
Na crueldade e escuridão de quem vende…
Tantas meninas agredidas em suas almas, para bem além dos corpos.
Penso nos pais de família, lobos e lobas de suas matilhas, a reinventar seu sustento. O pão, o caminho, a sorte.
Penso nas mães secas de leite, olhos cheios d água, a alvorecer e anoitecer na labuta, entre pedras e sonhos.
Penso nos excluídos… nas comunidades invisíveis…nos marginalizados
Penso na sociedade excludente- e tantos de nós somos – segregadora da cor, da raça
Intolerante e desigual,
Que nos difere e distancia (quais animais no matadouro) por nossas identidades de gênero,
Por nossas roupas, vozes, visuais…
Ah, os humanos!
Reles mortais que somos
Tantas vezes desfilamos pré conceitos, soberba e prepotência
Quantas vidas desperdiçadas na contra mão da empatia…
Pensar o outro é o maior exercício que nos cabe!
E, nesse pensar tão vasto e profundo calo minha própria angustia,
Dispo-me de mim por infinitos segundos e desejo, quase como reza, que a compaixão se prolifere feito vírus
Que possamos crescer, ser e somar para além de nossas bolhas, de nossas telhas, de nossas dores,
Que nossos inimigos sejam apenas as vozes tantas vezes indomáveis que nos habitam.
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