Jorge Lordello: Ocorrência “não criminal” atravanca o trabalho policial

Acredite se quiser, mas a maioria dos chamados para o telefone 190 não são de pessoas vitimadas por um crime de natureza grave. O mesmo acontece com as pessoas que vão a uma delegacia de polícia atrás de um boletim de ocorrência.

A grande demanda das polícias civil e militar se dá por problemas banais, fúteis, insignificantes e, geralmente, de caráter não penal.

A resolução demandaria um pouco de bom senso e equilíbrio emocional entre as partes, mas como essas qualidades estão ficando escassas em nossa sociedade deteriorada pela ignorância, falta de educação e insensatez, as polícias são acionadas sem a menor cerimônia.

A explicação é simples: amolar a polícia não custa nada.

Elenco da peça ‘Baixa Terapia’, em cartaz no Teatro Clara Nunes, no Shopping da Gávea — Foto: Divulgação

Para exemplificar esse triste quadro, vou me reportar ao problema que aconteceu na peça estrelada pelo ator Antonio Fagundes, na segunda semana de 2023, no Teatro Clara Nunes, na Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, onde 50 pessoas que haviam comprado ingresso chegaram atrasadas, ou seja, o espetáculo já havia começado e foi criada a maior confusão. Todo mundo sabe que após o início de peças teatrais profissionais, a entrada não é mais permitida, pois atrapalha o desempenho dos atores e também daqueles que chegaram no horário aprazado.

O bate-boca entre os atrasados e os funcionários do teatro foi grande e a polícia militar carioca foi acionada, ou seja, ao invés de atender vítimas de roubos, estupros ou sequestros do PIX, a guarnição teve que acalmar os ânimos dos descontentes, que queriam assistir à peça na marra ou ter o dinheiro de volta.

Antonio Fagundes falou sobre o problema:

“Eu me sinto até desconfortável de falar sobre isso, porque é como se a gente tivesse que explicar para as pessoas o que significa a palavra ‘começa’. Se uma peça começa às 20h, a pessoa não pode chegar ao teatro faltando dois minutos para às 20h e achar que está no direito de atrapalhar os outros”.

Nos EUA, o acionamento de uma viatura policial para problema não criminal traduz em aplicação de multa imediata ao solicitante. Se porventura ficar provado que quem chamou a polícia mentiu sobre a motivação, poderá haver responsabilização criminal.

Mas, no Brasil, o policial tem que ter “Paciência de Jó” e ouvir calado as baboseiras das partes, tratar com desvelo os envolvidos e ainda registrar boletim de ocorrência de natureza “não criminal”. Isso para satisfazer o ego dos desinteligentes.

A verdade é que só porque a vergonha é de graça, o povo esbanja.

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Imagem: Mobisig

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