Crítica: Fragmentado (Split)

Sou fã incondicional do cinema do diretor indiano M. Night Shyamalan. Mesmo reconhecendo o péssimo rumo de sua carreira dentre os anos de 2006 e 2013, que comportou quatro produções fraquíssimas à cargo do diretor, e que colocou em xeque seu talento também como roteirista. De unanimidade com produções de imenso quilate como O Sexto Sentido (The Sixth Sense, 1998) e Corpo Fechado (Unbreakable, 2000) até hoje meu filme preferido do diretor, além dos ótimos e também sucessos de bilheteria Sinais (Signs, 2002) e A Vila (The Village, 2004), Shyamalan virou motivo de chacota com péssimas escolhas de projetos no período citado.

Como fã, fiquei bem contente quando o diretor voltou a acertar a mão com o modesto thriller A Visita (The Visit), em 2015, voltando às origens que firmaram seu início de carreira. E é com imensa satisfação que afirmo que, neste ano de 2017, Shyamalan também voltou a entregar um grande filme. Fragmentado (Split, EUA, 2017), é um dos melhores filmes do currículo do cineasta, que resolveu abandonar de vez a mão leve e apostar em um suspense de clima carregado e concepção um tanto violenta, mas que transpira o ótimo cinema do início da filmografia do cineasta.

Também escrito por M. Night, Fragmentado apresenta ao público um protagonista um tanto quanto inusitado. Seu nome é Kevin (James McAvoy, colossal), um homem na casa dos seus trinta anos de idade que sofre de um raro e peculiar tipo de esquizofrenia, que faz com que Kevin carregue consigo 23 personalidades diferentes. Kevin é tratado à peso de ouro pela Dra. Karen Fletcher (a veterana Betty Buckley, do thriller Fim dos Tempos, também de Shyamalan), uma experiente psiquiatra que acredita ser a única pessoa capaz de ajudar o protagonista a lidar com suas distintas personalidades. Mas o que a doutora nem imagina, é que Kevin acabou de sequestrar três jovens adolescentes, entre elas a problemática Casey (Anya Taylor-Joy, de A Bruxa), e as mantêm em cativeiro, com o pérfido objetivo de usá-las para alimentar uma suposta 24a personalidade que também habita seu corpo e sua mente. Personalidade esta, capaz de coisas humanamente inacreditáveis.

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Apesar de tenso do início ao fim, Fragmentado é um daqueles filmes bem divertidos de se assistir. A causa desta bem-vinda mistura de tensão e diversão mescladas na medida, tem nome: James McAvoy. Absolutamente perfeito, McAvoy constroi um personagem (ou personagens) maior do que o próprio filme. O Kevin de McAvoy é literalmente uma figuraça, cuja alternância de personalidades sempre funciona à perfeição, sem nunca soar forçada ou impossível demais. Há momentos em que McAvoy literalmente transforma seu semblante, indicando a alteração da personalidade que passa a comandar o corpo do protagonista. As passagens em que McAvoy interpreta uma de suas personalidades femininas também é de tirar o chapéu, e arrancam risinhos nervosos do público.

É o estudo deste personagem bizarro e fascinante, que transforma a narrativa de Fragmentado em algo original e que prende a atenção do público, mesmo com o filme ambientando boa parte de sua trama no ambiente confinado do cativeiro das vítimas de Kevin. Vale ressaltar também as excelentes sequências entre Kevin e sua psiquiatra, todas escritas de maneira brilhante, e também interpretadas com maestria não só por McAvoy, mas também pela veterana Betty Buckley. São as sequências entre Kevin e a Dra. Fletcher que determinam o rumo do forte terceiro ato do filme, onde tudo passa a fazer sentido, mas de uma maneira inesperada pelo grande público.

Este “encaixe” ao final do ato conclusivo de Fragmentado, permitam-me escrever, beira a perfeição. Shyamalan, sempre um cineasta que valoriza os “finais-surpresa” desde a conclusão de O Sexto Sentido, que deixou meio mundo de boca aberta com sua revelação, encerra seu filme de duas maneiras. Ambas brilhantes e surpreendentes. A primeira conclusão, amarra seu filme de maneira madura e inteligente, enquanto que seu epílogo, que ocorre durante a última sequência da produção, abre uma inacreditável porta para algo maior e completamente inesperado, que abrange não só tudo o que foi visto em torno do fenomenal protagonista da produção, como também engloba a própria essência do cinema de Shyamalan, dando aos fãs mais ardorosos do cinema do diretor algo com o que sonhar pelos próximos anos. Realmente não é pouco.

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De narrativa sempre forte e coesa, com uma direção inspiradíssima, e trazendo uma das interpretações mais robustas do cinema nos últimos anos, Fragmentado é o filme pelo qual eu, e qualquer outro admirador do cinema de qualidade, vinha esperando de M. Night Shyamalan. Um diretor que, finalmente, parece ter reencontrado o caminho do ótimo cinema que o colocou no mapa. E dada a inacreditável conclusão de seu filme, eu mal posso esperar o que virá à seguir. Espero que seja o que eu venho sonhando já há algumas noites.

Fragmentado estreia nos cinemas brasileiros no dia 27 de Março.

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