Crítica: The Heretics (2017)

Em 2015, um pequeno filme de horror fez certo barulho quando exibido no circuito de festivais na terra do tio Sam. O filme era o nojento Bite, e o motivo de tal burburinho era justamente o fato do filme ser supostamente tão repugnante, que fez com que várias pessoas passassem mal e saíssem das salas de projeção onde o filme estava sendo exibido. Tal acontecimento gerou certa antecipação por parte dos fãs do gênero (eu um deles), que passaram a aguardar ansiosamente pela disponibilização do filme. O fato é que eu pude conferir Bite um tempo depois, e apesar de bastante divertido, o filme não era nada daquilo que estava sendo pintado.

Anyway, meu ponto é que o filme foi dirigido pelo jovem cineasta canadense Chad Archibald, que retorna agora com este The Heretics (Canadá, 2017), produção em que assina também o roteiro e a produção, através de sua própria produtora, a Black Fawn Films, que vem ganhando terreno nos últimos anos. Archibald e sua Black Fawn lançaram, além do citado Bite, outros bons exemplares do horror independente, e fico feliz em constatar que após ter conferido praticamente todos eles, este The Heretics se estabelece como o melhor título da produtora até agora.

The Heretics acompanha sua protagonista, Gloria (a bela Nina Kiri, da ótima série The Handmaid’s Tale), que no momento está lidando com as traumáticas consequências de ter sido sequestrada por um culto de fanáticos cinco anos atrás. Ela seguiu em frente e construiu uma nova vida com sua namorada, Joan (Jorja Cadence), porém, na noite em que as duas comemoram o aniversário de sua relação, Gloria é levada mais uma vez. Desta vez, entretanto, as coisas são diferentes, já que seu captor, Thomas (Ty Barrett, de The Demolisher, 2015), alega que na verdade ele a está protegendo de alguém… ou algo. Deste ponto em diante, o roteiro de Archibald em parceria com Jayme Laforest (do citado Bite), mostra-se mais inventivo do que aparenta à princípio, surpreendendo o espectador e fazendo-o tentar adivinhar o que está realmente acontecendo.

Archibald e Laforest conduzem seu roteiro com simplicidade e competência, conduzindo duas linhas narrativas sem deixar a peteca cair. Numa delas, o filme segue Gloria e seu captor, e na outra, a busca de Joan para encontrá-la. Os dois arcos narrativos se completam e são dependentes um do outro, e o roteiro ainda joga algumas reviravoltas ao longo do caminho que só fortalecem a produção como um todo.

Como um espectador, não seria necessário pedir por muito mais do que isso, mas The Heretics entrega mais de qualquer maneira. Como demonstrado em Bite, os efeitos-visuais práticos são tudo para a Black Fawn Films, e tais efeitos nunca pareceram tão bons como eles parecem aqui. O sofrimento de Gloria ganha vida em detalhes tão gosmentos quanto os que permearam o filme anterior de Archibald (e lá a protagonista lentamente se transforma em um inseto, pensem nisso), através de mais um brilhante trabalho da equipe de maquiagem e design da personagem. A justaposição de realidade e fantasia que The Heretics equilibra tão bem na narrativa não poderia ser executada sem eles. Excelente trabalho.

Outro ponto muito à favor do filme é que The Heretics deixa de lado os sustos desnecessários e os clichês do gênero, entregando algo diferente, mais relevante dentro de um gênero sempre criticado por suas produções superficiais. O elenco apesar de desconhecido, segura as pontas e entrega a dualidade que suas interpretações necessitam para dar sentido ao filme, ainda que não entreguem nada dramaticamente memorável.

Resumindo, The Heretics é uma pequena gema do horror independente. Cinema feito com raça e criatividade, onde o baixo orçamento é visto não apenas como um impedimento, mas sim como um estímulo para se fazer um cinema cada vez melhor, mesmo que com pouco. Se pensarmos nas limitações que Archibald e companhia tiveram que enfrentar para fazer The Heretics acontecer, e olharmos o produto final que eles entregaram, chega a ser impossível conceber como diabos eles conseguiram a façanha. Mas independente de toda esta questão orçamentária, The Heretics é um retorno às origens do bom cinema de horror, que entrega algo sombrio, emocional e deliciosamente repugnante.

The Heretics não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar ao país diretamente através de serviços de streaming e VOD.

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