Crítica: Trapped (2017)

Ah, o amor… O amor (e a paixão também, é claro), é capaz de levar um homem à loucura. Não só à loucura, mas também à uma perigosa cegueira que faz com que o indivíduo não perceba que está entrando em uma verdadeira enrascada, em troca do amor de uma mulher. Este excelente Trapped (Índia, 2017), exemplifica com maestria esta situação, utilizando-se da persona de Shaurya (Rajkummar Rao, do drama City Lights), um introvertido rapaz que se apaixona por Noorie (Geetanjali Thapa), sua colega de trabalho. Após engatar um namorico com ela, ele descobre, para sua surpresa, que Noorie vai se casar em dois meses, em um casamento arranjado (sim, isso ainda existe na Índia).

Desesperado com a possibilidade de perder a moça, Shaurya – que mora em um pulgueiro com mais quatro pessoas – diz para Noorie que vai conseguir da noite pro dia uma casa para eles morarem, sob a condição de que se ele realmente conseguir, ela desistirá do tal casamento. Ela topa a proposta dele, e logo Shaurya sai em busca de um lar para ele e sua amada.

O problema é que além do pouco tempo para conseguir um local, Shaurya também tem pouco dinheiro no momento, o que complica ainda mais sua situação. Contudo, surge uma milagrosa proposta no destino do rapaz, num valor que ele pode pagar, e que se materializa na forma de um apartamento no último andar de um prédio embargado, onde ele poderia morar por pelo menos três meses, até conseguir algo melhor. Mas o que parecia um cenário de sonho para nosso apaixonado protagonista, logo se transforma em pesadelo, quando ele acaba inacreditavelmente preso dentro do apartamento, colocando-o em uma agoniante luta pela sobrevivência.

Há alguns meses atrás, publiquei aqui mesmo no Portal do Andreoli minha crítica sobre o filme Under The Shadow, uma recente produção iraniana que abordava um tema com um pé no sobrenatural. Conforme comentei naquele texto, o filme atraía o interesse do espectador mais pelo fato de ser uma raridade (uma produção iraniana de horror), do que propriamente pelo filme em si. O mesmo não pode ser dito deste Trapped, uma produção indiana de suspense (outra raridade no âmbito cinematográfico), que se destaca não apenas por sua origem incomum, mas principalmente por ser um filme realmente bom.

Não há nada da extravagância exagerada das produções de Bollywood – a milionária indústria do cinema indiano que foca em produções geralmente pastelões – neste Trapped. A produção é um conto de sobrevivência maduro e plausível, cuja odisseia do cativante protagonista coloca o público em uma desesperadora corrida pela vida, em um cenário tão cotidiano que chega a ser inacreditável. A ideia central extremamente simples da produção, ajuda a construir dentro do público um clima de incredulidade e perplexidade que só vai embora quando os créditos finais começam a rolar.

Dirigido com extrema inteligência por Vikramaditya Motwane, em cima do roteiro esperto da dupla Amit Joshi e Hardik Mehta, o filme se apoia totalmente nas costas de seu excelente protagonista, o desconhecido (não por muito tempo, espero), Rajkummar Rao, que entrega imensa humanidade e credulidade à seu personagem, que luta cada segundo contra a improvável situação em que se meteu, e que não se entrega jamais.

O que valoriza ainda mais a produção, são seus maduros minutos finais, que amarram a narrativa de maneira adulta e realista, sem tirar nenhum absurdo coelho de alguma cartola, ou mesmo transformar seu protagonista em uma espécie de McGyver indiano. As situações apresentadas ao protagonista são todas possíveis e bem elaboradas, que de certa forma colocam público e protagonista lado a lado tentando adivinhar qual o próximo passo a ser dado, para que se possa continuar vivo.

Trapped é uma mais que bem-vinda surpresa do gênero. Um suspense de primeira categoria, que não trata o espectador como criança, e o embarca uma jornada de aflição e descobrimento, de agonia e redenção, e que ensina que a maior virtude do espírito humano, é a resiliência. Imperdível!

Trapped não tem previsão de estreia nos cinemas brasileiros, e deve chegar diretamente ao mercado de streaming e VOD.

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